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Pesquisadores do IB identificam protozoários em amostras
de águas minerais engarrafadas, esgoto e lodo de esgoto

‘Varredura’ de agentes parasitários
previne ocorrência de gastroenterite

MANUEL ALVES FILHO

Rio Atibaia, cujas águas em Campinas foram analisadas pela equipe de pesquisadores (Fotos: Antoninho Perri)De tempos em tempos a imprensa noticia um surto de gastroenterite em algum lugar do Brasil. Esse tipo de infecção, que provoca febres, vômitos e diarréias e que pode ser fatal para pessoas fisicamente debilitadas ou imunodeprimidas, tem sido objeto de preocupação por parte das autoridades de saúde. Graças às pesquisas realizadas por uma equipe do Laboratório de Protozoologia do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, as ações para tentar prevenir a ocorrência de novos casos estão sendo mais bem orientadas. Desde 1998, os pesquisadores têm investigado amostras ambientais para identificar a presença de duas espécies de protozoários causadoras de gastroenterite: o Cryptosporidium  spp. e a Giardia spp.. Conforme os estudos, estes organismos patogênicos foram encontrados em vários tipos de amostras, inclusive de água mineral engarrafada e de esgoto, para ficar em apenas dois exemplos.

Estudos tiveram início em 1998

As pesquisas desenvolvidas no Laboratório de Protozoologia são coordenadas pela professora Regina Maura Bueno Franco. De acordo com ela, os estudos na área de Epidemiologia Ambiental tiveram início em 1998, no contexto do Projeto Mercosul, conduzido pela Coordenadoria de Relações Institucionais e Internacionais (Cori). Naquela oportunidade, os pesquisadores da Unicamp desenvolveram uma investigação conjunta com cientistas da Universidade de Concepción, do Chile. O objetivo foi avaliar a presença de parasitos patogênicos nas águas brutas dos rios Atibaia, em Campinas, e Bio-Bio, em Concepción.

A professora Regina Maura Bueno Franco, coordenadora das pesquisas, ao lado dos pesquisadores Nilson Branco (à esquerda) e Diego Leal: investigações em diversos estados do país  A partir desse projeto, que gerou algumas publicações científicas, as atividades do laboratório foram ampliadas. Em 2002, a equipe do laboratório participou de uma investigação sobre surto de gastroenterite ocorrido em Itatiaia, no Rio de Janeiro, assessorando o Ministério da Saúde. “A partir daquela data, nós participamos de outras investigações de surtos ocorridos em diversos estados do país, em parceria com o Ministério, pesquisas estas relativas à presença de agentes parasitários em água, solo e sedimentos”, explica a docente do IB. Em junho de 2006, o Laboratório de Protozoologia do IB passou a ser o Centro Colaborador do Ministério da Saúde, nas questões de Parasitologia Ambiental.

Nos últimos anos, explica a professora Regina Maura, a equipe coordenada por ela investigou a presença do criptosporídio e de giardia em variadas amostras ambientais, como água de irrigação, águas minerais engarrafadas, esgoto, lodo de esgoto e, mais recentemente, em esgoto hospitalar. Os estudos identificaram que os organismos continuam a oferecer riscos à população. Ao analisarem 13 marcas de água mineral envasadas em galões de 20 litros, por exemplo, os pesquisadores constataram que em dois lotes de uma delas havia a presença do Cryptosporidium. “Esse dado é bastante preocupante, pois a população tende a acreditar que esse tipo de produto é seguro”, analisa a especialista.

Integrante do grupo chefiado pela docente do IB, o biólogo Nilson Branco destaca que as fontes naturais que fornecem água mineral para engarrafamento não estão livres de contaminação por organismos patogênicos. “Como se trata de água subterrânea, é preciso levar em conta o que acontece no entorno da fonte. A contaminação pode ocorrer, por exemplo, na hipótese de um animal ou um homem, que tenha os protozoários patogênicos em seu intestino, defecar nas imediações”, esclarece. De acordo com a professora Regina Maura, cabe à Vigilância Sanitária  fiscalizar esse tipo de atividade.

Amostras no Laboratório de Protozoologia: detecção de organismos patogênicosOutro trabalho realizado pelo Laboratório de Protozoologia foi o desenvolvimento de uma metodologia para detectar os organismos patogênicos em esgoto. Nessa tarefa, os pesquisadores do IB contaram com a colaboração da Sociedade de Abastecimento de Água e Saneamento S.A. (Sanasa), de Campinas. As investigações se concentraram na Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Samambaia. O objetivo era constatar a eficiência do método de tratamento por meio de lodo ativado. Durante dois anos, os cientistas monitoraram o sistema, analisando amostras tanto do afluente quanto do efluente.

