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Jornal da Unicamp - Dezembro de 2000

Página 14

ENSINO

Gestos e acessos

Para a maioria, basta dar um sinal e subir no ônibus; outros gostariam que o direito de ir e vir se desse de forma tão simples

ADRIANA MIRANDA

Ela andou de ônibus pela primeira vez aos 27 anos. Com a mesma idade atravessou sozinha uma rua movimentada de metrópole e sentiu-se como um hebreu no caminho aberto por Moisés em meio ao Mar Vermelho. Mas o que mais aborrece a psicóloga Hilda Maria Aloisi não são as experiências tardias, e sim o fato de não poder vivenciá-las no Brasil. Para ver respeitado seu direito de ir e vir teve de viajar à Califórnia, porque aqui a acessibilidade para portadores de deficiência física inexiste.

Hilda Maria é integrante do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diversidade (Leped) da Unicamp e fez seu relato durante o III Encontro sobre Comunicação e Mobilidade Aumentativa e Alternativa (ECMAA), ocorrido de 6 a 8 de novembro, no Centro de Convenções da Universidade, evento organizado pela Faculdade de Educação e Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (Feec). Como era de se esperar, não faltaram queixas contra o tratamento dado a portadores de deficiência, embutido de preconceitos por parte das "pessoas normais".

Já se passaram 19 anos, mas Hilda não se esquece de sua passagem pelos Estados Unidos como usuária de serviços públicos. "Durante três meses fui cidadã, como todo mundo. Participei de tudo. Quando atravessava as ruas, os carros paravam. Antes de entrar no ônibus, o motorista perguntava se eu precisava de ajuda". Gestos e acessos. Tão distantes de acontecer no Brasil.

Com base em suas experiências também em países europeus, a psicóloga Hilda, que se doutorou pela Unicamp, na FE/Leped, em 1999, afirmou que o princípio maior não é o da oportunidade, mas o do valor do ser humano. "Oportunidade, você ganha. Valor, você conquista". E a conquista deste valor, segundo ela, só ocorre por meio da inclusão nas escolas. "São as crianças que vão transmitir isto para a sociedade. Se a criança é incluída, vamos chegar a uma inclusão social".

Hilda afirma que, como usuária, enfrenta vários obstáculos físicos, mas a pior barreira é a de atitude. Por exemplo, quando vai a uma loja e precisa de crédito. "Olham como se eu não pudesse abrir um crediário. Mas não arredo pé. Levo na esportiva e exijo o meu direito. É uma questão de atitude".

Obstáculos também estão no caminho da coordenadora de Educação Especial da Secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte e presidente do Conselho Municipal de Portadores de Deficiência, Elisabet Dias de Sá. Ela reclama da falta de políticas públicas que facilitem a vida dos portadores de deficiência visual. "Quem enxerga não tem dificuldade de se mover, mas as calçadas estão cheias de obstáculos como orelhões, carrinhos de cachorro-quente e automóveis", acusa.

Livro e prêmio – Hilda, Elizabet e Vinícius Garcia, presidente do Centro de Vida Independente (CVI) de Campinas – organização não-governamental – relataram suas experiências como usuários de serviços em uma das mesas-redondas do III ECMAA. Objetivos como agregar valor social ao conceito de deficiência, acessibilidade em ambientes educacionais e ao trabalho, tecnologia como suporte na reabilitação e aspectos legais da acessibilidade também foram discutidos.

Coordenadora do Leped e uma das organizadoras do evento, a professora Maria Teresa Mantoan ficou satisfeita. "Fizemos uma discussão amadurecida". Na ocasião foi lançado o livro Mobilidade, Comunicação e Educação: Desafios à acessibilidade. O livro trata da acessibilidade por meio de capítulos escritos por pessoas de diferentes áreas, todas elas ligadas à garantia do acesso de todos aos bens, aos espaços físicos, informações, conhecimentos disponíveis na sociedade.

