Edição nº 584

Nesta Edição

1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12

Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 25 de novembro de 2013 a 01 de dezembro de 2013 – ANO 2013 – Nº 584

Química desenvolve técnica que desvenda sexo de aves

Método tem baixo custo, não gera estresse e pode ser considerado ‘verde’

A pesquisadora Juliana Terra, do Instituto de Química (IQ) da Unicamp, desenvolveu uma técnica capaz de identificar, em poucos minutos, o sexo de aves com características físicas insuficientes para evidenciar se são fêmeas ou machos. O método, inédito, utiliza sinais de raios X da pelugem dos animais para diferenciar os sexos. Ao contrário dos procedimentos tradicionais, a técnica não gera estresse ao animal, pode ser considerada “verde” e de baixo custo.

A identificação proposta pela estudiosa da Unicamp foi realizada em pintinhos recém-nascidos. A diferenciação preliminar do sexo na atividade avicultora é fundamental para a criação e comercialização destes animais. Em aves silvestres, a sexagem, como é chamada esta distinção, é importante para o sucesso reprodutivo de espécies em extinção. Resultados mostraram 100% de acerto na classificação, que pode ser obtida em 5 minutos. Os estudos devem se estender, no futuro, para os testes na pelugem de aves silvestres.

“Mais de 50% das aves apresentam esta dificuldade de identificação dos sexos. Elas são desprovidas de dimorfismo sexual. Apresentam esta característica araras, papagaios e tucanos, animais que correm o risco de extinção. No caso dos pintinhos, dependendo da raça da galinha, com quatro semanas é possível fazer esta distinção visual entre machos e fêmeas”, situa a estudiosa da Unicamp. 

Ela concluiu recentemente pós-doutorado sobre o tema. O estudo obteve financiamento da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e foi supervisionado pela docente do IQ Maria Izabel Maretti Silveira Bueno, que atua no Departamento de Química Analítica da Unidade. O trabalho contou ainda com a colaboração de Alexandre Martinez Antunes, também pós-doutor pelo IQ. Maria Izabel Maretti coordena Grupo de Pesquisa em Espectroscopia de Raios X (GERX) na Unicamp.

“Trata-se de mais um método analítico desenvolvido por nós no campo de estudo da espectroscopia de fluorescência de raios X. A técnica proposta pela Juliana é de fácil execução e muito rápida. Além disso, não causa prejuízo ao animal, sendo totalmente ‘verde’, ou seja, não utiliza reagentes e nem gera resíduos”, salienta a professora do IQ.

Juliana Terra esclarece que na atividade avicultora a sexagem é imprescindível para a competitividade do setor. “Quanto mais cedo o produtor descobre o sexo de pintinhos, melhor o manejo. O criador pode, por exemplo, acompanhar o crescimento da ave, fornecer a alimentação correta para cada tipo de sexo e até mesmo determinar o espaço físico adequado. Além disso, cada sexo tem sua própria importância na indústria avicultora. Tudo isso faz com que o desenvolvimento das aves seja otimizado, reduzindo o custo da produção”, ilustra.

A identificação proposta no estudo obteve 100% de acerto já no oitavo dia de nascimento dos pintinhos. Conforme revelou Juliana Terra, os resultados promissores da pesquisa podem permitir futuramente a possibilidade de se agrupar os sexos de pintinhos já a partir do primeiro dia de nascimento.

A pesquisadora sinaliza que os estudos podem ser estendidos para espécies silvestres que também são desprovidas de dimorfismo sexual. Entre elas estão o papagaio-verdadeiro (amazona aestiva); o periquito (aratinga sp.); a arara (ara sp.); o tucano (ramphastos toc) e o fura-barreira (hylocryptus rectirostris).

 

Procedimentos convencionais 

A química da Unicamp explica que o procedimento mais usado atualmente em pintinhos, apesar de eficiente, é trabalhoso e estressante ao animal. Trata-se de uma técnica japonesa manual, em que o profissional aperta a cloaca do animal, conseguindo, por sensibilidade ao toque, identificar o sexo.

