| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Enquete | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 207 - 24 a 30 de Março de 2003
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.. Previdência, mitos e fatos
.. Comentário
.. Falta mãe no país
.. Jurandir Pitsch
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.. Previdência, o que pensa o
 Congresso?
.. O Congresso e a reforma
.. Brant prega novas regras
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.. Teses da semana
.. Unicamp clona genes
.. Unicamp na Imprensa
.. O canto da baleia
 

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Deputado diz que servidor deve ser estimulado a permanecer no funcionalismo

Brant prega novas regras a partir de agora

CLAYTON LEVY



Ex-ministro da Previdência do governo FHC, o deputado federal Roberto Brant (PFL-MG) tem uma difícil missão pela frente. Escolhido para presidir a comissão parlamentar que irá analisar a proposta do governo Lula para reforma da Previdência, ele terá de conduzir uma discussão tão polêmica quanto complexa. Afinal, os pontos apresentados até agora, como aumento da idade mínima, taxação de inativos e tempo mínimo de permanência no serviço público mexem diretamente com as expectativas e direitos de milhões de brasileiros. Mais do que isso, a reforma pode definir o futuro da universidade brasileira, na medida em que professores e pesquisadores aguardam a definição das novas regras para decidir se permanecem na ativa ou optam por uma debandada geral. Em entrevista ao Jornal da Unicamp, Brant deu uma amostra de como o Congresso deverá tratar o tema.

JU - Nem mesmo no Supremo há consenso sobre o princípio do direito adquirido. O ministro Marco Aurélio Mello, por exemplo, entende que o direito à aposentadoria dos servidores públicos é adquirido desde o ingresso na carreira, enquanto o ministro Carlos Velloso defende a tese de que, antes do prazo corrido, existe apenas uma expectativa de direito. Qual tese deve prevalecer no Congresso?

Brant - Quem já se aposentou tem o direito totalmente constituído e não pode ter alteradas as condições desse direito. Então, todas as pessoas que já se aposentaram e aquelas que já adquiriram as condições para se aposentar mas não requereram a aposentadoria, serão regidas pela norma antiga. Quanto aos servidores hoje em atividade, mas que ainda não completaram o tempo, acho que o entendimento dominante é o do ministro Carlos Velloso. Na verdade, essas pessoas não completaram as condições para aposentar e evidentemente não se trata de direito adquirido. É minha opinião que, se houver novas regras, o ideal quanto aos servidores que estão na ativa seria que as novas regras devem prevalecer apenas a partir de agora. Acho que esses servidores deveriam ter direito a uma aposentadoria que seria calculada de uma maneira combinada. Ou seja, o tempo que eles trabalharam sob a égide das regras atuais daria lugar a um pedaço da aposentadoria. E o tempo restante seria regulado já com as novas normas. Acho que precisa de uma regra de transição estabelecendo isso.

JU - E quanto aos que já reúnem condições para a aposentadoria (tempo de serviço mais idade mínima), mas ainda não se aposentaram, o senhor acha que esses podem ficar tranqüilos?

Brant - Podem ficar tranqüilos. Isso é direito absolutamente adquirido e liquidado. Nenhuma lei poderia prevalecer contra esse direito. Nenhuma regra constitucional nova. Se por ventura alguém imaginasse fazer uma regra que violasse esse direito legítimo, seria derrubada nos tribunais. Pelo contrário, o desejo é estimular as pessoas para que, mesmo já tendo reunido as condições, estendam sua permanência no serviço público. Acho até que poderá ocorrer nessa reforma da Previdência alguma forma de estímulo para estas pessoas.

JU - O senhor poderia exemplificar?

Brant - Algum bônus, um adicional para quem continuar. Então, quando ele aposentasse com 70 anos, que é a idade limite para o serviço público, ele teria a aposentadoria normal mais um adicional.

JU - Só na Unicamp, há hoje cerca de 20% dos docentes que podem se aposentar de uma hora para outra pelas regras vigentes, se alguns pontos da reforma não ficarem esclarecidos desde já.

Brant - Seria um prejuízo brutal para as instituições de ensino se nós perdêssemos essa mão-de-obra, que é a mais valiosa para essas instituições. Acho até que deveria se cogitar de um fator previdenciário positivo. Da mesma forma que a pessoa que se aposenta muito cedo tem um desconto sobre o valor da aposentadoria, aquele que continuasse trabalhando após completar as condições para aposentadoria deveria receber um estímulo.

JU - O governo trabalha com a idéia de reduzir o valor do benefício e aumentar a idade da aposentadoria e o tempo de contribuição. Em sua opinião, essa proposta soará bem no Congresso?

Brant - Soa bem porque todos os países do mundo estão revendo suas idades mínimas. Isso porque as condições de saúde pública hoje estão permitindo uma longevidade muito maior. Quanto à questão de redução do benefício é difícil especular.

JU - Em sua opinião, o Congresso vai passar uma régua sobre a questão da idade mínima e fixá-la em 60 anos ou criará um sistema progressivo que leve em conta o tempo de contribuição de cada um?

