198 - ANO XVII - 11 a 17 de novembro de 2002
Jornais anteriores
Unicamp Hoje
PDF
Acrobat Reader
Unicamp
Assine o JU
11
Capa
Trabalho
Energia
Agrener 2002
Citros
Maionese
Painel da semana
Em dia
Chapter nos EUA
Prêmio
Graziano
Leôncio Martins
Resíduos
Oportunidades
Arsênio
Teses
Literatura
Unicamp na imprensa

Formação das Elites

Da educação à formação das elites

Livro investiga vinculações entre
processos de escolarização e o setor produtivo

ISABEL GARDENAL


No sentido horário, Hugo Burg, Suzy Sperber, Mário Medeiros, Diogo Avelino e Fernanda Félix: novos talentos em cena "Nossa preocupação não é ter a educação das elites como modelo. É saber como ela é utilizada para manter as posições de poder na sociedade e estudá-la para melhor observar as desigualdades sociais". Esta é, em suma, a conclusão a que a professora Ana Maria Fonseca de Almeida, da Faculdade de Educação da Unicamp, chegou ao organizar, com a professora Maria Alice Nogueira, da Universidade Federal de Minas Gerais, o livro A Escolarização das Elites: um Panorama Internacional da Pesquisa.

Segundo as autoras, os processos de formação das elites se dão em várias dimensões. "Durante a formação, a escola tem papel fundamental. Mas existe o trabalho propriamente familiar, que é da socialização, iniciado dentro de casa, através do contato com os mais velhos."

A experiência de países como o Brasil, França, Suíça, Rússia, Suécia, Estados Unidos e Inglaterra, reunidas no livro, permite criar uma situação de leitura em que as pessoas identificam as diferenças e as semelhanças educacionais, segundo a pesquisadora. "Já experiência brasileira, por exemplo, constitui o eixo condutor do trabalho, pois é raro encontrar pesquisa, ou mesmo tradução, que trate especificamente da formação das elites e, quando estes artigos existem, eles são tomados como guias de conduta. Nosso livro não deve ser lido como modelo de 'boa educação', mas como uma tentativa de examinar as formas desocialização e escolarização das diferentes frações das elites", adverte a professora.

Sistema único - Cada país "inventa" a sua tradição escolar de educação, embora dialogando com a tradição de outros, de acordo com Ana Maria. Cada um tem história e problemas específicos que as suas elites dirigentes procuram resolver. "O capitalismo é central nessa discussão" - afirma - "porque a escola tal como a conhecemos hoje, única e obrigatória, e aí não vale apenas para as elites, é fundamental para a entrada no mercado de trabalho. Mas, embora haja uma demanda do setor produtivo, não se pode dizer que a escola esteja subordinada a ele, como insistem alguns autores. Estudos empíricos mostram bem que a escola atual surgiu em alguns países antes mesmo de haver demanda do setor produtivo. E acontece ainda hoje: de a escola criar um diploma que ainda não tem lugar no mercado".

Quebra de poder - Ana Maria explica que existe uma proximidade entre o sistema de credenciais, o qual distribui diplomas - o sistema escolar - e o sistema produtivo. A proximidade é historicamente construída em grande medida por conta da revolução tecnológica, que passou a exigir uma especialização da mão-de-obra que as famílias se viam impossibilitadas de oferecerem sozinhas.

Os filhos são, então, conduzidos à escola para receber uma educação dada por especialistas certificados pelo Estado. É a quebra do poder familiar. "A escola ocupa um papel destacado porque produz não apenas uma competência técnica, mas simbólica. Neste ambiente, os jovens também formam um círculo de amizades que no futuro será uma rede de apoio. Envolve ainda o aprendizado de saberes, além dos escolares, sociais: como gerenciar um grupo de trabalho e liderá-lo", interpreta Ana Maria.

A família e a escola

A professora Ana Maria Fonseca de Almeida: experiência brasileira é o fio condutor do trabalhoO livro A Escolarização das Elites foi lançado no último dia 30, pela Editora Vozes. Ele agrega estudos recentes sobre os processos e modos de escolarização dos jovens pertencentes aos meios sociais mais favorecidos.

Na primeira parte são reunidos os trabalhos que discutem o elo entre as socializações familiares e os processos de escolarização. Na segunda parte, o livro esmiuça o funcionamento de instituições escolares reservadas aos grupos dominantes e os modos de escolarização oferecidos às crianças e jovens oriundos de famílias desses grupos.

O conteúdo mostra como são formados aqueles para quem estão reservadas as mais altas posições sociais. Ao mesmo tempo, detalha o funcionamento dos sistemas de ensino nas sociedades em questão, elucidando de forma mais explícita a maneira como são produzidos os critérios de excelência escolar utilizados para julgar os alunos.

Dos 12 artigos reunidos na obra, um aborda a escolarização em famílias de empresários, não necessariamente com muita escolarização e sim que se deram bem no setor produtivo, que têm grandes empresas em Minas Gerais.

Outra experiência, mostrada no artigo "Dinheiro no bolso, carrão e loja no shopping", escrito pelo professor Roberto Grün, apresenta as estratégias educacionais e de reprodução social em famílias de imigrantes armênios em São Paulo. Nele, a escola é vivida com muitas contradições, uma vez que o interesse dos pais é introduzir os filhos rapidamente nos negócios da família. A escola, de outra ponta, acaba desviando-os dessa trajetória. Relativizando a sua importância, os pais demonstram que, mesmo não querendo formar intelectuais, necessitam recorrer a ela porque, se os seus filhos não tiverem um diploma, eles não farão um bom casamento. "E isso acontece na maioria dos países. Virou marca de competência pessoal, esforço e seriedade", relata Ana Maria.