| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 336 - 11 a 17 de setembro de 2006
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Unicamp Aberta
 

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Euclides Marques, formado em Música Popular na Unicamp,
fala do sucesso do duo com Luizinho 7 Cordas

Os herdeiros da genuína
escola brasileira do violão

Euclides Marques e Luizinho 7 Cordas em foto para o disco "Remexendo": originalidade nos arranjos, alta qualidade técnica e de som, e um repertório nunca tocado na formação de duo. (Foto: Divulgação)Antes mesmo de apresentar “Remexendo”, CD lançado recentemente pela Kuarup Discos, o músico formado pela Unicamp Euclides Marques e Luizinho 7 Cordas já faziam a cabeça do público brasileiro, tocando havia 4 anos ao lado de nomes como Beth Carvalho e Martinho da Vila. A obra consagra o talento dos artistas. “Há muito tempo eu não me emociono tanto quanto ao ouvir este CD, um presente para o povo brasileiro e que já nasce imortal”, avaliza a cantora Beth Carvalho.

Crítica vê continuidade
do trabalho de Dino 7 Cordas e Raphael Rabelo

Mesmo com uma formação que já consagrou grandes nomes da música instrumental brasileira – violões de seis e sete cordas –, os instrumentistas imprimem um padrão de qualidade técnica e de som superior ao que já foi realizado, e para um repertório que ainda não havia sido tocado em duo. Eles reinventam clássicos compostos por Radamés Gnatalli (autor da música que dá nome ao disco), Baden Powell, Garoto, Tom Jobim, Ernesto Nazareth e Pixinguinha. O diferencial é a valorização melódica dos temas brasileiros e a riqueza rítmica característica deles.

Com este primeiro trabalho, já são considerados “herdeiros” de uma tradição que é a maneira genuinamente brasileira de se tocar violão em duo, como na época de Canhoto e Paraguassu, Aymoré e Garoto, Meira e Dilermando Reis e, mais recentemente, Dino 7 Cordas e Raphael Rabello. “Euclides e Luizinho são sucessores de duplas inesquecíveis da história da música instrumental brasileira”, diz o crítico Sérgio Cabral. “Perfeito, execução impecável, arranjos elaborados e sensibilidade presente em todos os momentos”, endossa o instrumentista Altamiro Carrilho.

Na entrevista que segue, Euclides mostra a estrada percorrida até aqui, diz porque Luizinho 7 Cordas é seu mestre e relembra os tempos de Unicamp.

Jornal da Unicamp – Além da sonoridade e da interpretação, o novo álbum tem como cartão de visita o depoimento de personalidades importantes da música brasileira. Qual o relacionamento de vocês com esses artistas?

Euclides Marques – Conheci o Sérgio Cabral ainda em Campinas, quando ele lançou um de seus livros (creio que a biografia de Ary Barroso) e eu toquei na ocasião com um grupo de choro. O Luizinho já o conhece há muito mais tempo, de vários discos, shows e projetos, como o recente “Boteco do Cabral”, com grandes nomes do samba. Não conhecia o Altamiro Carrilho pessoalmente, mas é amigo de longa data do Luizinho, que o acompanha sempre. Quanto a Beth Carvalho, a “Madrinha do Samba”, somos seus afilhados também. Ela foi uma das primeiras a nos ouvir em um bar de São Paulo. Ficou encantada com o duo e nos chamou pra uma participação especial num grande show na noite seguinte, no Via Funchal, com ela e Martinho da Vila. Com direito a solo, fomos chamados para “representar a música que se faz hoje em São Paulo”.

JU – “Remexendo” é o primeiro CD do duo, mas vocês têm trabalhos individuais ou em parceria com outros músicos, não é?