Brant - Na emenda número vinte, que nós votamos no governo passado, estabelecemos uma regra de escalonamento. Conforme o tempo transcorrido, se a pessoa estivesse muito próxima da aposentadoria, não teria de atingir a nova idade mínima. Mas isso é uma questão que está em aberto.

JU - O governo quer aumentar de 10 para 20 anos o tempo de permanência mínima no serviço público e de 5 para 10 anos no cargo para que o servidor possa se aposentar com proventos integrais. Qual o grau de dificuldade de aprovação de uma emenda nesse sentido?

Brant - O governo do PT nesses primeiros meses tem uma força muito grande no Congresso porque, além de contar com a maioria, tem uma férrea disciplina partidária. Então eu diria que eles têm a maioria para aprovar essas regras.

JU - O senhor acha que o governo teria a maioria necessária para aprovar essa matéria sem dificuldades até o final do primeiro semestre, como deseja o presidente Lula?

Brant - Nós não temos ainda experiência de funcionamento de governos do PT no plano federal. Mas eles têm uma tradição de disciplina partidária muito grande. As pessoas debatem muito as questões, mas no final são obrigadas a votar de acordo com o fechamento de questão do partido.

JU - Mas e os três quintos necessários no Congresso?

Brant - Acho que hoje ele teria. Então resta a oposição, mas a oposição tem hoje só uns 100 ou 150 votos, que são do PFL e do PSDB. Se esses partidos fizerem oposição cerrada aí ficará mais difícil obter os 308 votos necessários. Nós não temos o compromisso irrestrito de aprovar qualquer coisa. De nossa parte haverá um debate mais democrático e mais independente.

JU - Diante da dificuldade jurídica de taxar inativos, o governo vem trabalhando com a idéia de calcular as aposentadorias a partir do vencimento líquido. Em sua opinião, o Congresso irá assimilar facilmente essa proposta?

Brant - Sempre houve algum problema para aprovar taxação dos inativos, embora essa proposta tenha passado uma vez, mas como as alíquotas eram altas demais foram anuladas pela justiça, com o argumento que elas tinham caráter confiscatório. No caso da contribuição pelo valor líquido você estaria atribuindo aos inativos a mesma contribuição que eles pagam quando em atividade, que é de 11%. Então aí já não tem o caráter confiscatório.

JU - O governo também cogita de reduzir o valor das pensões para 70% do valor da aposentadoria. Em sua opinião, como o Congresso reagiria a essa proposta?

Brant - Esse é o padrão mundial. Inclusive no Brasil era de 50%. A Constituição de 88 é que elevou para 100%. O tamanho da família diminuiu porque uma das pessoas saiu. Então a idéia dos 70% é uma idéia justa.

JU - E quanto à proposta de se criar um teto unificado para a aposentadoria?

Brant - Acho bom porque há salários que são exagerados. Certamente estes salários não estão na Unicamp, mas há exageros, principalmente no Poder Judiciário e no Poder Legislativo.

JU - Se a reforma for aprovada nos termos em que o governo quer, não haverá um sucateamento das universidades públicas e dos institutos de pesquisa com a queda da atratividade das funções públicas que ali são exercidas?

Brant - Não, necessariamente. Há muitos anos o salário do servidor público na ativa vem sendo reajustado muito abaixo da inflação. Uma das razões para isso é o constrangimento fiscal extremo a que estão submetidos União, Estados e os grandes municípios. E isso exatamente em razão do peso da folha dos inativos. Então, hoje, as pessoas alegam, certamente com razão, que optam pela carreira pública porque os salários são mais baixos mas as condições de aposentadoria são melhores. Acho que nós poderíamos inverter. Se você tirar o peso excessivo dos inativos da folha abre-se espaço para o reajuste do salário dos ativos.

JU - O governo pretende consolidar o seu projeto até maio e aprová-lo no Congresso ainda no primeiro semestre de 2003. Em sua opinião isso é possível?

Brant - Depende de quando o governo mandar a proposta. Nossa experiência no governo anterior com propostas para a previdência foi muito diferente. Nós ficamos um ano discutindo. Naquela época, os partidos que hoje estão no poder estavam totalmente contra a reforma. Agora a situação é diferente, porque eles todos agora são a favor da reforma e quem vai propor mudanças somos nós da oposição.

JU - Mas a partir do momento em que o governo enviar a proposta quanto tempo o senhor acha necessário para isso tramitar no Congresso?

Brant - Os tempos políticos não são tão automáticos assim. Do ponto de vista teórico, se o governo entregar no dia 30 de abril, teremos maio e junho, o que não é suficiente.

JU - Se essa matéria não for votada em 2003, qual o grau de dificuldade de aprová-la em 2004, que é um ano eleitoral?

Brant - O tempo político para o governo Lula fazer uma reforma dessa natureza seria realmente 2003. Em 2004 o próprio governo já terá perdido muito capital político, certamente haverá mais dissensões na sua base de apoio, a própria disposição da oposição estará mais forte.

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