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Secretário executivo do MCT revela que governo estuda aumento do valor
unitário das bolsas do CNPq e afirma que juros altos inviabilizam investimentos
em Ciência e Tecnologia

Lei de Inovação pode ser retirada de pauta

CLAYTON LEVY

Wanderley de Souza: “Vamos financiar De passagem por Campinas no último dia 17, quando acompanhou a visita do ministro Roberto Amaral ao Laboratório Nacional de Luz Sincrotron (LNLS), o novo secretário executivo do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), Wanderley de Souza, deixou pistas de que a política do atual governo para o setor será, no mínimo, muito distinta da adotada durante a era FHC. Ao mesmo tempo em que defende maior participação da iniciativa privada nos investimentos em C&T, Souza disse que a indústria brasileira não tem, por enquanto, condições de fazer inovação tecnológica em razão dos juros altos. A afirmação bate de frente com a política adotada pelo governo anterior que, entre outros mecanismos, criou os fundos setoriais justamente para atrair o setor empresarial aos projetos de pesquisa e inovação tecnológica. Em entrevista ao Jornal da Unicamp, Souza também diz que o atual governo pedirá para retirar do Congresso o texto que cria a Lei de Inovação. O projeto, de autoria do governo FHC, cria estímulos para o investimento em P&D e flexibiliza a mobilidade de pesquisadores que desejam atuar na iniciativa privada sem deixar a universidade. Souza alega que o texto recebeu críticas e precisa ser reescrito. "Se ficar como está, não passa". Ao comentar a queda nos investimentos do CNPq no Estado de São Paulo, o secretário culpou os próprios pesquisadores paulistas. "Os investimentos caíram porque faltou demanda". Em meio às declarações, Souza deu pelo menos uma boa notícia: o MCT estuda um aumento no valor unitário das bolsas concedidas pelo CNPq. Um grupo deverá se reunir em março para definir os números.

JU - O ministro Roberto Amaral falou em aumentar o valor unitário das bolsas concedidas pelo CNPq. Em que estágio estão estes estudos?

Souza - Criamos um grupo de trabalho que realizou estudos tanto para a questão do aumento do valor quanto para o aumento do número. O aumento do valor depende de uma ação mais coordenada com a Capes e com as fundações de amparo à pesquisa nos Estados. Porque na hora que aumentar o valor da bolsa do CNPq, tem de aumentar da Capes, Fapesp, Faperj etc. Essa parte ficou um pouco atrasada por conta destas articulações.

JU - Em quanto tempo o senhor acredita que o novo valor estará definido?

Souza - Nossa meta é que em março se reúnam MEC e MCT para verificar o índice e negociar a questão de orçamento.

JU - Houve nos últimos anos uma queda acentuada dos investimentos do CNPq no Estado de São Paulo. Como esse problema será tratado pelo MCT?

Souza - Isso é decorrente da queda nos investimentos como um todo. Só ficaram as bolsas. Como São Paulo detém o maior percentual das bolsas, qualquer diminuição que tenha no CNPq, São Paulo e Rio de Janeiro são os primeiros que sentem.

JU - Mas de 1995 a 2000 os investimentos caíram quase pela metade em São Paulo.

Souza - Mas aí deve ter sido por iniciativa do próprio Estado de São Paulo. O CNPq trabalha com pequenos editais. Como São Paulo tinha um bom atendimento na Fapesp, não precisava solicitar ao CNPq.

JU - O Senhor acha então que faltou demanda?

Souza - Faltou demanda de São Paulo com certeza. A Fapesp supriu isso.

JU - Mas no caso da Unicamp, por exemplo, a queda na concessão de bolsas pelo CNPq foi de 60%.

Souza - É preciso entender que a Capes teve uma política de abrir cursos de pós-graduação em vários lugares do País. E quando a Capes aprova um determinado curso, esse curso tem de dar um pacote de bolsas Capes e o CNPq, idem. Quando você concede bolsas para cursos novos sem ter havido aumento do número de bolsas, alguém tem de sair perdendo. Saem perdendo as pós-graduações tradicionais. Na realidade, para criar coisas novas é preciso ampliar o número. Não é tirando de quem tem.

JU - Levando em consideração que as universidades públicas de São Paulo abrigam um número muito grande de estudantes de outros Estados, o que as torna formadoras de mão-de-obra para todo o Brasil, os efeitos dessa redução não acabam afetando também o resto do País?

Souza - Temos que rever isso gradualmente. É impossível fazer qualquer redistribuição de bolsas com o número delas estacionado. Pelo contrário, tende a agravar a situação dos centros mais desenvolvidos. No momento em que você cria uma pós-graduação nova e tem de dar bolsas sem que o número total aumente, essas bolsas têm de sair de algum lugar. E saem dos centros mais desenvolvidos como São Paulo e Rio de Janeiro. A política que nós queremos implementar é de ampliar o número de bolsas e com isso fazer uma política de reforçar instituições matrizes, que formam pesquisadores, e permitir a nucleação de grupos novos.

