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Análises laboratoriais do produto são feitas
a partir da contagem das células somáticas do leite

Por um queijo de melhor qualidade


MANUEL ALVES FILHO



A professora Mirna Lúcia Gigante manipula amostras de queijo prato, o segundo mais consumido do país: trabalhos apresentados nos EUA (Foto: Antoninho Perri)Linha de pesquisa conduzida pela Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp avalia a relação entre a qualidade do leite e a do queijo, tomando como base a contagem das células somáticas presentes na matéria-prima. Esse parâmetro análise, que só passou a ser considerado no Brasil em 2002, por força de uma legislação federal, já é consagrado em países da União Européia e nos Estados Unidos. De acordo com a coordenadora dos trabalhos, professora Mirna Lúcia Gigante, os estudos estão sendo feitos com o queijo prato, o segundo mais consumido no país –perde apenas para a mussarela -, mas podem ser aplicados a outros derivados lácteos. “Nosso objetivo é mostrar a importância da qualidade do leite na obtenção de produtos lácteos de melhor qualidade e com maior rendimento da matéria-prima na indústria”.

Parâmetro só passou a vigorar no país em 2002

As pesquisas, que têm o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), estão sendo desenvolvidas com a colaboração do professor Marcos Veiga dos Santos, da Faculdade de Zootecnia e Medicina Veterinária da USP, em Pirassununga. Ele é o responsável pelo controle do rebanho que fornece o leite usado na fabricação dos queijos analisados na FEA. De acordo a docente da Unicamp, o procedimento é o seguinte. Primeiro, os pesquisadores fazem a ordenha individual de 40 vacas. Depois, o leite tem a sua composição analisada e a contagem das células somáticas, efetuada. Em seguida, os animais são separados em dois grupos: um formado pelas vacas cujo leite apresentou baixa contagem de células somáticas (por volta de 200.000 células/ml) e outro constituído pelos animais cujo leite teve alta contagem (em torno de 700.000 células/ml).

Desse modo, explica a professora Mirna Gigante, é possível identificar de qual grupo partiu o leite que deu origem aos queijos tomados para estudo. “O objetivo é compará-los, de modo a verificar as diferenças existentes entre eles”, explica. E as diferenças são pronunciadas, conforme a pesquisadora. Mas antes de falar sobre elas, faz-se necessário esclarecer que a presença de células somáticas do leite é natural e decorrente do processo de descamação do úbere do animal. Entretanto, o seu aumento pode ser entendido como uma reação do organismo do animal, que produz células de defesa que migram do sangue para o interior da glândula mamária dos animais, com o objetivo de combater os agentes causadores da mastite, que é a infecção mais comum dos rebanhos leiteiros. A contagem dessas células indica, portanto, o estado de saúde da glândula mamária. Ressalte-se que a mastite altera a composição do leite e reduz a produtividade do rebanho, situações que refletem tanto no nível de aproveitamento da matéria-prima pela indústria quanto na qualidade dos produtos lácteos, no caso o queijo.

Pois bem, voltando à questão das diferenças entre o queijo produzido a partir do leite com alta contagem de células somáticas e o preparado com a matéria-prima com baixa contagem, os pesquisadores da FEA constataram que o primeiro apresenta características muito distintas do segundo. A maior presença de células somáticas aumenta o tempo de coagulação do leite, com prejuízo para o rendimento do processo industrial. Além disso, interfere na composição, na textura e na maturação do queijo. Para usar um termo popular, o produto fica mais mole e úmido. Além disso, o seu pH também fica mais alto, o que altera as características típicas do produto. Embora a pesquisa ainda não tenha atingido a etapa da análise sensorial, a professora Mirna Gigante acredita ser razoável imaginar que essas alterações tenham influência no sabor do queijo.

