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Casa do Lago exibe curtas de propaganda e longas
de ficção produzidos por anarquistas em 1936 e 1937

Mostra traz o cinema
anarquista feito no decorrer
da guerra civil espanhola

Nesse ano completa-se 70 anos do início da Guerra Civil Espanhola. De 5 a 14 de junho será exibida na Casa do Lago a mostra de curtas e longas-metragens “Cinema Anarquista durante a Guerra Civil Espanhola”, promovida pelo Departamento de Multimeios, Mídia e Comunicação do Instituto de Artes (IA) da Unicamp. Paralelamente, entre os dias 5 e 29, ficará aberta a exposição fotografia “A Guerra Civil Espanhola nas Fotografias de Agustí Centelles Osso”. A programação inclui uma mesa-redonda sobre “Anarquismo, cinema e política”, às 20h30 do dia 8, com os professores Edson Passeti (Núcleo de Sociabilidade Libertária da PUC), Margareth Rago (IFCH/Unicamp) e Adilson José Ruiz (IA/Unicamp), coordenada por Fernando de Tacca (IA/Unicamp).

Evento inclui exposição fotográfica de Centelles Osso sobre conflito

O professor Fernando de Tacca, que tentava trazer esta mostra de cinema para a Unicamp havia um ano e meio, lembra que a sublevação militar fascista contra a república na Espanha eclodiu nos dias 19 e 20 de julho de 1936. O conflito abriria um campo fecundo da disputa ideológica dentro da esquerda, no qual o anarquismo ganhou maior visibilidade como proposta de uma sociedade libertária e igualitária. Com uma estrutura popular e participativa, o anarquismo dominou as cidades de Barcelona e Aragón, locais paradigmáticos onde os filmes foram produzidos.

Essa mostra teve curadoria realizada para o Festival de Huesca por Ángel-Santos Garcéz. Segundo o curador, a escolha se deu sobre um grupo de películas praticamente desconhecidas fora da Espanha, realizadas pela Confederação Nacional do Trabalho (CNT), de tendência anarquista, na retaguarda das frentes de batalhas durante a Guerra Civil Espanhola. São curtas-metragens de propaganda e longas de ficção, produzidas pelo Sindicato Único de Espetáculos filiado à CNT – Confederação Nacional dos Trabalhadores, que entre os anos de 1936 e 1937 realizou mais de uma centena de filmes.

Os curtas-metragens são, em geral, de natureza propagandística de cunho didático e mostram as mudanças realizadas na organização social dentro das zonas sob controle das forças republicanas com tendência anarquista, onde as fábricas, e também a própria indústria do cinema, foram coletivizadas e funcionavam como centros sociais, educativos e espaços do debate político. Cenas da frente de batalha são mostradas na sua dura frieza do combate, mas são construções sobre uma luta contra o fascismo e pela liberdade de projeção utópica de uma sociedade socialista idealizada.

Os filmes de longa metragem, entretanto, são produções simbólicas na exploração da narrativa ficcional e utilizam de vários gêneros tradicionais como o melodrama, a comédia, e o musical, mas com um olhar particular, em busca da afirmação do princípio libertário. Essas narrativas não buscam julgamentos de valores morais sobre a conduta de seus personagens: estivadores, prostitutas, artistas de rua e inclusive ladrões – um campo estereotipado de pertencimento ao conceito de popular, como ressalta Ángel-Santos Garcéz – são observados sempre com franqueza e simpatia, sem serem julgados sob nenhum ponto de vista. Assim, há um contraponto com a estética do cinema do realismo socialista e o conceito de povo é construído sem exaltação. “Podemos perceber simbolicamente os valores que o anarquismo queria modificar como a noção de família, de amor, de respeito mútuo e de solidariedade, ou seja, as instituições conservadoras são questionadas no cotidiano das ruas e na intimidade das relações afetivas”, afirma Fernando de Tacca.

O tesouro de Centelles

Paralelamente à mostra de cinema, a Casa do Lago abriga de 5 a 29 de junho a exposição fotográfica “A Guerra Civil Espanhola nas fotografias de Agustí Centelles Osso”, organizada por Fernando de Tacca e Enric Llagostera. O fotógrafo Centelles Osso retratou Barcelona no período republicano anterior à guerra civil e os conflitos desde os primeiros dias. Sua documentação apresenta uma visão a partir das barricadas republicanas e o desenrolar da guerra incluindo cenas dos campos de concentração e a destruição pelos bombardeios aéreos contra alvos da população civil. A exposição reflete a visão de um fotógrafo comprometido com a causa republicana.

No início de 1976, Centelles cruzou a fronteira com a França e recuperou algumas caixas de madeira suas que estavam guardadas na casa de uma família de camponeses amiga. Dentro delas, cuidadosamente embalados, havia mais de quatro mil negativos fotográficos, correspondentes a parte de sua produção como foto-jornalista independente durante os períodos da Segunda República espanhola, da Guerra Civil e dos anos de exílio na França.

A história desse tesouro começa em fevereiro de 1939, quando ele se desloca levando os arquivos fotográficos do exército republicano do Leste para a França. Embala esse material junto com sua produção fotográfica particular e o guarda em uma grande mala de couro. A viagem até a fronteira é feita por carro ou trem, mas Centelles cruza a fronteira à noite carregando a mala nas costas através dos Pirineus nevados.

O fotógrafo é levado primeiramente para o campo de concentração de Argèles e depois para Bram. Consegue, com a ajuda de outros refugiados, proteger sua mala de couro de roubos, de curiosos e de confiscos. Sua carteira internacional de jornalista o ajuda a manter seu tesouro a salvo dos guardas franceses. Libertado, Centelles vai trabalhar em um estúdio próximo ao campo e envolve-se com a resistência francesa local.

Em 1944, depois de um cerco da Gestapo, o fotógrafo organiza os negativos novamente e os deixa sob custódia da família de camponeses em Carcassone. Regressa para a Espanha na clandestinidade, mas depois de dois anos entrega-se às autoridades. Em 1946 tem sua carteira de jornalista cassada, dedicando-se pelos próximos trinta anos à fotografia industrial e publicitária, até o fim do regime franquista.

A Programação

A mostra “Cinema Anarquista durante a Guerra Civil Espanhola” terá sessões diárias às 14h, 16h30 e 19h. A programação foi preparada para exigir, dentro do possível, um filme curta e um filme de longa metragem em um mesmo dia, em horários alternativos, permitindo ao público adequar seu horário pessoal com as exibições.

Dia 5 de junho

Aragon trabaja y lucha (16’, 1936)

Direção: Manuel P. de Somacarrera. Filme documental sobre a vida de vilas na região de Aragon ocupada pelas forças anarco-sindicalista procedentes da Catalunha. Mostra escaramuças na frente de batalha e atividades libertárias da retaguarda.

Aurora de esperanza (60’, 1937)

Produção: Antonio Sal. Barcelona, 1935. Filme de ficção no qual Juan é um modesto trabalhador que, ao voltar com sua família de suas férias, encontra sua fábrica fechada e todos os operários despedidos. Para evitar a fome e a miséria envia sua família para uma vila e começa a procurar trabalho, iniciando aí uma tomada de consciência junto com outros trabalhadores.

Dia 6 de junho

Em la brecha (18’, 1937)

Direção: Ramón Quadreny. Um dia na vida de um operário militante da Confederação Nacional do Trabalho (CNT) e os ideais que este sindicato manteve sobre a organização da produção em uma sociedade revolucionária.

Barrios bajos (94’, 1937)

Direção: Pedro Puche. Um jovem advogado, que somente defende os direitos dos trabalhadores, surpreende sua mulher com outro homem e mata o amante a tiro. Foge e se esconde em um bordel onde vive um amigo, um estivador chamado “El Valencia”, que o acolhe e o protege não somente da polícia, mas também das circunstâncias do lugar. A película é inspirada em um realismo poético, com marca da solidariedade e da amizade.