JU - O novo governo fala em aumentar os investimentos do país em C&T de 1% para 2% do PIB até o final do mandato. O senhor espera que a iniciativa privada participe com quanto desse total?

Souza - Nós queremos que a iniciativa privada aumente o seu percentual. Queremos que os Estados também aumentem. O único Estado que tem cumprido a constituição é São Paulo, colocando o seu percentual na Fapesp. O Rio de Janeiro vem logo a seguir com altos e baixos. Nós vamos fazer uma política com os governadores e com alguns municípios para participar do esforço de financiar também ciência e tecnologia.

JU - O governo federal irá incentivar isso de alguma maneira?

Souza - Vai. Estamos conversando com os governadores. Tem fundação de amparo à pesquisa que já foi recriada, como no Maranhão por exemplo. É um trabalho de articulação que o ministério tem feito com os governadores.

JU - O governo federal pretende usar o seu poder de compra para incentivar o desenvolvimento em C&T?

Souza - Também, sobretudo em institutos de pesquisa. Instituições como o Instituto de Pesquisas Espaciais, por exemplo, devem privilegiar a indústria nacional.

JU - Há alguma área estratégica que deverá receber maior atenção do governo?

Souza - Ainda estamos definindo. Mas certamente áreas como nanotecnologia e biotecnologia são áreas já previamente definidas como estratégicas porque são estratégicas no mundo inteiro.

JU - Isso implica na criação de novos centros de pesquisa?

Souza - Não sei se na criação de algum centro ou no fortalecimento da rede existente. Temos de discutir isso. Há duas idéias correndo paralelamente. Uma, que defende uma rede nacional de nanotecnologia. E outra, que é a construção de um centro nacional. Eu particularmente privilegio as redes. Porque o centro significa investir em prédios novos e nesse momento acho mais interessante evitar dispêndios desse tipo. Já existem em nanotecnologia quatro ou cinco sub-redes que compõem uma rede maior. Temos recursos previstos para nanotecnologia em 2003, mas não tomamos ainda essa decisão.

JU - Quanto?

Souza - A princípio estão previstos R$ 6 milhões.

JU - Quanto foi investido no ano passado?

Souza - R$ 1,2 milhão.

JU - Haverá alguma ação específica para fomentar a inovação tecnológica?

Souza - Queremos estimular a questão das patentes. Vamos criar um mecanismo de financiar o registro de patentes. Esse é um problema que tem ocorrido porque as pessoas às vezes não têm recursos para fazer o registro. Estimular a pesquisa tecnológica, estimular a pós-graduação em centros tecnológicos. Isso não significa que os centros têm de ter pós-graduação, mas é preciso que eles tenham uma cota de bolsas para receber alunos de pós-graduação.

JU - O senhor não acha que também se deve incentivar a inovação na outra ponta, ou seja, na indústria?

Souza - A indústria brasileira, na prática, não tem condições de fazer isso. Ela paga um juro muito elevado hoje. Só quando a taxa de juros estiver muito baixa é que uma empresa terá motivação para captar recursos.

JU - Então, em sua opinião, a inovação dentro da indústria depende do comportamento da economia?

Souza - Depende do comportamento da economia, disponibilizar recursos a valores baixos. Mesmo com os juros da Finep, que são bem mais baixos que os do mercado, da ordem de 8%, todos os estudos feitos até agora apontam que as empresas não se sentem motivadas a tomar empréstimos.

JU - Em relação à Lei de Inovação, que está no Congresso desde o final do ano passado, o atual governo pretende rever o texto?

Souza - Nós vamos pedir a retirada da lei para discuti-la. Há críticas muito sérias por parte das universidades.

JU - Que aspectos da lei receberam críticas?

Souza - Critica-se, por exemplo, que a lei permite aos professores sair da universidade para constituir empresas sem que isso seja devidamente analisado pelos conselhos das universidades e sem que esteja implícita a reposição do professor. A idéia é que isso seja retirado para voltar depois de uma discussão mais ampla. Não podemos tocar para frente uma lei que encontra rejeição da universidade. Caso contrário, a lei não passa no Congresso.

JU - As propostas apresentadas pelo governo para reforma na previdência, que incluem a unificação do teto para o valor das aposentadorias, acabou gerando o medo de uma debandada nas universidades, já que muitos professores e pesquisadores em condições de se aposentar iriam preferir sair antes da aprovação da lei. O senhor compartilha dessa preocupação?

Souza - Como pesquisador acho que esse assunto precisa ser amplamente discutido. Precisamos mudar o sistema que está aí porque inviabiliza o País. Quanto a isso todos estão de acordo. Como mudar é uma questão de negociação. Nenhum projeto acabado do governo foi apresentado até agora. O que temos são só comentários nos jornais. É para isso que existem as negociações.

JU - Em sua opinião, qual seria a alternativa mais adequada?

Souza - Particularmente acho que não podemos perder essa enorme investimento que já foi feito na formação de pessoas, que estão numa faixa etária que já poderiam se aposentar. Seria um prejuízo tremendo para as universidades. Mas acho que isso é uma questão de conversar para chegar a uma solução intermediária.

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