Ao cabo da pesquisa, ficou comprovado que a eficácia do método adotado pela Sanasa atingia 98,9% para a Giardia e 99,7% para o Cryptosporidium, índices considerados bastante significativos. Em relação à análise do lodo de esgoto, as investigações conduzidas pelo grupo do IB levaram em conta a grande implicação que esse resíduo tem para a saúde pública. A professora Regina Maura afirma que a tendência verificada no país é de se construir novas ETEs, o que é positivo do ponto de vista do saneamento básico e, conseqüentemente, da saúde da população em geral.

Ocorre, entretanto, que isso deverá gerar mais lodo, que precisará ter uma destinação final adequada. Atualmente, a alternativa mais viável tem sido o uso desse material como fertilizante. “Isso é muito preocupante, pois se o resíduo estiver contaminado com estes organismos patogênicos, existe o potencial de contaminação do solo e de corpos d’água, mediante as chuvas, por exemplo”, alerta.

No estudo em questão, os especialistas da Unicamp verificaram a presença de cistos de giardia no lodo, mesmo após 45 dias de exposição do resíduo ao sol. “Como os protozoários são mais resistentes que as bactérias, fica claro que o procedimento não é suficiente para destruir esses organismos. Dependendo do declive e da drenagem hídrica do terreno onde o lodo contaminado for aplicado como fertilizante, haverá uma grande probabilidade de que as águas subterrâneas e os mananciais mais próximos também sejam afetados”, acrescenta o biólogo Nilson Branco.

A análise das águas das fontes naturais de água mineral foi feita na cidade de Campos do Jordão, a pedido da prefeitura local. O grupo do IB averiguou que três das 12 fontes investigadas, portanto 25% do total, estavam contaminadas com as duas espécies de protozoários. O problema ocorreu tanto na zona urbana quanto na rural. A equipe coordenada pela professora Regina Maura encaminhou sugestões de soluções às autoridades locais.

O estudo mais recente realizado pela equipe coordenada pela docente do IB concentrou-se no esgoto hospitalar. Durante um ano, os especialistas monitoraram os efluentes emitidos pelo Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp. Neste projeto, também foi avaliada a ação do processo fotoeletroquímico na destruição dos protozoários patogênicos, numa parceria com o professor Rodnei Bertazzoli, da Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM). “Embora a tecnologia ainda esteja na fase de bancada, foi possível verificar que ela é efetiva e promissora”, relata a docente do IB.

Considerando os resultados das várias pesquisas conduzidas pelo Laboratório de Protozoologia, a professora Regina Maura analisa que o país ainda precisa investir em métodos de detecção de protozoários patogênicos que apresentem simultaneamente boa sensibilidade e baixo custo. “Infelizmente, esses organismos são resistentes a diversos tipos de tratamento, como a cloração, muito utilizada no processo de desinfecção da água”. Nos Estados Unidos, por exemplo, houve um grande surto de criptosporidiose em 1993 porque um pequeno número de oocistos passou pelos filtros e atingiu a água distribuída à população, na cidade de Milwaukee, estado de Wisconsin. O surto afetou cerca de 400 mil dos cerca de 1,5 milhão de habitantes. Dos infectados, 44 mil precisaram receber atendimento médico, sendo que 10% deles foram hospitalizados. O episódio deixou 100 mortos e causou um custo total de US$ 96 milhões ao país.

Só 20% das cidades do Brasil têm esgoto totalmente tratado

Embora os protozoários patogênicos como o Cryptosporidium e a Giardia ainda representem um risco para a saúde pública, a população de Campinas pode ficar despreocupada pelo menos em relação à água potável que consome. Pesquisas realizadas pela equipe do Laboratório de Protozoologia do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, avaliando diferentes etapas do tratamento de água, não constataram a presença destes protozoários. Conforme a professora Regina Maura Bueno Franco, esse resultado se deve aos constantes investimentos que a empresa pública vem fazendo ao longo dos últimos anos, sobretudo na capacitação de seu pessoal técnico.

O mesmo não pode ser dito, porém, em relação à maioria das cidades brasileiras. Em boa parte delas, a ausência de saneamento básico continua sendo um problema a ser superado. Para se ter uma idéia, somente 20% dos municípios do país contam com 100% de esgoto tratado, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Essa deficiência, assinala a professora Regina Maura, favorece a dispersão dos protozoários patogênicos, ampliando conseqüentemente a possibilidade da ocorrência de novos surtos infecciosos.

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