“É um procedimento muito sensível e específico. O custo é alto porque são pouquíssimas pessoas que têm essa habilidade. A técnica, em geral, é passada de geração em geração. Ela é rápida, tem uma porcentagem de acerto alta, só que requer um especialista, além de causar estresse ao animal. Características secundárias dos sexos, incluindo cor, tamanho e arranjo de penas, só se tornam visíveis na quarta semana”, observa.

A diferenciação proposta por Juliana Terra consiste na análise da penugem do bicho. “Cortamos a penugem com uma tesoura esterilizada. Elas são facilmente coletadas, armazenadas e transportadas. Isso ajuda a reduzir o estresse da movimentação, elimina sangramento desnecessário e minimiza a chance de infecção, sem comprometer a precisão e confiabilidade dos resultados”, compara.

Além disso, a proposta é utilizar equipamentos portáteis de raios X, evitando o corte da penugem do animal. Neste caso, a penugem seria levantada, possibilitando que os feixes de raios X não atinjam o corpo das aves. Tal proposta deverá ser submetida ao Comitê de Ética em Pesquisa em Animais.

“Para as espécies silvestres existe uma técnica de DNA [deoxyribonucleic acid] que é empregada para definir o sexo, principalmente em aves de grande porte. É um procedimento confiável, não invasivo, mas os ensaios são sensíveis e, uma vez iniciados, precisam ser concluídos em até 24 horas para não afetar a confiabilidade do resultado. Além disso, é um processo que envolve um custo maior”, acrescenta.

“A nossa proposta possui valor reduzido, uma vez que já temos elaborado um modelo, além da questão operacional. É necessário somente um equipamento de fluorescência de raios X para fazer a análise. Trata-se de um equipamento muito versátil, que pode fazer desde análises do teor de nutrientes em alimentos até a verificação de possíveis metais tóxicos em cosméticos. A fluorescência de raios X não promove a destruição das amostras. Estas vantagens fazem com que esta técnica tenha aplicação em várias áreas”, complementa.

 

Quimiometria

No trabalho, espectros de fluorescência de raios X da pelugem de pintinhos de oito dias, sem qualquer pré-tratamento das amostras, foram usados para a sexagem dos animais. A identificação envolveu também técnicas de quimiometria, área que trata da aplicação de métodos estatísticos e matemáticos em dados de origem química.

“A quimiometria emprega métodos matemáticos e estatísticos para planejar ou selecionar experimentos de forma otimizada, fornecendo o máximo de informações químicas com a análise dos dados. O seu uso objetiva avaliar dados de caráter multivariado retirando o máximo de informações presentes em suas matrizes complexas, facilitando assim a interpretação dos mesmos”, define Juliana Terra.

O experimento utilizou 25 pintinhos da espécie Gallus gallus domesticus da linha rubro negra. Os animais foram adquiridos em um criadouro legalizado na região de Campinas sem conhecimento prévio do sexo. Eles foram mantidos em pinteiros com características ergonômicas adequadas ao bem-estar animal. As aves foram alimentadas exclusivamente com vegetais e legumes cultivados para este fim, além de ração orgânica.

“O tempo reduzido de análise, a não necessidade de pessoas altamente especializadas e o não uso de solventes tornam o método proposto uma alternativa a ser considerada em substituição aos métodos convencionais empregados atualmente na realização da sexagem de aves. Com o uso de modelos inicialmente construídos é possível aperfeiçoá-los continuamente com a introdução de novos dados, fazendo com que os novos modelos sejam cada vez mais robustos e apresentem índices de acerto crescentes”, prevê a pesquisadora.

 

Publicação

Pós-doutorado: “Fast, low cost and non invasive gender determination of birds by means of x-ray fluorescence allied to chemometrics”
Autora: Juliana Terra
Supervisora: Maria Izabel Maretti Silveira Bueno
Unidade: Instituto de Química (IQ)
Financiamento: Capes