Informações sobre o livro e o prêmio: (19) 3788-9290 ou quevedo@unicamp.br

Por uma escola aberta

Ensino inclusivo implica em acolher alunos
que ‘não são como nós’, sem preconceitos

MARIA TERESA EGLÉR MANTOAN

Todas as transformações que começam a despontar no mundo contemporâneo estão direta ou indiretamente relacionadas à acessibilidade, entendida como condição pela qual cada um de nós, independentemente de nossas habilidades e competências, pode interagir adequadamente com o meio em que vivemos.

Como então buscar uma maneira de tornar a acessibilidade uma conquista de todos e para todos? Seria uma pretensão de nossa parte solucionar esta questão, porém nos dispomos a enfrentá-la, na medida de nossas forças. A tarefa é desafiante, pois trata-se de um conceito que, pela extensão de seu significado, necessita de diferentes sistemas interpretativos e de novas explicações e artefatos que dêem conta da sua complexidade.

Na educação formal acessibilidade tem a ver com o acesso de todos ao conhecimento, ou seja, com o direito de todos ao saber, independentemente de suas possibilidades intelectuais, sócioculturais.

Mas como garantir esse direito, sem considerar as diferenças?

Ninguém é justo e ético se não reconhece as diferenças entre as pessoas e fazem delas o nosso direito de ser gente – livre, feliz.

A diferença é, portanto, o que existe. E porque ela existe é que inventamos a igualdade.

A educação cumprirá seu papel na garantia do direito de todos ao saber, se reconhecer que a diferença está em cada um de nós, no corpo de cada um e que não se presta para formar classes de pessoas que juntamos arbitrariamente pela igualdade, ou melhor, que inventamos para continuarmos a nos envaidecer da nossa normalidade, de nossas técnicas e conhecimentos especializados.

Quando classificamos ou excluímos os alunos que "não são como nós" e os enquadramos em modalidades de ensino especial, estamos nos servindo desses aparatos do saber, para enquadrar pessoas, definindo de fora as suas necessidades educativas, e as soluções para atendê-las.

Não sabemos de antemão como e quanto alguém será capaz de aprender e por que meios alguém chega a ser um pensador, um artista, um profissional, um artesão, um trabalhador, enfim. Nem a partir de que encontros com o outro e com a vida, com um texto, uma palavra, uma imagem alguém se pôs a pensar, a distinguir, a definir um caminho para a sua existência.

O acesso de todos à educação implica em escolas inclusivas, em que todos os alunos são bem-vindos.

Abrir as escolas a todos, indistintamente, acolher as diferenças, sem preconceitos e barreiras, envolve mudanças de base no ensino que hoje é ministrado, na maioria de nossas escolas públicas e particulares.

As reformas educacionais propostas pelas escolas para todos desafiam a nossa capacidade de ensinar, tal como aprendemos na nossa formação inicial e na continuidade de nossos estudos pedagógicos, pois a proposta de se ensinar todos os alunos, sem quaisquer discriminações, revolve a estrutura e o funcionamento das escolas e questiona suas práticas conservadoras, da formação do professor ao currículo, à avaliação do progresso dos alunos.

O mistério do aprender valoriza a profissão de ensinar, pois nos faz humildes com relação ao que não sabemos do Novo, que é o aluno que nos chega em cada turma: o menino inteligente, a criança com deficiência, com dificuldades de toda ordem, o menino de rua, o aluno do Supletivo, o candidato a um curso superior, à pós-graduação... Por outro lado, são os alunos que nos fazem profissionais apaixonados, inquietos, que precisam decifrar esses misteriosos seres, que nos provocam o encontro com o desconhecido, que nos colocam em perigo, que nos mostram os nossos limites, mas que nos fazem ir além de nós mesmos.

Cumprir o direito de todo o aluno ser incluído em uma turma escolar tem a ver, portanto, com o que entendemos por acessibilidade na sua concepção mais abrangente, quando reconhecemos e valorizamos as diferenças, sem paternalismo e considerando o outro, como nosso complemento, como parte constituinte da nossa identidade.

Maria Teresa Eglér Mantoan é professora da Faculdade de Educação (FE) da Unicamp e coordenadora do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino e Diversidade (Leped)


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