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Jornal da Unicamp - Dezembro de 2000

Página 17

ARTE

Professor palhaço

Girassol é o nome dele, que transforma a arte circense em projetos sociais

RAQUEL DO CARMO SANTOS

Olhos fitos e brilhantes, o menino esboça um sorriso. Não muito largo, para não atrapalhar a concentração. Eis que surge no picadeiro o apresentador da noite e as célebres palavras são pronunciadas: "Respeitável público...". E o espetáculo começa. Estupefato, o garoto aprecia cada cena que transcorre diante de seus olhos. Antes, como em todo espetáculo, tinha levado uma moringa de água doce para assegurar a amizade dos artistas e, assim, adentrar sob a imensa lona colorida. O esforço sempre valia a pena.

Por muitos anos esse episódio havia se repetido na vida do palhaço Girassol, até que realizasse seu desejo de virar artista de circo. Ao lado de sua casa, em Fortaleza, um extenso gramado formava o local apropriado para as várias companhias de teatro do Nordeste acamparem. Quarto de uma lista de 13 irmãos, Luiz Rodrigues Monteiro Júnior, há mais de 10 anos professor do Departamento de Artes Cênicas do Instituto de Artes da Unicamp, não esconde que obteve no circo a afirmação de vários de seus valores humanos. "Lá aprendi cedo que ser útil à sociedade é fundamental", comenta.

Sua mãe, cantora de rádio e também de picadeiro, foi a maior incentivadora para a carreira de palhaço. "De todos os irmãos, o único que possuía este desejo era eu". Esta arte tradicionalmente transmitida de pai para filho, atualmente Monteiro repassa por meio de vários trabalhos acadêmicos e sociais.

O palhaço Girassol criou o Espacirco, onde ensina técnicas circenses para estudantes de vários cursos da Unicamp. E orgulha-se por ver que suas aulas oferecem bem mais que técnica e refinamento artístico. "É gratificante resgatar valores humanos e de auto-estima". Ele explica que, ao realizar performances como malabarismo, engolir fogo ou mesmo andar equilibrado em fio meio bambo, a pessoa transpõe limites inimagináveis. "Com isso, ela acaba se auto-afirmando", observa Monteiro.

Em sua lembrança, não faltam casos de alunos que chegaram ao Espacirco com pensamentos de auto-destruição. No processo de aprendizado, esse indivíduo se sente realizado ao se ver capaz, por exemplo, de executar malabarismos ou de fazer uma criança rir. Isso exige em harmonia no corpo e mente. "É impossível andar sobre o fio com o pensamento voltado para problemas familiares ou profissionais", ensina Girassol.

Grito de liberdade – O professor acrescenta que muitos alunos do circo possuem um histórico complicado. Quando um deles consegue engolir fogo, superando as barreiras do aprendizado, é seu grito de liberdade. Essa pessoa resgata diversos valores esquecidos ou não compreendidos dentro dela.

No circo são solidificadas as relações humanas, afirma Monteiro. Ali prevalece a filosofia do estímulo à vida, dentro de uma forte estrutura familiar – embora diferente daquela de um lar tradicional –, o que oferece elementos significativos para o entendimento de si mesmo. "Em lares tradicionais não se encontra criança com a consciência de cidadania antes dos 7 ou 8 anos de idade. No circo, esse aspecto é forte desde o nascimento".

Desde cedo no picadeiro

Fucha, Trampolho, Barnabé e outros palhaços iniciaram-se cedo na arte do circo. Com idades entre 9 e 10 anos, são alguns dos 16 integrantes da oficina de circo do Centro Cultural Evolução. É um trabalho social gratuito que o palhaço Girassol realiza por prazer. "Muitas dessas crianças me fazem lembrar da minha própria história". De classe média ou baixa, os pequenos alunos misturam-se às cores do picadeiro, onde também não há lugar para diferenças étnicas. Ali, a grande diversão é fazer palhaçadas.

Fucha é quem dá nomes a todos os outros. O seu nome verdadeiro, não diz. Confessa apenas que tem como maior sonho tornar-se atriz. Outro palhaço, Alexsandro Prazeres Machado, de 9 anos, quando perguntam sobre o que gostaria de ser quando crescer, também responde sem vacilar: apresentador de circo. Morador do Jardim Carlos Lourenço, ele ficou sabendo da oficina por meio de uma vizinha e teve que insistir muito para conseguir o consentimento da mãe. "Quando chego aqui, tenho a impressão de estar em um circo". Colocar o nariz vermelho e pintar o rosto com cores fortes é um ritual de transformação, que transporta esse menino de sua realidade para um outro mundo, o mundo da fantasia.

Trambolho, ou Samuel Henrique Bispo dos Santos Linares, de 9 anos, começou as aulas ainda mal impressionado. Não conseguia esquecer o episódio ocorrido em abril deste ano na região metropolitana de Recife, quando dois leões atacaram e mataram uma criança de seis anos. Mas as atividades tornaram-se tão alegres e envolventes que o garoto já não guarda temores. O desejo satisfeito de fazer acrobacias, malabarismo e palhaçadas superou todas as barreiras, inclusive a de sair sozinho da vizinha Hortolândia para freqüentar as aulas no centro de Campinas.

Henrique Semeghini conseguiu furar as regras e participar das aulas para crianças, apesar dos 23 anos de idade. Estudante de teatro, quer se especializar nesta área. "Todos os elementos que estou aprendendo servirão para melhorar minha performance como ator", garante. Henrique lembra que antes do início das aulas estava em uma turnê, representando um drama extremamente pesado. "Agora estou aqui fazendo palhaçadas. Este tipo de exercício é fundamental para o ator", comenta.

Além das oficinas no Evolução, Monteiro, o Girassol, mantém contato com agências de publicidade que promovem eventos circenses e acaba indicando os próprios alunos para trabalhos temporários. Encontra tempo para dar cursos a adolescentes do Externato São João e que integram o projeto Ilê Axé, coordenado pela pós-graduanda Lara Machado, do IA. Faz apresentações em creches da Unicamp e também ensina pessoas que querem levar a arte do circo para a periferia


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