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Os impactos do Splash
Pesquisadores do IQ estudam redução de atrito hidrodinâmico a partir do contato entre uma gota e superfície líquida

MANUEL ALVES FILHO

O professor Edvaldo Sabadini e as pesquisadoras Melissa Inger Alkschbirs e Vanessa Bizotto: economia de energia

Um fenômeno corriqueiro, produzido pelo choque de uma gota contra uma superfície líquida, está sendo objeto de intensas investigações por parte de pesquisadores do Instituto de Química (IQ) da Unicamp. O splash, como é conhecido, tem despertado cada vez mais interesse dos cientistas, que o utilizam em estudos que envolvem desde o impacto de meteoros até a dispersão de produtos agrícolas na superfície de folhas. A abordagem das pesquisas conduzidas pela equipe do IQ destaca-se pela originalidade. Ao reproduzirem o fenômeno de forma controlada em laboratório, os especialistas conseguiram demonstrar, pela primeira vez, que o conjunto de ocorrências do splash também pode ser aplicado ao estudo de redução de atrito hidrodinâmico.

Na Unicamp, as pesquisas em torno do splash tiveram início há cerca de seis anos, por meio do professor Edvaldo Sabadini, do Departamento de Físico-Química do IQ. Ele e sua equipe imaginavam, desde o início, que o fenômeno poderia conter os “ingredientes” necessários para o estudo de redução de atrito hidrodinâmico. Este último, informa o docente, foi descoberto na década de 40, e ocorre quando polímeros de elevada massa molecular são dissolvidos, em baixíssimas concentrações, em um líquido - menos de um grama de polímero para 10 mil gramas de solvente. Em certas condições experimentais, explica Sabadini, o índice de redução de atrito pode alcançar 80%.

O resultado prático dessa técnica é a economia da energia empregada em processos de bombeamento de líquidos a longas distâncias, uma vez que o fluxo é facilitado pela presença do polímero. “Um dos exemplos mais conhecidos desta aplicação envolve o bombeamento de petróleo por aproximadamente 1.300 km, entre as baías de Prudhoe e Valdez, no Alasca”, afirma Sabadini. A natureza, conforme o professor do IQ, também oferece exemplo de redução de atrito. Os golfinhos secretam sobre a pele um polímero natural que reduz a fricção de seus corpos contra a água. Valendo-se desse conhecimento, o homem usou o mesmo princípio para finalidades pouco nobres, como lançar mão de polímeros para recobrir cascos de torpedos.
Sabadini afirma que, embora existam muitos estudos acerca da redução de atrito hidrodinâmico, os modelos que o explicam ainda são bastante primitivos. Os melhores ensaios prevêem que as cadeias de polímeros sofrem um processo de estiramento e contração quando submetidas a um fluxo turbulento, funcionando como molas. Essa oscilação é que previne a formação de micro-vórtices que dissipam a energia do líquido durante o escoamento. A partir desses dados é que a equipe do IQ passou a investigar o splash, com o objetivo de oferecer uma nova contribuição aos estudos de redução de atrito.

O splash, conforme Sabadini, pode ser dividido em quatro etapas. A primeira corresponde ao instante em que a gota se choca contra a superfície líquida. Em seguida, ocorre a formação de uma estrutura que se assemelha a uma coroa e de uma cavidade no líquido que recebeu o impacto. Depois, forma-se um jato (conhecido como Jato Rayleigh), impulsionado pelo colapso da coroa e pelo fechamento da cavidade. Por último, acontece o desabamento do jato. Todo o processo não leva mais do que alguns décimos de segundos. Já a oscilação das cadeias poliméricas citada anteriormente está numa escala temporal dez vezes mais rápida que a do splash.

A partir desses dados, os especialistas do IQ presumiram que, no caso do splash desenvolvido em soluções poliméricas, a deformação ocorreria em um regime menos turbulento, podendo alterar a morfologia das estruturas de impacto em relação à do líquido puro. A idéia pioneira, de acordo com o professor Sabadini, ficou a cargo da então aluna de mestrado Melissa Inger Alkschbirs, para ser desenvolvida. O trabalho contou com o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PADCT), do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

Os recursos proporcionaram a compra de todo o equipamento necessário ao estudo, como uma câmera para captar imagens rápidas e um aparato capaz de gerar estruturas de impacto controladas. Inicialmente, Sabadini e Melissa trabalharam com o polímero poli (óxido de etileno), que é conhecido por ser o mais eficiente agente redutor de atrito hidrodinâmico em água. Os resultados, segundo eles, foram bastante promissores. “As ‘coroas líquidas’ produzidas quase que imediatamente após o impacto da gota mostraram-se muito mais estruturadas para as soluções contendo o polímero”, afirma o docente do IQ.


Os especialistas observaram também que o Jato Rayleigh, que começa a ser impelido cerca de 0,02 segundo após o impacto inicial da gota, torna-se muito mais alongado, atingindo alturas três vezes maiores que a do jato de água pura. “Nós descobrimos que a altura atingida pelo jato se relaciona com a porcentagem de redução do atrito hidrodinâmico”, esclarece Sabadini. Ele ensina que a energia responsável pela formação do splash vem da energia potencial da gota, que pode ser determinada com precisão. Ao medir quanto dessa energia se conservava, os especialistas puderam estimar o percentual de redução de atrito na solução do polímero em relação ao solvente.

Os resultados do trabalho foram publicados na revista Experiments in Fluids, que registrou, pela primeira vez, o potencial da técnica para estudos sobre a redução de atrito hidrodinâmico. A própria Melissa aprofundou ainda mais as investigações em torno do splash, demonstrando sistematicamente que o fenômeno é sensível a efeitos moleculares, como concentração, massa molecular e rigidez da cadeia polimérica. Esses resultados, adianta Sabadini, serão publicados brevemente no The Journal of Physical Chemistry, uma das mais conceituadas revistas da área.

Ainda conforme o professor do IQ, novos estudos estão em andamento. A mestranda Vanessa Bizotto, por exemplo, tem analisado as propriedades de alguns polímeros naturais. Eles são interessantes do ponto de vista científico porque, além de serem facilmente encontrados na natureza, quase não se degradam quando submetidos ao fluxo turbulento, ao contrário dos materiais sintéticos. Para Sabadini, as pesquisas conduzidas pela equipe do IQ sobre a redução de atrito hidrodinâmico usando as estruturas do splash lançam uma nova luz sobre o velho fenômeno, que continua desafiando os cientistas a explicá-lo melhor.

 

Projeto:
“Estudo sobre redução de atrito hidrodinâmico usando
imagens digitalizadas”
Fontes de financiamento:
Fapesp e MCT
Investimento: US$ 10.232,00

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