Mas como evitar que o leite apresente alta contagem de células somáticas? Segundo a docente da FEA, a resposta está fundamentalmente no controle do rebanho. Manejo adequado dos animais, cuidados durante a ordenha e a adoção de medidas sanitárias rigorosas são fundamentais para alcançar esse objetivo. De acordo com a professora Mirna Gigante, o advento da legislação foi um passo importante nesse sentido. O texto estabelece como padrão máximo inicial a presença de 1 milhão de células somáticas por mililitro de leite, embora nos ensaios os pesquisadores trabalhem com o teto de 750 mil. A mesma lei prevê que até 2011 esse limite caia para 400 mil, o mesmo adotado pelos países da União Européia. A especialista da Unicamp destaca que, embora traga prejuízos para a pecuária e a indústria de alimentos, a alta concentração de células somáticas no leite não representa um perigo à saúde das pessoas. Participam da pesquisa os pós-graduandos Priscila Vianna e Guillaume Mazal. O estudo gerou dois trabalhos que foram apresentados recentemente em um evento científico nos Estados Unidos.

Ainda como parte da linha de pesquisa conduzida pela FEA, uma aluna de iniciação científica da professora Mirna Gigante está se dedicando ao estudo dos efeitos dos resíduos de antibióticos na fermentação do leite. A presença do resíduo de antibióticos no leite é conseqüência do tratamento da mastite e da não observância de procedimentos adequados. Os ensaios preliminares já fornecem uma evidência de que o medicamento dificulta o processo. Isso pode representar atraso na produção dos derivados lácteos fermentados e, conseqüentemente, prejuízos para a indústria. Além disso, traz prejuízo para a população que consome o produto com o antibiótico. “Também nesse caso, a solução está na ponta da cadeia, que é o controle do rebanho. Os animais que recebem antibióticos têm que ser isolados dos demais durante o tratamento e o seu leite, descartado”, ensina a especialista.


A professora Mirna Lúcia Gigante manipula amostras de queijo prato, o segundo mais consumido do país: trabalhos apresentados nos EUA (Foto: Antoninho Perri)País produziu 23, 4 bilhões
de litros de leite em 2004

O Brasil é o sexto maior produtor de leite do mundo e apresenta uma taxa de crescimento da ordem de 4% ao ano. Em 2004, foram produzidos 23,4 bilhões de litros. O país responde por 66% do volume total de leite gerado pelos vizinhos do Mercosul. De acordo com dados da Embrapa Gado de Leite, o produto está entre os seis mais importantes da agropecuária brasileira, ficando à frente do café beneficiado e arroz, por exemplo. O agronegócio do leite e seus derivados cumprem um papel significativo no suprimento de alimentos e na geração de emprego e renda para a população. O Brasil tem atualmente cerca de 1,1 milhão de propriedades que exploram leite, ocupando diretamente 3,6 milhões de pessoas.

As estimativas dão conta de que para cada R$ 1 investido na produção agroindustrial desse segmento, ocorre um incremento de aproximadamente R$ 5 no Produto Interno Bruto (PIB) nacional. Isso faz com que o agronegócio do leite supere setores como o da siderurgia e o da indústria têxtil. Ainda segundo a Embrapa Gado de Leite, de cada R$ 10 gerados pela agropecuária brasileira, metade vem do leite. O consumo desse alimento no país é da ordem de 127 litros por habitante por ano, número próximo do recomendado pela Organização Mundial da Saúde, que é de 146 litros.

O leite é rico em uma grande quantidade de nutrientes essenciais ao crescimento e à manutenção de uma vida saudável. A indústria de laticínios tem potencializado o valor nutritivo do produto. Existem no mercado uma série de bebidas lácteas enriquecidas com vitaminas, minerais e ômegas, assim como leites especiais para as pessoas que não conseguem digerir a lactose. Embora seja essencial para crianças até os 12 anos, o leite também é importante na fase adulta. O consumo diário de três copos garante uma vida saudável na maturidade e ajuda a evitar problemas na terceira idade. Estudos comprovam que o seu consumo diário reduz a incidência de osteoporose.


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