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Comunidade científica preocupada com futuro dos fundos setoriais e do CGEE

O órgão, responsável pela assessoria técnica dos 14 fundos setoriais, deixa de ser subordinado exclusivamente ao MCT e passa a integrar a órbita de influência de Luiz Gushiken, titular da Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica e um dos principais assessores do presidente Luiz Inácio Lula da Silva

Depois de quase ser extinto pelo ministro da Ciência e Tecnologia, Roberto Amaral, o Centro de Gestão de Estudos Estratégicos (CGEE) pode deixar de ser um braço exclusivo do MCT, passando a integrar a Secretaria de Comunicação de Governo e Gestão Estratégica comandada por Luiz Gushiken, um dos principais conselheiros do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As negociações para a transferência começaram há cerca de um mês, em clima tenso, e já estão em fase avançada, segundo fontes do governo federal. Gushiken tem se reunido com o presidente do centro, Evandro Mirra, e com o empresário Eugênio Staub, que deverá ter papel importante na nova formatação do CGEE.

Mirra confirma as negociações com Gushiken. "Estamos sendo contatados para participar, de maneira mais efetiva, do grupo estratégico que subsidiará a formulação de políticas de desenvolvimento do país", disse Mirra ao Jornal da Unicamp. Segundo ele, Gushiken pretende usar o CGEE para estudos estratégicos não apenas na área de C&T, mas também nas demais linhas de ação do governo, inclusive aquelas com viés social, como o programa Fome Zero. A expectativa é que nos próximos dias o plano seja levado aos demais ministérios, que aprovarão ou não a proposta.

Seja qual for o destino do CGEE, uma coisa é praticamente certa: o centro deverá deixar de fazer assessoria técnica para os 14 fundos setoriais, destinados ao financiamento de inovação tecnológica. Embora a medida ainda não houvesse sido anunciada oficialmente até o final da semana, o MCT já deixou claro que não pretende usar o centro para esse fim. A principal evidência foi a demissão, há dez dias, de 30 dos 60 técnicos que compunham o centro. Todos os demitidos faziam assessoria técnica para os fundos setoriais.

Com os cortes, o MCT reduziu pela metade o orçamento do centro, que este ano deverá ficar em R$ 3 milhões, suficientes apenas para manter sua estrutura administrativa. Nos bastidores, porém, circula a versão de que, para o novo comando do MCT, o CGEE estaria extrapolando suas funções, atuando como formulador de políticas de C&T, o que desagradava a cúpula do ministério. Foi necessária uma intervenção direta de Gushiken para convencer o ministro Roberto Amaral sobre a importância do centro, o que garantiu sua sobrevivência, pelo menos por enquanto.

Mesmo assim, a demissão dos técnicos deixou uma pergunta no ar. Se o CGEE não fará mais assessoria técnica para os fundos setoriais, quem fará esse serviço? Até o fechamento dessa edição, ninguém no MCT sabia responder. Procurado pela reportagem, o secretário executivo do ministério, Wanderley de Souza, não se manifestou. Criados há um ano e meio pelo governo FHC, os fundos são destinados, por lei, ao financiamento de inovação tecnológica para empresas. Seus recursos são formados principalmente por uma contribuição sobre a importação de tecnologia e um percentual sobre o faturamento de concessionárias. Atualmente, essa verba equivale a cerca de R$ 700 milhões, único dinheiro "carimbado" para pesquisa aplicada, visando ao desenvolvimento de mercadorias com maior valor agregado e, portanto, maior competitividade interna e externa.

Até o final do governo FHC, era com base nos pareceres técnicos do CGEE que os comitês gestores dos fundos decidiam pela liberação ou não dos recursos. Os subsídios fornecidos pelo centro tiveram papel fundamental, por exemplo, no lançamento do programa nacional de células a combustível, considerado estratégico para o setor energético. Com as mudanças em curso, cogita-se no MCT transferir a articulação entre os fundos para a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico (CNPq). Entretanto, fontes ligadas ao setor acreditam que nenhum dos dois órgãos teria estrutura e material humano capacitado para isso.

Mudança de rota é questionada

Alguns integrantes dos comitês gestores já começam a questionar a mudança de rumos. "A emenda pode sair pior do que o soneto", diz o representante da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) no Fundo Verde Amarelo, Mário Bernardini. Para ele, o sistema de pool que o CGEE fazia para assessoria técnica dos fundos deveria ser mantido. "Sempre me coloquei contra a substituição do CGEE por secretarias dentro do ministério", afirma. "Não é que esteja defendendo o CGEE. Estou defendendo o funcionamento dos fundos", completa. Bernardini integra um grupo de trabalho que está analisando e propondo mudanças nos fundos setoriais (leia matéria nesta página). Na última reunião do grupo, quando seriam definidas as propostas, o empresário voltou a defender essa posição.

Na comunidade científica e acadêmica, que acompanha de perto as alterações em curso, há quem vá mais longe ao analisar as conseqüências das mudanças no CGEE. "Acho que os fundos setoriais correm o risco de serem usados politicamente, e isto seria extremamente prejudicial", afirma o físico Rogério César de Cerqueira Leite. Para ele, o ministro Roberto Amaral quer ter uma participação pessoal na distribuição dos recursos dos fundos setoriais. "Obviamente, a existência de uma organização como o CGEE, que baseia suas atividades em pareceres técnicos, limita um pouco o poder decisório do ministro", completa.

Já a presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Glaci Zancan, é mais cautelosa. "O CGEE deve ser um centro de estudos e nunca um executor de tarefas administrativas do governo", afirma. Para ela, o centro deveria estar diretamente subordinado ao Conselho de Ciência e Tecnologia. "O centro deveria ser um órgão de governo", diz. Segundo Glaci, porém, nem mesmo entre o conselho da SBPC há consenso a esse respeito. "Estas são opiniões pessoais", destaca.

Glaci acha que o assunto deveria ser melhor debatido com a comunidade científica e o próprio governo. "O governo que entrou é oposição ao que saiu. Eles podiam ter idéias teóricas sobre as coisas, mas agora terão de cair na real e ver como fazer as coisas", comenta. "O que não pode é tomar decisões precipitadas de cima para baixo", acrescenta. "Além disso, há o compromisso do presidente da República, de que discutiria com a sociedade", conclui.

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