Marques – Eu já toquei e fiz arranjos em discos de artistas como Álvaro Faleiros, André Juarez, Zé Modesto, Chico Saraiva, Grupo Dose Certa e outros, mas este é o primeiro trabalho meu. O Luizinho é considerado, já há algum tempo, um dos maiores violonistas de 7 cordas do país. Tem centenas de gravações e shows com os maiores nomes da música brasileira como Orlando Silva, Elizeth Cardoso, Cartola, Nelson Cavaquinho, Waldir Azevedo, Artur Moreira Lima, Luiz Gonzaga, Vinicius de Moraes, etc. No entanto, “Remexendo” é o primeiro disco, em centenas, que tira o nome dele da ficha técnica e o coloca na capa. Eu costumo dizer que é um legado do violão 7 cordas para a posteridade, um verdadeiro tratado sobre este instrumento do qual Luizinho é um mestre maior.

JU – Essa formação de 6 e 7 cordas é responsável pelo sucesso de grandes obras. O que é especial em “Remexendo”?

Marques – Hoje, com o nosso duo, estamos sendo considerados por muita gente – e autoridades no assunto –, os herdeiros de uma tradição maravilhosa que é a maneira genuinamente brasileira de se tocar violão em duo, o que nos remete a épocas de Canhoto e Paraguassu, Aymoré e Garoto, Meira e Dilermando Reis e, mais recentemente, Dino 7 Cordas e Raphael Rabello. Nosso trabalho é o afluente mais novo desse caudaloso e exuberante rio do violão brasileiro. Bebendo dessa fonte, sentados nos ombros daqueles gigantes, podemos enxergar mais longe, dar continuidade e desenvolver essa arte que é tão nossa. O que há de especial é a originalidade dos arranjos, o padrão de qualidade técnica e de som superior ao que havia antes, e o repertório que ainda não havia sido tocado nessa formação de duo.

JU – O repertório reúne o fino da música brasileira. Como se deu a seleção das peças?

Marques – Nosso trabalho é de recriação desse vasto, precioso e em boa parte desconhecido repertório da música brasileira. Nesse sentido, a faixa-título é bem sugestiva, pois “remexemos”, reinventamos alguns clássicos de nossa música e outras pérolas quase inéditas de autores como Radamés Gnattali, Patápio Silva, Garoto, Dilermando Reis, Tom Jobim, Canhoto, Ernesto Nazareth, Pixinguinha, Baden Powell e Vinicius de Moraes. Também em obras-primas de dois mestres latino-americanos, Antonio Lauro e Agustín Barrios, são reveladas brasilidades musicais surpreendentes. Então, o critério de seleção foi esse: metade de obras bem conhecidas e outra metade, também obras-primas, praticamente desconhecidas. Mas tocadas de uma maneira diferente do que tem sido feito.

JU – São músicas executadas por vocês desde o início da carreira?

Marques – A maioria sim. Acredito que para se conseguir um nível de arranjo, de execução e de interpretação realmente bom é necessário certo “convívio” com as músicas. É uma questão de amadurecimento do repertório. Algumas como “Tempo de Criança” (Dilermando Reis), que a Luciana Rabello (irmã do Raphael) disse que foi a melhor versão que ela já ouviu, “Samba do Avião” (Tom Jobim), com a participação do Quinteto em Branco e Preto, “Berimbau” (Baden e Vinicius) ou “Jorge do Fusa” (Garoto), que o maestro Laércio de Freitas adorou colocar seu luxuoso piano, são coisas que eu toco há anos. A única que entrou no repertório de última hora foi “Desprezado”, pois precisávamos de uma música para o Paulo Moura, que já estava animado para gravar, e não havia nenhuma com a cara dele. Então o Luizinho lembrou desse tema antigo e que ele adorava, do Pixinguinha. Fiz o arranjo, chamamos o Paulo e, de tão desconhecida que era, ele me pediu pra ficar com a partitura, pois não sabia tocar de cor o choro (logo ele, um dos maiores chorões brasileiros). Mesmo assim, foi um dos momentos mais especiais do disco. Ficou linda.

JU – Vocês estão há quanto tempo na estrada? E juntos, há quanto tempo?

