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Pesquisadores do IQ desenvolvem teste instantâneo
e altamente sensível que detecta adição de solventes

Uma chance de pôr
fim à gasolina adulterada




LUIZ SUGIMOTO


O pesquisador Renato Haddad: fechando o ciclo na análise da qualidade dos combustíveis (Foto: Antoninho Perri)Pesquisadores do Instituto de Química (IQ) da Unicamp acabam de depositar a patente de um novo método para detectar adulterações através da adição de solventes à gasolina: é um teste simples, com resultado quase instantâneo e que pode inviabilizar esta prática ilícita no mercado de combustíveis. Até aqui, a adulteração da gasolina parecia um problema insolúvel, devido ao lucro fácil que estimula a incidência freqüente e às dificuldades logísticas de fiscalização pela ANP (Agência Nacional do Petróleo). Nesse andar da carruagem, a expedição de um laudo que fundamente a autuação ou interdição do estabelecimento infrator pode demorar semanas. Segundo dados da ANP (atualizados em 8 de abril), em 2005 a agência realizou 307 autuações e 234 interdições por qualidade do combustível, quando existem perto de 30 mil postos comercializando gasolina no país.

Metodologia agiliza fiscalização de postos

“Se tivermos amostras de todos os postos de Campinas, revelamos no mesmo dia quais vendem gasolina boa e quais vendem a adulterada”, assegura o professor Marcos Nogueira Eberlin, do Laboratório Thomson de Espectrometria de Massas. Para ilustrar o método, o pesquisador recorre ao teste usual em que se adiciona água à gasolina para medir o teor de álcool anidro – e que o posto é obrigado a realizar caso o cliente solicite. “Realizado esse teste do álcool, que é muito simples, poucos microlitros da mesma água, injetados em nosso equipamento, são suficientes para detectar também a presença de solventes como aguarrás e querosene, mesmo a baixos teores como 1% ou 2%. É bom ressaltar que a gasolina pode ser considerada boa por testes clássicos de especificação em hidrocarbonetos, mas ainda assim ter sido adulterada”, adverte. Na ANP, a adulteração é identificada através de análises físico-químicas mais complexas, o que torna o processo moroso.

O novo método é um achado dentro do trabalho de pós-doutorado de Renato Haddad, em colaboração com o grupo de pesquisa do professor Rodinei Augusti, da Universidade Federal de Minas Gerais. Um “ovo de Colombo”, segundo os pesquisadores, porque surpreende por sua simplicidade e eficácia, inclusive a especilistas da Petrobrás que analisaram e referendaram a metodologia. “A gasolina contém compostos polares, seus marcadores naturais que são identificados por nosso equipamento e registrados nitidamente em um gráfico denominado espectro. Os solventes, da mesma forma, possuem compostos polares que são seus marcadores naturais e que não são encontrados na gasolina. Quando há adulteração, surge no espectro sinais adicionais que denumciam a adulteração”, explica Haddad.

A adulteração – Na adulteração usa-se diversos solventes, alguns de baixa qualidade, que via de regra são obtidos ilicitamente. “Esses solventes, como o de borracha, a aguarrás e o querosene são impróprios para uso como combustível automotivo, pois danificam o motor e seus componentes, além de prejudicar o meio ambiente e causar forte evasão fiscal”, comenta Renato Haddad..

No intuito de combater esse problema, a ANP investiu no desenvolvimento de um método em que solventes produzidos no país recebem um marcador químico – substância que não faz parte de sua composição natural. A presença do marcador artificial na gasolina denuncia a adulteração com o solvente, mas trata-se de processo trabalhoso que também exige análises de laboratório e toda uma logística para a marcação e a fiscalização. “Além disso, mesmo com tal medida, há também o contrabando de solventes, que assim escapam da fiscalização por não conterem tais marcadores”, aponta Eberlin.

Estratégia – A adulteração pode ocorrer de várias maneiras, como na própria distribuidora, dentro do barracão em zonas rurais que acoberta a mistura feita no caminhão-tanque, no posto de gasolina que de madrugada “batiza” seu reservatório. Como flagrar a falcatrua? “Ao invés de colocar a ‘polícia para correr atrás’ dessa imensa e diversificada rede, devemos simplesmente procurar formas de inviabilizar o negócio. Nossa metodologia permite intensificar e agilizar o monitoramento dos postos de gasolina de maneira exponencial, pois adulterações podem ser detectadas em menos de um minuto – praticamente o tempo necessário para a mistura da amostra com a água”, garante o professor do IQ.

