Edição nº 560

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 06 de maio de 2013 a 12 de maio de 2013 – ANO 2013 – Nº 560

Vigilância Inteligente

Estudo desenvolvido na FEEC dá primeiro passo para o desenvolvimento,
no país, de radar do tipo cognitivo multifuncional

Pesquisa realizada na Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) da Unicamp deu o primeiro passo para o desenvolvimento, pelo Brasil, de um radar do tipo cognitivo multifuncional. A tecnologia, que pode ter aplicações civis e militares, como no campo meteorológico ou no da proteção do espaço aéreo, é dotada de um sistema inteligente capaz tanto de priorizar o alvo de interesse quanto de determinar o uso dos recursos disponíveis para o seu monitoramento. O autor do estudo foi o engenheiro eletrônico Bruno Suarez Pompeo, primeiro-tenente do Exército. O trabalho, em nível de mestrado, foi orientado pelo professor Rafael Santos Mendes.

De acordo com Pompeo, as pesquisas em torno dos radares cognitivos multifuncionais ainda estão em fase inicial no mundo todo. Exatamente por isso, pondera, é que o Brasil precisa investir nesse tipo de estudo, para não correr o risco de se tornar tecnologicamente dependente. “Eu participei de alguns eventos científicos internacionais e pude constatar que o tema tem despertado o interesse de diversas nações. As informações disponíveis dão conta de que nenhuma delas chegou a desenvolver sequer um protótipo desse equipamento. Assim como nós, os pesquisadores estrangeiros também estão na fase das simulações”, informa.

O radar cognitivo multifuncional, como o nome indica, é um equipamento dotado de um sistema inteligente. Ele tem a capacidade para realizar diversas tarefas, seja de forma separada, seja de maneira combinada. Dito de modo simplificado, a tecnologia pode ser usada para controlar o tráfego aéreo, fazer a defesa antiaérea ou monitorar as condições meteorológicas. “O radar pode atuar isoladamente em cada uma dessas frentes ou em todas elas simultaneamente. Essa atuação é feita de forma cognitiva. Ou seja, primeiro ele realiza uma varredura para fazer o reconhecimento do cenário. Em seguida, de maneira automática, ele orienta a sua antena eletronicamente e usa de forma otimizada os recursos disponíveis. Tudo isso, claro, pode ser alterado pelo operador, que tem autonomia para interferir nas decisões”, detalha Pompeo.

Para tornar a explicação mais clara ainda, o autor da dissertação faz uso de uma analogia com os semáforos que controlam o tráfego de veículos nas vias urbanas. Os aparelhos são programados para promover a mudança de fase (cores verde, amarelo e vermelho) de acordo com o tempo ou o fluxo de automóveis. “Entretanto, se houver um acidente e um guarda de trânsito estiver no local, ele poderá intervir e orientar os motoristas da maneira como achar mais conveniente. No caso do radar cognitivo, ele constitui uma ferramenta importante para ajudar o operador na tomada de decisão”, esclarece. Valendo-se de um cenário hipotético, o pesquisador aponta uma possível situação na qual o radar cognitivo poderia atuar. “Vamos imaginar que temos diversas aeronaves em voo. Ao mesmo tempo em que quero controlar um avião amigo e manter contato com ele, quero também monitorar outro, supostamente mal intencionado. Nesse caso, o radar primeiramente realiza a vigilância e faz o reconhecimento prévio do cenário. Na sequên-cia, ele decide, de forma automática, quais são os alvos prioritários. A partir daí, ele destina mais energia para o acompanhamento da aeronave que oferece perigo, e menos para a aeronave amiga”, pormenoriza.


Três frentes

Pompeo conta que o seu estudo teve que cumprir três frentes. A primeira foi baseada em uma tecnologia denominada “arranjo de antenas”, que data da década de 1960 e que vem sendo bastante utilizada ultimamente em pesquisas envolvendo radares. O desafio cumprido pelo autor da dissertação foi estabelecer um diagrama de radiação, que vem a ser a quantidade de energia que deve ser direcionada para cada ponto do espaço, coerente a cada operação. Para isso, é preciso levar em consideração dois parâmetros: amplitude e fase. “Para tornar o entendimento mais claro, vamos imaginar o radar instalado na torre de um aeroporto. O equipamento, que é imenso, fica girando para vigiar o espaço aéreo. No caso do arranjo de antenas, não há um motor que as faça girar. A mudança de energia de um ponto para o outro é feita de forma eletrônica. Os feixes de energia são direcionados automaticamente para os pontos desejados”. A segunda frente superada por Pompeo foi o desenvolvimento de métodos para fazer com que a tecnologia fosse capaz de tomar decisões. “Nós criamos um sistema de inteligência, de tal maneira que o radar pudesse decidir o que fazer e, posteriormente, fornecesse às antenas a ordem para que elas conferissem peso (prioridade) aos vetores. Desse modo, ele é capaz de mudar eletronicamente as fases e amplitudes das antenas, o que permite que o feixe de energia fique concentrado num determinado vetor aéreo”, reforça.

A terceira e última fase do trabalho consistiu na concepção de um simulador que pudesse juntar os dois módulos anteriores – o arranjo de antenas e o sistema inteligente. Ao rodá-lo, Pompeo finalmente validou o seu estudo. “O interessante desse simulador é que ele também pode ser usado pela academia, no ensino de disciplinas na área de radar, tema muito pouco explorado no Brasil. Aqui, ainda temos poucos grupos que se dedicam a esse assunto. Tanto é verdade, que encontrei muitas dificuldades para realizar meu trabalho. Uma delas foi a inexistência de ampla literatura científica sobre radares”, relata.

Outro problema enfrentado por Pompeo foi que, a despeito de serem referências em suas áreas de pesquisa, os professores da Unicamp também não tinham grande experiência em estudos sobre radares. “A conclusão da minha dissertação somente foi possível por causa da conjugação de esforços, tanto do meu orientador quanto de outros docentes da FEEC. Além disso, eu também colaborei com a minha experiência, dado que pertenço ao Grupo de Radar do Centro Tecnológico do Exército [CTEx], que fica localizado no Rio de Janeiro”, pontua. O primeiro-tenente fez questão de destacar, ainda, que o estudo realizado por ele também foi importante para aprofundar a relação entre o Exército e o meio acadêmico. “Penso que a cooperação entre as universidades e as forças armadas é muito positiva e pode trazer inúmeros benefícios ao Brasil. No âmbito das forças armadas, as questões relacionadas ao ensino superior estão restritas ao IME [Instituto Militar de Engenharia], onde me formei, e ao ITA [Instituto Tecnológico de Aeronáutica]. Isso precisa ser expandido através de parcerias com as boas instituições, como a Unicamp. O Exército, por exemplo, tem incentivado os seus membros a buscarem cada vez mais a qualificação profissional em suas áreas de atuação. Eu agradeço a oportunidade que tive ao fazer, nos últimos dois anos, o mestrado na Unicamp, período em que estive lotado na 11ª Brigada de Infantaria Leve de Campinas”, conclui.

 


Publicação

Dissertação: “Priorização de tarefas e otimização do diagrama de arranjo de antenas em radares cognitivos multifuncionais”
Autor: Bruno Suarez Pompeo
Orientador: Rafael Santos Mendes
Unidade: Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC)