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Patentes internacionais ‘exportam’ pesquisas com a grife da Unicamp

ÁLVARO KASSAB

O professor Marcelo Ganzarolli de Oliveira, coordenador das pesquisas: “Obtivemos resultados inéditos que nunca foram relatados” (Fotos: Antoninho Perri/Divulgação)Dois inventos desenvolvidos na Unicamp acabam de se transformar em patentes internacionais. Mais do que ganhar visibilidade no mercado externo, por meio de processo conduzido pela Agência de Inovação Inova Unicamp, as pesquisas abrem perspectivas inéditas no tratamento de várias doenças – da obesidade a linhagens diferentes de câncer.

É o caso, por exemplo, do invento de formulações farmacêuticas que contêm um princípio ativo que controla a esteatose hepática – e que poderá controlar, também, outras manifestações derivadas da síndrome metabólica, entre as quais, a obesidade.

As pesquisas, financiadas com recursos da Fapesp e do CNPq, são coordenadas pelo professor Marcelo Ganzarolli de Oliveira, do Instituto de Química da Unicamp (IQ), e pela professora Cláudia Pinto Marques Souza de Oliveira, médica do Departamento de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da USP. O docente da Unicamp, um especialista na síntese e caracterização das propriedades biológicas e biomédicas de moléculas doadoras de óxido nítrico, é um colecionador de patentes depositadas – 12 no total.

Fotos mostram cortes histológicos de tecido do fígado de ratos tratados com dieta gordurosa  e com dieta gordurosa Mas não é isso que o move. Ganzarolli implantou a linha de pesquisa no Instituto de Química em 1995, quando voltou da Inglaterra, onde foi fazer pós-doutorado. Nesses 12 anos, o docente e suas sucessivas equipes estiveram mais preocupados em desenvolver formulações que possam melhorar a qualidade de vida das pessoas, produzindo de compostos farmacêuticos a veículos que liberam essas substâncias.

Algumas dessas invenções devem chegar a curto e médio prazos às prateleiras dos hospitais, por meio de tecnologias licenciadas para a indústria farmacêutica e de produtos médicos. A aplicabilidade desses produtos oriundos do laboratório do IQ abrange um amplo espectro – do tratamento de problemas cardiovasculares e de lesões cutâneas, passando pelo desenvolvimento de bactericidas e microbicidas.

O fármaco; na imagem acima, as vesículas brancas são de gordura acumulada no fígado (exceto a maior, que é uma secção de corte de artéria); e a figura  mostra o resultado histológico de ratos tratados com a mesma dieta que receberam o princípio ativo oralmente: normalização depois do tratamento com o princípio ativo fica evidente em razão do desaparecimento das vesículas de gorduraA invenção que acaba de ter a patente depositada é emblemática nesse contexto. As investigações entraram agora na segunda etapa. Na primeira fase das pesquisas, destinada ao tratamento específico da esteatose hepática não-alcoólica, Ganzarolli e Cláudia Pinto Marques Souza de Oliveira testaram in vivo a formulação com sucesso em ratos e camundongos.

“Obtivemos resultados inéditos que nunca foram relatados na literatura. O princípio ativo demonstrou-se altamente eficaz no bloqueio e reversão da esteatose hepática não-alcoólica, doença que atinge cerca de 20% a 30% da população mundial e pode causar cirrose hepática e carcinoma hepatocelular [tumor de fígado]. Isso nos deixou muito entusiasmados, pois abre várias perspectivas para a sua aplicação em humanos”, relata o docente.

Segundo Cláudia, não existe um tratamento efetivo para o controle desta doença. A administração por via oral de antioxidantes clássicos, explica a pesquisadora da USP, não tem demonstrado efeitos terapêuticos significativos no tratamento de humanos. “Na maior parte dos casos, os efeitos benéficos são apenas discretos e não inibem a progressão da doença”. Ademais, informa a médica, outros tratamentos usados até o momento também não impedem a evolução da doença.

Os cientistas observaram que a droga desenvolvida no IQ, quando administrada em animais, não apenas previne o início da doença, como também a reverte depois de ela já ter se instalado. “Os médicos que trabalham diretamente com esteatose hepática, por exemplo, ficaram muito impressionados com os resultados”.

As investigações não só renderam teses e quatro artigos em publicações internacionais de alto impacto, como fizeram com que os pesquisadores acreditassem que o efeito terapêutico obtido poderia ser estendido a outras manifestações da síndrome metabólica.

As equipes constataram, prossegue Ganzarolli, que a formulação tinha um “potencial enorme” no que se refere ao tratamento da obesidade e de complicações a ela associadas. “Concluímos que, uma vez tratada a obesidade, sintomas dela decorrentes também poderiam ser atacados”.

O raciocínio do pesquisador obedece a uma lógica fundamentada em uma infinidade de testes, nos quais o princípio ativo foi caracterizado físico-quimicamente em relação à estrutura molecular, solubilidade, estabilidade e toxicidade em cultura de células.

Uma das conclusões dessas baterias de exames é irrefutável do ponto de vista científico: ficou demonstrado que os animais tratados nos casos de esteatose hepática, quando submetidos à formulação, apresentaram redução significativa de massa corpórea.

Segundo os pesquisadores, trata-se de uma evidência bastante forte de que o mesmo efeito poderia ser obtido em modelos de obesidade, inclusive com a redução de acúmulo de depósitos gordurosos, sobretudo no fígado. Os cientistas decidiram então fazer um pedido de adição da patente, estendendo-a para essas outras aplicações.

São elas que serão investigadas na segunda etapa da pesquisa, cujo início já foi deflagrado. O pedido de adição foi depositado no Exterior, juntamente com a patente anterior registrada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi).

A fase atual da pesquisa envolverá outros pesquisadores da Universidade, revela Ganzarolli, entre eles, o professor e médico Lício Velloso, da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (FCM). Velloso e Cláudia se incumbirão dos testes sobre obesidade, que serão conduzidas in vivo com modelos animais, na Faculdade de Medicina da USP e na FCM.

Cláudia e a equipe de pesquisadores da USP também prosseguirão nos estudos sobre a esteatose hepática, enquanto a parte de desenvolvimento e caracterização físico-química da formulação continuará a cargo do grupo de Ganzarolli. O pesquisador lembra que, para se transformar em medicamento, o composto precisa ser ainda submetido a uma bateria de testes, inclusive com humanos. Ademais, protocolos preconizados por agências de controle, entre as quais a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), precisam ser seguidos.

Compostos - Mas do que exatamente são formados esses compostos? Genericamente, ensina Ganzarolli, são moléculas que liberam uma outra, muito menor, que tem apenas dois átomos – um de nitrogênio e outro de oxigênio – que é chamada de óxido nítrico (NO). Cabe aos pesquisadores preparem a molécula mais complexa, que libera o NO.

O papel desempenhado pelo óxido nítrico, explica o cientista, é fundamental para o funcionamento do organismo humano. A importância do NO só foi descoberta no início da década de 80. Até então, observa Ganzarolli, não se imaginava que essa pequena molécula fosse produzida pelo corpo humano. E muito menos que ela pudesse ter ações celulares sinalizadoras tão importantes.

O óxido nítrico, exemplifica o docente, regula a pressão sanguínea, sendo produzido constantemente na parede das artérias e veias. Nessa função, a molécula controla o tônus muscular das artérias. “Se o nosso organismo parar durantes alguns instantes de produzir óxido nítrico, há uma constrição arterial que provoca um aumento da pressão. Pessoas que sofrem de hipertensão, em geral, têm uma deficiência na produção endógena de NO”.

O pesquisador chama a atenção para o fato de que, tão importante quanto o desenvolvimento dos compostos, é a forma como a sua liberação vai se dar. O docente e sua equipe, que atualmente conta com sete alunos, projetaram vários veículos de liberação, conhecidos como biomateriais, que podem ser usados na incorporação da droga para, na seqüência, liberá-la de forma controlada.

Essas formulações, resultantes do esforço de pesquisa empreendido pelo grupo, usam várias matrizes poliméricas que incorporam os compostos. Segundo o especialista, esses veículos são biocompatíveis e bioabsorvíveis, ou seja, não causam nenhum mal ao organismo.

Ganzzarolli explica que, como ocorre no caso da esteose hepática não-alcoólica, as moléculas desenvolvidas pelos cientistas do IQ são administradas exogenamente, repondo a carga de óxido nítrico que está em falta nos pacientes. Invariavelmente, explica, esse déficit na produção endógena está associado às doenças sobre as quais o grupo do Instituto vem se debruçando, em colaboração com a equipe da USP e de outros pesquisadores.

Com a reposição de NO, explica o cientista, é possível obter efeitos biológicos benéficos, desde que seja controlada a concentração da dose administrada. Esse é o propósito desses biomateriais, que produzem a liberação nas medidas desejadas de óxido nítrico. “Do contrário, os efeitos do princípio ativo podem ser nocivos”, observa o especialista, lembrando que, no caso do depósito internacional, foram patenteados, além do método de tratamento, as formulações, que são constituídas do medicamento e do respectivo veículo de aplicação.

O procedimento, explica o docente, é fundamental para uma ação mais eficaz do medicamento. No caso da última invenção, o princípio ativo pode ser administrado na forma de solução ou pode ser incorporado em formulações sólidas, entre as quais, comprimidos, cápsulas ou drágeas para ingestão oral.

Parceria – A expectativa dos pesquisadores é que empresas estejam dispostas a financiar parte da pesquisa, para que as investigações possam avançar, atingindo as fases de testes exigidas para que a invenção se torne de fato um produto. “Esperamos que a tecnologia seja em breve transferida para empresas interessadas”.

Na opinião de Ganzarolli, caso sejam concretizados, os convênios são interessantes para ambas as partes, uma vez que a empresa pode se beneficiar de toda a infra-estrutura e de todo conhecimento gerado na Universidade, enquanto a academia pode tirar lições da experiência da indústria.

“A indústria pode dar diretrizes mais específicas para a preparação da formulação, gerando mais rapidamente um produto comerciável. Ademais, o suporte financeiro é muito importante para a Universidade”, afirma Ganzarolli, cujo grupo de pesquisa já teve 11 patentes licenciadas para empresas.

O passo-a-passo do registro internacional

1. Depósito nacional
Ciro de La Cerda, analista de Propriedade Intelectual da Inova, considera o depósito nacional junto ao Inpi como o primeiro passo para o pedido do PCT. “As patentes depositadas no Brasil passam por uma análise para avaliar se o depósito internacional é viável e necessário”, explica.

2. Pedido do PCT
Depois do depósito nacional, o titular da patente tem um prazo de 12 meses para pedir o PCT. A documentação é enviada para o Inpi, que faz o pedido.

3. Análise de mercado
A partir do depósito do PCT, o titular tem 18 meses para avaliar quais países têm mercados interessantes para a exploração comercial da tecnologia. No caso da Unicamp, a Agência de Inovação também conta com este período para procurar possíveis parceiros para a transferência da tecnologia.

4. Definição
Decorridos os 18 meses, a patente pode ser depositada nos países escolhidos. Segundo Vera Crósta, esta fase geralmente depende de um parceiro, que assume os custos dos depósitos e define os mercados mais interessantes.

Fonte: Inova

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