Prevendo dificuldades operacionais da ANP para viabilizar essa fiscalização de campo, os próprios pesquisadores adiantam a negociação da patente com uma grande distribuidora, que colocaria o método em prática junto aos postos sob sua bandeira. “O equipamento possui as dimensões de um microcomputador e pode ser facilmente adaptado a unidades móveis que monitorariam a qualidade do combustível vendido nos postos. Ao constatar a adulteração, as distribuidoras cancelariam a concessão do estabelecimento”, propõe Renato Haddad.

Bandeiras – A página da ANP traz 29.804 postos de combustível cadastrados no país até 2002, sendo 21.819 (73,3%) com bandeira e 7.985 (26,7%) sem bandeira. Do total de estabelecimentos com bandeira, 81% (17.717) recebem combustível das grandes distribuidoras: Petrobrás, Ipiranga, Texaco, Esso, Shell e Agip, pela ordem do número de concessões. “Estimo que quatro unidades móveis equipadas poderiam cobrir, em uma semana, a maioria dos postos de uma grande distribuidora em todo o Estado de São Paulo. Havendo monitoramento em intervalos tão rápidos, o risco seria altíssimo, inviabilizando a adulteração”, pondera Marcos Eberlin.

O pesquisador estima em aproximadamente R$ 150 mil o custo para equipar uma unidade móvel com tal tecnologia, valor altamente compensador diante dos enormes prejuízos financeiros provocados pela adulteração. “Acreditamos que o controle pelas próprias distribuidoras é o caminho mais viável para eliminar a adulteração de combustíveis no Brasil. Em contrapartida, é fácil imaginar o benefício, em temos de marketing, para determinada distribuidora que anuncie o uso de uma tecnologia nacional gerada na Unicamp para garantir a qualidade do combustível que comercializa. Eu, enquanto brasileiro e consumidor, abasteceria o carro somente em postos de gasolina com essa bandeira”, argumenta Eberlin.


IQ fecha um ciclo sobre combustíveis

“Podemos afirmar que o Instituto de Química acaba de fechar um ciclo na utilização de ‘inteligência química’ para análise da qualidade dos combustíveis”, afirma o professor Marcos Eberlin, referindo-se a uma pesquisa correlata divulgada pelo Jornal da Unicamp há poucas semanas. A edição nº 283 traz a tese de doutorado de Luiz Alexandre Sacorague, orientada pelo professor Jarbas José Rodrigues Rohweder, mostrando como reduzir horas de trabalho e uma dezena de equipamentos utilizados na análise da composição dos combustíveis a um único aparelho chamado espectrofotômetro e a um computador, que apresenta os resultados na tela em questão de minutos.

“O professor Jarbas Rohweder viabilizou, com um único equipamento científico, a realização de dezenas de testes que antes eram feitos por uma série de técnicas convencionais em química. É a tendência na área. Aqui em meu laboratório também não vemos mais fracos, fornos, colunas e processos de destilação, mas sim instrumentação cientifica moderna e eficiente”, comenta Eberlin. A Agência Nacional do Petróleo (ANP) mantêm convênios com dezenas de laboratórios de instituições públicas para monitorar a qualidade dos combustíveis comercializados no país. São coletadas amostras e determinados pelo menos 15 parâmetros físicos, como índice de octanagem, temperatura de destilação, cor e densidade.

Segundo Marcos Eberlin, o método para detectar a adição de solventes ou querosene à gasolina, desenvolvido sob sua orientação pelo pós-doutorando Renato Haddad, vem complementar o trabalho dos colegas de Instituto. “É possível adulterar a gasolina sem que ela fuja das especificações, adicionando uma quantidade de solvente que não altere a análise dos componentes majoritários. Nosso método é seletivo, focado nos compostos polares e no controle da adulteração. O método do professor Rohweder permite monitorar a composição da gasolina em seus componentes majoritários, os hidrocarbonetos, e atestar suas especificações clássicas de qualidade. Ou seja, são dois métodos inovadores baseados em instrumentação cientifica moderna, e que se complementam ”, afirma Eberlin.



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Fotos: Antoninho PerriFoto: Divulgação(Foto: Antoninho Perri)(Foto: Antoninho Perri)