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Jornal da Unicamp - Outubro de 2000

Páginas 4 e 5

ENERGIA

Paulo César Nascimento

Os brasileiros que vivem na escuridão

Aproximadamente 25 milhões de pessoas vivem às escuras no Brasil;
encontro na Unicamp discute proposta de zerar o déficit de energia até 2005

No Brasil, cerca de 25 milhões de pessoas, 15% da população, vivem no escuro. Este expressivo contingente ainda sem acesso à luz elétrica está predominantemente no campo. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), das 5,8 milhões de propriedades rurais do país somente 1,6 milhão (27,5%) estão ligadas à rede elétrica. Passados quase 120 anos, desde a inauguração, em 1883, na cidade de Campos, então província do Rio de Janeiro, do primeiro serviço público de iluminação elétrica do Brasil e da América do Sul, levar energia ao meio rural ainda é um desafio não superado.

Discutido durante o 3º Encontro de Energia no Meio Rural (Agrener 2000) na Unicamp, o problema da energização de áreas rurais requer, basicamente, soluções de custo acessível para o produtor e morador rural de baixa renda. Por isso, a utilização de energia de fontes renováveis (biomassa, solar e eólica, por exemplo), abundantes no país, é alternativa economicamente viável - desde que amparada por políticas específicas de fomento e mecanismos de regulação – e deve efetivamente integrar o conjunto de ações esboçadas no novo cenário energético brasileiro para a democratização do acesso à energia elétrica.

Uma questão social – A eletrificação rural no Brasil é, sobretudo, uma questão de natureza social. Se a energia elétrica é um insumo capaz de elevar índices de produtividade e qualidade de propriedades agrícolas, também é inquestionável sua necessidade para a melhora da qualidade de vida de quem é apenas morador rural ou depende da agricultura para a própria subsistência. Isso pressupõe que, para ser acessível, a energia precisa ter custo compatível com a capacidade de pagamento dessa população de baixa renda.

Porém, a falta de atratividade do mercado rural para as empresas de energia elétrica e o desenvolvimento, desde 1971, de programas de eletrificação rural baseados em critérios meramente técnicos e financeiros resultaram, até aqui, em altos custos médios de ligação, inviabilizando o acesso dos moradores de menor poder aquisitivo à luz elétrica. Mesmo o "Luz no Campo", o mais recente e ambicioso programa de eletrificação rural do Governo Federal – pretende eletrificar um milhão de propriedades rurais em todo o território nacional em quatro anos, beneficiando 5 milhões de pessoas, com investimentos da ordem de R$ 2,7 bilhões – parece ainda não ter conteúdo para resolver satisfatoriamente o problema.

"Não é clara a preocupação com os consumidores de baixa renda", adverte José Carvalho Marta, professor da Universidade Federal de Mato Grosso e participante do encontro na Unicamp. "O programa deve considerar os diferentes extratos de renda, caso contrário se constitui num plano de expansão comum de consumo de energia." Ainda segundo ele, a energia elétrica, por si só, não basta para melhorar renda e padrão de vida no campo; é necessário destinar crédito adequado para o morador rural poder investir e adquirir bens eletrorurais e eletromecânicos.

O professor Fernando Ribeiro, do Grupo de Energia do Departamento de Engenharia de Energia e Automação Elétricas (Gepea), da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), observa que a falta de empenho das concessionárias em buscar soluções para simplificar as redes e baratear o fornecimento de energia também responde pela manutenção do atual déficit de energia elétrica no campo.

"A concessionária não motiva engenheiros, técnicos e agentes, muito pelo contrário; a área de eletrificação rural é tradicionalmente depositária do pessoal menos prestigiado da companhia", comenta. "A empresa só está interessada no cliente urbano, que consome e proporciona lucro. A população rural não é prioridade."