Marques – Toco profissionalmente desde quando estava na Unicamp, há quase dez anos. Já o Luizinho conta décadas de notoriedade. Por isso, “Remexendo” é também um disco comemorativo dos seus 60 anos de idade e 40 de carreira, com várias turnês internacionais. Começamos a tocar juntos há uns cinco anos, quando fui até sua casa a fim de ter aulas de violão de 7 cordas, pois também toco esse instrumento. Encontrei um violão velhinho encostado num canto e fiquei tocando, enquanto esperava o mestre. Quando ele chegou na sala começou a me acompanhar e, depois de passado em muito a hora da aula marcada (que acabou não acontecendo nunca), ele me chamou para dividir um show que faria na semana seguinte. Mas cada show que fazemos não deixa de ser uma aula pra mim.

JU – Sérgio Cabral inspira-se na interpretação de vocês para dizer que os brasileiros vivem no primeiro mundo em matéria de instrumentistas e de qualidade musical. O que representa esse depoimento na carreira de vocês? A música brasileira de qualidade está sendo bem divulgada?

Marques – O Sérgio Cabral é um dos maiores conhecedores da MPB. É o grande biógrafo de nomes como Tom Jobim, Ary Barroso, Elizeth Cardoso, Nara Leão e Pixinguinha. E uma aprovação dessas, de quem sabe tudo, é uma alegria e um estímulo muito grandes e, ao mesmo tempo, uma baita responsabilidade. Como ele disse, vivemos seguramente no primeiro mundo quanto à nossa música, na condição de potência musical, mas ainda estamos longe disso quando se trata da divulgação desta nossa música. Entretanto, sou bastante otimista, pois as coisas estavam bem piores há um tempo atrás. Acredito que o nosso povo, sendo bastante inteligente, tem aprendido rápido a discernir melhor o que é bom do que é ruim, em todas as áreas (inclusive na política). E vai obrigar o mercado, às pessoas que têm poder de decisão na indústria cultural, a abrir cada vez mais canais de divulgação pra esse tipo de música que fazemos.

JU – Acreditam que vocês promovem a continuidade do trabalho de Raphael Rabello e Dino 7 Cordas?

Marques – Dino 7 Cordas, o “pai” desse instrumento, era muito amigo do Luizinho e chegou a considerá-lo, para irritação dos cariocas, seu sucessor. O Raphael também tinha uma ligação muito próxima com o Luizinho, sempre tocavam juntos, admiravam-se mutuamente. Até tiveram um projeto de gravar um disco em duo, mas a brevidade da vida de Raphael não permitiu. Para mim, esses dois grandes gênios do violão, foram, ao lado de Baden Powell, minhas maiores influências. Então acho que é natural o nosso trabalho se inspirar neste memorável duo e levar adiante essa escola do violão brasileiro, cujo valor e importância só têm comparação mundial com a espanhola, o berço do instrumento.

JU – Quando você estudou na Unicamp já havia o curso de Música Popular ou teve formação erudita?

Marques – Sim, eu me formei no curso de Música Popular, mas nem por isso deixei de continuar estudando o repertório clássico, como já vinha fazendo antes. Ao contrário, foi na Unicamp que pude interagir com os outros departamentos (Composição e Regência) e disciplinas relacionadas à música, como prática de estúdio, “música industrializada”, trilhas sonoras, etc, fazendo jus ao verdadeiro conceito de “universidade” que pude então desfrutar. Foi uma etapa muito boa e única em minha formação, de poder experimentar, errar à vontade sem o compromisso profissional/comercial, de conviver com professores super-respeitados no meio artístico. Hoje, quando encontro algum colega de curso, vem a saudade de poder tocar horas nos corredores, sem compromisso com o resultado do som, ouvir músicas maravilhosas na banquinha do Naná (onde aprendíamos tanto quanto nas salas de aula). Agora é uma correria só, ensaios, aulas, gravações, shows e tudo com hora marcada. A gente só tem idéia do quanto é legal essa época de aprendizado na Unicamp depois que sai dela.

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