Edição nº 539

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 24 de setembro de 2012 a 30 de setembro de 2012 – ANO 2012 – Nº 539

Sistema elimina fenol de esgoto

Tóxico e cancerígeno, poluente
ainda é lançado nos rios por muitas indústrias

 

A tecnóloga em saneamento Luciana Vechi de Carvalho desenvolveu um sistema para tratamento biológico de custo reduzido que permite eliminar em até 99,7% a concentração de fenol presente em águas de esgotos sanitários. O fenol é altamente tóxico ao meio ambiente e possui elevado potencial cancerígeno. O poluente está presente em efluentes lançados por muitas indústrias, sobretudo, das áreas de química, petroquímica e de destilarias de álcool.

Luciana de Carvalho concebeu o sistema para o seu mestrado defendido em agosto último junto à Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp. A pesquisa foi orientada pelo professor do Departamento de Saneamento e Meio Ambiente da FEC Edson Aparecido Abdul Nour no âmbito da linha de pesquisa “Sistemas combinados de tratamento de efluentes”. De acordo com o docente, o estudo simulou uma contaminação na rede municipal com 170 miligramas de fenol por litro (mg/l) de esgoto.

Edson Nour ainda explicou que o tratamento biológico fez uso de sistema combinado anaeróbio e aeróbio. Neste processo, microrganismos presentes em unidades de tratamento separadas e sequenciais degradam os materiais orgânicos, reduzindo a toxicidade do esgoto. Na unidade anaeróbia, ocorre a primeira biodegradação dos compostos orgânicos na ausência de oxigênio, enquanto na unidade aeróbica acontece a biodegradação complementar, utilizando o oxigênio dissolvido no meio líquido.

“A combinação destes dois tipos de processos tornou o sistema mais robusto e com um custo operacional menor do que os convencionais, que são somente aerados. Quanto maior a concentração do fenol na água, mais difícil será a sua remoção porque os sistemas de tratamento nem sempre são configurados para removê-lo. E não usamos nenhum reagente químico pra fazer isso. Foi somente atividade biológica”, confirma o docente.

Além disso, em todos os momentos, o sistema sempre foi eficiente a ponto de atender à legislação e de também se antecipar a ela, completa. “É que, recentemente, desde o ano passado, o Conama [Conselho Nacional de Meio Ambiente] passou a exigir testes com bioindicadores, ou seja, com organismos vivos que podem ou não sobreviver àquela situação. E o nosso sistema já previu isso”, revela Edson Nour.

Os testes com os organismos vivos, tecnicamente denominados de ecotoxicológicos ou bioensaios, envolveram, no sistema proposto, uma espécie de microcrustáceo (Daphnia similis), de mosquito (Chironomus xanthus) e de minhoca (Eisenia fetida). “Nós fizemos ensaios ecotoxicológicos com os três organismos, atendendo à resolução número 430 do Conama, instituída em 2011. E o resultado final, após ter colocado o fenol na dosagem de 170 mg/l de esgoto indicou que os três bioindicadores não foram afetados”, garante a pesquisadora Luciana de Carvalho.

A resolução referida pela tecnóloga estabelece que o efluente não deverá causar efeitos tóxicos aos organismos de pelo menos dois níveis tróficos diferentes. O nível trófico é a posição ocupada por um organismo na cadeia alimentar. “Dentro dos estudos que temos conduzido, buscamos três níveis tróficos importantes: o Chironomus é oriundo, normalmente, dos sedimentos dos rios. O lodo de um rio não poluído é bem cheio da fase larval deste organismo. Utilizando-o como bioindicador nós saberemos, por exemplo, o impacto da poluição no sedimento. Já com a minhoca saberemos, por sua vez, o efeito do fenol no solo. E com a Daphnia, a contaminação na água”, esclarece a cientista.

Os estudos foram conduzidos durante um ano e meio, desde a montagem do sistema até as últimas avaliações de toxicidade. Neste período houve o monitoramento de mais de 400 pontos de amostragem. “Além dos testes ecotoxicológicos, fizemos análises físicas e químicas durante os ensaios. Dividimos a pesquisa em três fases. A primeira foi de adaptação do sistema, preparando-o para receber a carga tóxica de fenol. Depois, nós adicionamos 50 miligramas de fenol por litro de esgoto e os resultados indicaram que o sistema poderia suportar mais carga tóxica porque ele conseguia remover 99,9% do ácido que era inserido no esgoto bruto. Foi quando chegamos a 170 mg/l e o excelente resultado de 99,7% de eliminação média”, mensura a tecnóloga, que é formada pela Faculdade de Tecnologia (FT) da Unicamp, com campus em Limeira.

Motivação

A poluição na Região Metropolitana de Campinas (RMC), principalmente entre as cidades de Paulínia e Sumaré, despertou o interesse inicial para a pesquisa, revelou Luciana de Carvalho. “Há nos efluentes desta região uma quantidade importante de fenol. E Sumaré, que capta a água do Rio Atibaia, sofre bastante com isso. E quanto maior a quantidade de fenol que é lançada nos rios, maior será a concentração acumulada nos sedimentos. Essa acumulação pode fazer com que o fenol seja transmitido na cadeia alimentar”, alerta.

Apesar da poluição em muitos rios da região, Edson Nour considera que as políticas públicas direcionadas à construção de redes para a coleta e o tratamento de esgoto vêm avançando no país, em especial na RMC. “Um bom indicador é a cidade de Campinas, que é o maior município desta região metropolitana. Há 10 anos Campinas não tratava 10% do esgoto coletado. E hoje a cidade já trata aproximadamente 85%. A Sanasa [Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento] tem um corpo técnico muito bom. Mas, por outro lado, estamos sempre correndo atrás do prejuízo, principalmente quanto à utilização de adequados indicadores de qualidade ambiental”, pondera.

Colaboração

A pesquisa obteve recursos parciais junto ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Houve a colaboração também das bolsistas de iniciação científica da FEC Lidiane Cristina Soares Ambrósio (bolsa SAE) e Dayane de Oliveira (CNPq); e o suporte de técnicos do Laboratório de Saneamento da Unidade.

 

Publicação

Dissertação: “Redução da concentração de fenol presente em águas residuais utilizando sistema anaeróbio/aeróbio; desempenho e toxidade residual”
Autora: Luciana Vechi de Carvalho
Orientador: Edson Aparecido Abdul Nour
Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)

Comentários

Comentário: 

Boa tarde.

Trabalho na ETE de uma industria automobilística, e estamos com muita dificuldade para eliminar o Fenol de nosso efluente industrial, fizemos diversos testes mas ainda não chegamos a um resultado satisfatório. Gostaria que se possível receber uma idéia para eu poder aplicar aqui na empresa, já que achei esse projeto muito interessante. muito obrigado