Dia 7 de junho

La silla vacía (18’, 1937)

Direção: Valentiín R.González. Mistura de filme documental com ficção. Mostra a história de um jovem sentando na varanda de um café que, comovido ao ver mutilados de guerra, se alista nas milícias que lutam na frente de batalha de Aragón.

Nuestro cuplable (87’, 1937)

Direção: Fernando Mignoni. Comédia delirante com números musicais e que ironiza as relações entre a justiça e a sociedade burguesa. Um simpático ladrão, “El Randa”, entra na mansão de um banqueiro e é descoberto pela amante do proprietário. Então, cada um resolve partir com seu botim, mas El Randa organiza uma festa em seu bairro e é preso pela polícia. O filme questiona o poder e a autoridade, denuncia a ganância capitalista e ridiculariza a justiça burguesa.

Dia 8 de junho

Carne de fieras (68’, 1936)

A montagem desse filme não foi finalizada no período. Ele foi recuperado pelo cineasta e restaurador Ferrán Alberich para a Filmoteca de Zaragoza, mantendo-se o roteiro original. Um filme raro do cinema de ficção, com momentos de grande lirismo, que propõe rupturas de valores, tabus e convenções. A trágica investigação sobre a história posterior dos participantes dessa película introduz um elemento dramático da vida real na narrativa ficcional. Talvez seja a mais importante produção do período. O diretor original, Armand Guerra, havia fundado em Paris, em 1913, a cooperativa Cinéma du Peuple e também realizado um filme sobre a Comuna de Paris.

O filme começa com um menino de rua que cai no lago de um parque e é salvo por um boxeador, que leva o pequeno para recuperar-se em sua casa, onde vive uma crise matrimonial. Uma jovem havia atentado o boxeador para o menino se afogando. Assistindo ao espetáculo de um circo, o homem tem seu olhar atraído para uma linda jovem que passeia nua entre os leões. É mesma jovem do parque. Ao vê-la desmaiar perante os leões, aguça-se ainda mais seu ímpeto de aproximação com o objeto do desejo.

Dia 9 de junho

Barcelona trabaja para el frente (23’, 1936)

Direção: Mateo Santos. Documentário sobre as atividades do Comitê Central de Abastos e os trabalhos de preparação de provisões em Barcelona, e também sobre a Frente de Aragón durante os primeiros meses da guerra.

Nosotros somos así! (31’, 1936)

Direção: Valentin R. Gonçalvez. Insólita comédia musical protagonizada por crianças, declamada em versos. As crianças refletem os valores adultos, enfrentam a autoridade e organizam sua própria assembléia política.

El frente y la retaguardia ( 22’, 1937)

Direção: Joaquín Giner. Filme de propaganda que mistura imagens documentais de produção industrial e agrária com cenas de ficção na frente de batalha de Aragón.

La última (15’, 1937)

Direção: Pedro Puche. No começo do filme é anunciado como uma “abordagem jocosa-séria” dos problemas causados pelo excesso de consumo de álcool, mostrando-os com humor e de forma didática.

Dia 12 de junho

Otro futuro (160’, 1989) – Sessões às 14h e 19h

Direção: Richard Post. A partir de imagens de arquivos e de depoimentos de sobreviventes da Guerra Civil Espanhola, emerge um fascinante documentário sobre a aventura libertária na Espanha. O filme explora a experiência de auto-gestão dos anarquistas e mostra as diferenças com o comunismo ortodoxo e com os valores do franquismo: abolição do dinheiro propiciando troca de mercadorias e serviços, aborto livre e gratuito dentro do processo de libertação das mulheres, educação laica, etc.

Reapresentação

Dia 13 de junho

Carne de fieras e Aurora de esperanza – 14h e 16h30

Otro futuro – 19 horas

Dia 14 de junho

Nuestro cuplable e La silla vacía – 14h e 16h30

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