192 - ANO XVII - 30 de setembro a 6 de outubro de 2002
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A enfermeira Ana Raquel Medeiros Beck: "O cuidador precisa de auxílio" Cuidador vive
no limite do estresse

ISABEL GARDENAL

Ana Raquel Medeiros Beck é uma enfermeira que gosta muito de crianças. No dia-a-dia, convive com esse universo no hospital. Sua atuação é em uma UTI-pediátrica, a do HC da Unicamp. A enfermeira sabe que um de seus papéis é cuidar, mas também sabe reconhecer o trabalho de cuidadores voluntários, em geral familiares, que dão assistência contínua aos pequenos enfermos. Tanto é que, em sua pesquisa de mestrado na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade, ela avaliou o desgaste dos acompanhantes das crianças com câncer em suas atividades diárias. Resultado: o estudo mostrou que a evolução do câncer em si provoca o desgaste em 100% dos cuidadores.

Relacionado ao tema "Tensão devida ao papel de cuidador entre cuidadores de crianças com câncer", a mestranda avaliou ainda o diagnóstico de enfermagem, o grau de dependência da criança (para vestir-se, alimentar-se, locomover-se), o grau de ajuda recebido de outras pessoas para cuidar da criança e os prejuízos à vida pessoal do cuidador. Sua tese foi orientada pela professora Maria Helena Baena de Moraes Lopes.

O estudo foi realizado no Centro Infantil "Dr. Domingos A. Boldrini", por ser uma instituição de referência brasileira no tratamento do câncer infantil, onde foram entrevistados 50 cuidadores -- 45 mães, três pais e duas avós -- de crianças que tinham doenças onco-hematológicas, comumente leucemia.

Tensão - Os diagnósticos de enfermagem são descritos pela Associação Norte-Americana de Diagnóstico de Enfermagem (Nanda). Ana Raquel selecionou, de forma aleatória, dois diagnósticos para o estudo: tensão e risco para tensão do cuidador. Foram analisadas algumas características definidoras para a tensão do cuidador, sendo as mais freqüentes a sua apreensão quando ficar doente ou estiver para morrer (62%), atividades e cuidados alterados (54%) e preocupação com a rotina dos cuidados (46%).

O fator de risco mais observável para o diagnóstico de risco foi a gravidade da doença da criança, em 100% dos casos. "Este cuidador é na maioria (94%) mulher, para quem falta descanso ou recreação em 88%, que são inexperientes em cuidar em 78% e enfrentam os problemas psicológicos do doente em 68%", enumera Ana Raquel.

As crianças de três a seis anos apresentavam maior grau de dependência dos cuidadores (72,5%) do que as de sete a dez (66,5%). Dos 44 cuidadores que tinham companheiros, 41 (93,2%) recebiam algum tipo de ajuda. Mesmo assim, mais a mãe considerava a criança sua obrigação, bem como o marido, a casa e os outros filhos.

Abnegação - Com relação aos prejuízos à vida pessoal do cuidador, das que trabalhavam fora e estudavam, 100% apresentaram prejuízo no trabalho e no estudo. Por causa do tratamento da criança, elas não conseguiam dormir (94%). Enfrentavam muitas perdas: no lazer em 90% dos relatos, no humor em 82% e no sexo em 80%. "Achavam que não lhes era permitido o prazer e o lazer", conclui Ana Raquel.

Ela ainda verificou que nem sempre a equipe multiprofissional orienta os acompanhantes da criança, talvez por falta de tempo ou por desconhecer a importância disso. "Se o cuidador não é esclarecido, ele capta tudo o que está ocorrendo, sofre tudo o que a criança está sentindo". A enfermeira faz um alerta: "o cuidador precisa seriamente de auxílio profissional, a fim de ter sanados os fatores de risco para tensão. Mais equilibrado, ele oferecerá melhores cuidados".