Além do trivial simples
MARIA ALICE DA CRUZ
A aluna de doutorado da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp (FEA) Kesia Diego Quintaes foi a primeira pesquisadora brasileira a comprovar cientificamente a migração do ferro contido na esteatito, rocha da qual se produzem as panelas de pedra-sabão, para o alimento. A análise química foi realizada no Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital) para apresentação de dissertação de mestrado na FEA. Hoje, depois da comprovação, ela desenvolve projeto de doutorado para saber que implicações nutricionais podem ter as panelas de ferro, inox e pedra-sabão. "O caminho é investigar a migração desses elementos. Se há liberação para o alimento e se há utilização pelo organismo."
Os elementos liberados pelos utensílios podem ser tanto benéficos quanto prejudiciais à saúde. "A panela não-curada pode liberar níquel em quantidade tóxica à saúde humana", adverte. A constatação foi feita depois de realizar a cura de seis das 12 panelas novas utilizadas na pesquisa. As outras seis, usadas in natura, liberaram níquel em quantidade tóxica. "Se curada, não faz mal algum", informa. A cura, segundo Késia, consiste em untar panelas novas, interna e externamente, com óleo vegetal e, em seguida, completar com água na temperatura ambiente e depois submetê-las à temperatura de 200 oC no forno. Depois disso, as panelas devem ser resfriadas naturalmente.
Com relação à absorção pelo organismo do ferro derivado dos utensílios de pedra-sabão e de ferro, os testes estão sendo realizados com grupos suscetíveis a anemia, como mulheres em idade fértil e vegetarianos. Sob aprovação do Comitê de Ética da FCM/Unicamp, a pesquisa conta com a participação e oito freiras, com idade média de 34 anos, e 60 estudantes vegetarianos de 13 a 23 anos, todos em Minas Gerais. Após serem submetidos a coleta de sangue, os participantes receberam os utensílios para cozinhar seus alimentos. Depois de cerca de três meses de uso, os usuários passarão por nova coleta para avaliar as alterações nos indicadores hematológicos analisados (hemograma, ferro sérico, ferritina e transferrina).
Késia acredita que a troca da panela de alumínio pela de ferro na preparação diária dos alimentos pode suprir 20% do requerimento diário de ferro para o organismo. "Apesar de conterem o equivalente a 78% de ferro, as panelas de inox liberam uma quantidade de ferro insignificante para o organismo", afirma. Segundo a pesquisadora, é raro o número de pessoas que possuem alteração no metabolismo do ferro, para as quais seria contra-indicado o uso destes utensílios.
A pesquisa de Késia tem um propósito ainda maior: fazer com que a informação sobre a migração do ferro na panela de pedra-sabão deixe de ser simplesmente uma crença da população mineira e seja uma contribuição para a prevenção da anemia para a população.