Artigo de luxo – De acordo com Fernando, o futuro da energização das áreas rurais ficou ainda mais incerto após a privatização das empresas públicas de energia. Segundo ele, o desafio está em fazer com que as empresas privadas se interessem por um mercado pouco rentável, como o meio rural, e por empreendimentos de maior risco, como os que envolvem a produção de eletricidade a partir das fontes renováveis de energia.

"Se no ambiente estatal não foi possível o atendimento generalizado do pobre rural, o que acontecerá agora, quando o mercado está sendo imposto como referencial de implementação? O mais provável, se nada for estipulado pelo poder concedente, é que a eletrificação rural venha a se definir como um artigo de luxo no campo", teme o professor.

Na opinião dele, as perspectivas de atendimento ao meio rural dependem fundamentalmente da regulação que venha a ser estabelecida. Assim, ressalta Fernando, cabe ao Estado, através de suas instâncias de poder e tomada de decisão, criar mecanismos e programas que propiciem condições de atendimento à zona rural, quer seja por meio de regras, normas, subsídios, incentivos, quer seja por meio de estratégias de desenvolvimento. "Sem isso, não haverá solução para o problema", afirma.

Nesse aspecto, salienta o docente da USP, a academia tem um papel preponderante a cumprir. Identificar as demandas sociais, despertar no Estado a vontade política necessária para atendê-las e monitorar a implantação das políticas públicas para assegurar às comunidades o direito à energia são missões que a universidade deve abraçar.

Bens públicos - As dúvidas e receios quanto à manutenção, por parte das empresas privatizadas, de alguns serviços de eletricidade definidos como bens públicos, antes tutelados pelo Estado, permeou os principais debates do Agrener 2000 e ecoou na audiência pública promovida durante o evento sobre a proposta de resolução da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) para universalização do atendimento em energia.

Carla Cavaliero, do Departamento de Planejamento de Sistemas Energéticos da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM), da Unicamp, lembra que, desde o início do processo de privatização, não houve uma preocupação em se determinar quais bens públicos deveriam ser mantidos no setor. "As empresas privatizadas não terão interesse em manter certos bens públicos, como o fornecimento de energia elétrica a consumidores de baixa renda ou o incentivo ao uso de fontes renováveis e à pesquisa e desenvolvimento, já que estes não garantem o lucro no curto prazo", argumenta.

Para garantir a continuidade do fornecimento e o estímulo aos recursos alternativos, ela considera imprescindível, a exemplo da legislação norte-americana para o setor, a adoção no Brasil de mecanismos que obriguem as concessionárias a comprar energia elétrica de produtores independentes, cuja geração seja proveniente de fontes renováveis – proposta igualmente defendida há dois anos no país pelos membros do Fórum Permanente de Energias Renováveis. Também é essencial a atuação de órgãos reguladores e fiscalizadores, papel delegado pelo Estado à Aneel e às agências estaduais conveniadas.

Realizado de 12 a 15 de setembro, o Agrener 2000, na avaliação de seu coordenador, Luís Barbosa Cortez, teve o mérito de deslocar o eixo exclusivamente técnico da temática energética para o centro de uma discussão interdisciplinar. O professor da Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) e do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe) da Unicamp, acredita que o encontro serviu ainda para criar as bases necessárias à integração dos que trabalham com energia na instituição.

Energia da cana, madeira, dendê, vento...

A geração de eletricidade a partir de fontes renováveis de energia pode resultar em benefícios ambientais e sociais: menores emissões atmosféricas, menor consumo de água, geração de empregos e incentivo à atividade econômica local. O meio rural, conforme estudos apresentados no Agrener 2000, é um amplo mercado para a exploração desses recursos, capazes de substituir com vantagens o abastecimento via extensão da rede elétrica ou mesmo a geração de eletricidade por óleo diesel.

"No meio rural, em função da natureza da atividade e da disponibilidade de recursos energéticos, o processo de eletrificação pode estar associado ao beneficiamento do produto, agregando valor e aumentando a renda das comunidades", expõe o professor Arnaldo Walter, do Departamento de Energia da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM), da Unicamp. "Em muitos casos o investimento será proibitivo para um produtor individual, mas suportável e recompensador para um conjunto de agricultores que poderiam estar organizados em cooperativas."

O bagaço de cana gerado pela agroindústria da cana-de-açúcar é exemplo de um resíduo que usinas já transformam em biomassa para a produção de energia. Mas há recursos ainda inexplorados: na região Amazônica existem mais de 5 mil madeireiras que utilizam diesel e poderiam ser auto-suficientes em energia apenas com a queima do resíduo gerado. O óleo de dendê, plantado em larga escala no Pará, mostrou em laboratório ser um excelente substituto do óleo diesel na geração de energia e possui um potencial para suprir o consumo nacional do combustível, da ordem de 35 milhões de metros cúbicos.

Pequenas centrais Além da biomassa, o Brasil, por suas características tropicais, pode explorar e destinar outras modalidades de energia renovável, como a solar, fotovoltaica e a eólica, para beneficiar o meio rural em atividades que a energia elétrica convencional tem sido incapaz de atender satisfatoriamente. Irrigação, bombeamento, aquecimento e tratamento de água, dessalinização, eletrificação de cercas, conservação de produtos e alimentos e uso residencial são exemplos.

O uso de outro recurso renovável, a energia hidráulica, também pode se expandir por meio de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs) para atender necessidades de eletrificação de comunidades isoladas. Com menor potência do que as usinas hidrelétricas, as PCHs começam a demonstrar sua relevância no planejamento energético nacional devido ao risco crescente de déficit de energia no país a partir de 2001.

Segundo o professor Carlos Alberto Mariotoni, da Faculdade de Engenharia Civil e do Nipe, é fundamental o incentivo para a disseminação de PCHs em regiões mais afastadas dos grandes centros do país, de maneira a criar melhores condições de desenvolvimento regional. Ele revela que em Portugal, onde também houve redefinição do setor elétrico, há disseminação e valorização dos empreendimentos hidrelétricos de pequena potência .

A Aneel informa que, para o biênio 2000-2001, estima autorizar a implantação de 1.000 megawatts em PCHs, com investimentos da ordem de R$ 1,4 bilhão.

As principais fontes de energia renováveis

Energia hidrelétrica - Obtida por meio da força hidráulica. Em usinas como Furnas e Itaipú ou nas PCHs a água de rios é utilizada para acionar geradores e produzir energia. O Brasil produz mais de 90% da eletricidade que consome fazendo uso da energia hidráulica.

Energia solar - Utilizada para aquecimento de água, de ambientes e secagem de grãos, é uma das principais opções de valorização das energias renováveis. O aquecedor solar, por exemplo, é alternativa econômica ao chuveiro elétrico, responsável por quase 20% do consumo nacional de eletricidade no horário de pico, por causa de sua elevada potência.

Energia solar fotovoltaica – Produzida pelo fenômeno de transformação da radiação solar (captada por painéis solares) em corrente elétrica. A energia elétrica assim obtida pode ser imediatamente consumida ou armazenada em baterias.

Energia eólica – Obtida por meio da força dos ventos, que acionam as pás de um gerador semelhante a um ventilador e produzem energia elétrica. No Brasil, a primeira turbina eólica de grande porte foi instalada em Fernando de Noronha e opera desde 1992 movida pelos constantes ventos que sopram na ilha, proporcionando uma economia de óleo diesel da ordem de 70 mil litros anuais.

Energia de biomassa - Biomassa é matéria de origem orgânica (animal ou vegetal), capaz de ser aproveitada para gerar calor ou eletricidade. Numa caldeira, a biomassa é queimada e o vapor produzido aciona um gerador elétrico. A produção de biomassa pode ocorrer pelo aproveitamento de lixo residencial e comercial ou resíduos de processos industriais, como serragem, bagaço de cana e cascas de árvores. Com um terço dos resíduos disponíveis pode-se gerar 10% da demanda mundial de eletricidade.

Fonte: Eletrobrás, Aneel e Fórum Permanente de Energias Renováveis.


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