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Rede internacional que tem liderança do Brasil vence
disputa junto ao Departamento de Energia norte-americano

EUA aprovam proposta brasileira para
seqüenciamento completo do eucalipto

LUIZ SUGIMOTO

O eucalipto vem ganhando importância estratégica como combustível vegetal e, também, como arma para o seqüestro de carbono  (Fotos: Antoninho Perri)O Departamento de Energia dos Estados Unidos (DOE) acaba de aprovar a proposta da rede internacional Eucagen (Eucalyptus Genome Network), liderada por três países, entre eles o Brasil, para o seqüenciamento completo do genoma do eucalipto. A espécie escolhida e proposta pelos brasileiros é o Eucalyptus grandis, aqui desenvolvida por melhoramento genético e que apresenta características únicas que vão acelerar e facilitar a montagem da seqüência.

O projeto idealizado com decisiva participação do Genolyptus – Rede Brasileira de Pesquisa do Genoma do Eucalyptus – concorreu com 120 outros projetos de diversos países que atenderam à chamada competitiva anual do Joint Genome Institute, ligado ao DOE, para seqüenciar genomas inteiros de organismos que sirvam como fontes renováveis de energia.

DOE laçou Projeto Genoma Humano

Matéria-prima da indústria de papel e de celulose, o eucalipto vem ganhando importância estratégica como combustível vegetal e, também, como arma para o seqüestro de carbono. “Falamos muito do álcool da cana, que é apenas uma dentre a infinidade de opções para diminuir o prejuízo ao meio ambiente”, afirma o professor Gonçalo Amarante Guimarães Pereira, do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp.

À frente do Laboratório de Genômica e Expressão do IB, Gonçalo Pereira coordena um dos oito subprojetos da Genolyptus, referente à análise e gerenciamento dos dados do genoma do eucalipto. “Há muita competição pela aprovação de projetos junto ao DOE e devemos esta vitória ao esforço do doutor Dario Grattapaglia, coordenador do Genolyptus. Ele é pesquisador da Embrapa e professor da Universidade Católica de Brasília, e agora será um dos três coordenadores do projeto internacional”.

Pereira lembra que foi o Departamento de Energia Americano que lançou o Projeto Genoma Humano, incentivando as inúmeras pesquisas pelo mundo a partir da década de 1970 e iniciando a atual revolução da biologia. Na época, a preocupação dos norte-americanos era investigar os efeitos da bomba atômica nas vítimas sobreviventes.

“Como nada existia de seqüenciamento, parecia uma proposta impossível, como a de pousar uma nave no sol. O DOE, no entanto, decidiu que decifrar o genoma do homem era importante e reuniu os melhores cérebros para chegar lá. Foi uma boa lição para nós, que temos na falta desta determinação e capacidade de organização a base do nosso subdesenvolvimento”, critica o professor.

Segundo Gonçalo Pereira, o foco do DOE agora é mais óbvio. “Não podemos continuar encarando as energias renováveis como uma excentricidade. Tudo que vemos ao redor, incluindo nossas próprias roupas, trazem alta dose de petroquímica. O futuro do planeta está na substituição da petroquímica por fontes renováveis, sendo o eucalipto um objeto de estudo excepcional”.

Genolyptus – Em outubro de 2002, a Unicamp sediou o primeiro encontro técnico da rede Genolyptus, oficializada em fevereiro daquele ano como o maior experimento florestal do mundo dedicado à genômica de uma árvore. Nesses cinco anos, sete universidades, a Embrapa e quatorze empresas que plantam eucalipto para papel , celulose e energia trabalham conjuntamente em laboratórios e em experimentações de campo para melhorar a competitividade comercial da planta produzida no país.

A área cultivada de eucalipto no planeta é estimada em 18 milhões de hectares, sendo que o Brasil planta cerca de 3,5 milhões de hectares com as maiores produtividades do mundo. Aqui, o eucalipto como matéria-prima da indústria é responsável por cerca de 2% do PIB e figura entre os principais produtos na pauta de exportação com uma contribuição de US$ 6 bilhões por ano.

O eucalipto, originário da Austrália, possui mais de 600 espécies e 20 delas são plantadas em mais de cem países para fins energéticos e industriais. “Espécies exóticas no Brasil, elas se cruzaram e ofereceram uma enorme variabilidade genética. Mas, nas primeiras florestas plantadas, não havia muito conhecimento da constituição genética e as plantas não eram as de melhor performance”, explica Pereira.

A partir dos métodos de melhoramento, passando pelos tradicionais e depois para o desenvolvimento da hibridação e clonagem, a produtividade saltou de 15 para mais de 50 metros cúbicos por hectare/ano, chegando a mais de 70m3 em alguns locais do país. Além disso, é no Brasil que o ciclo do eucalipto, até o ponto de corte, completa-se entre 5 e 7 anos, quando na Europa isto demora de 15 a 30 anos.

“Ao conhecermos o metabolismo das espécies de eucalipto, identificamos aquelas que têm as qualidades desejadas: maior volume de celulose, menor quantidade de lignina, crescimento mais rápido, resistência a determinada doença”, diz o pesquisador do IB.

Clonagem – Três anos é o prazo estipulado para a finalização e publicação do seqüenciamento completo do genoma do Eucalyptus grandis, desenvolvida pela empresa brasileira Suzano. “No Genolyptus seqüenciamos 60 milhões de bases e identificamos 200 mil seqüências expressas do eucalipto nos primeiros dois anos de projeto. Agora vamos participar de um trabalho bem mais pesado na ‘usina de seqüenciamento’ do DOE, cuja capacidade chega a incríveis 1,8 bilhões de bases por mês”, afirma Pereira.

Ao leigo, o professor explica que a técnica tradicional para elevar a produtividade do eucalipto implica no cruzamento de plantas com os melhores conteúdos genéticos, até se chegar a clones chamados de “elite” para plantio em escala.

Técnicas de biologia molecular permitem agilizar bastante este processo, identificando marcadores genéticos associados a características de interesse. “Pegamos plantas ainda jovens, para as quais ainda não se tem dados de produtividade, e a partir dos marcadores prevemos as que darão boas plantas. Perde-se bem menos tempo e se consegue uma seleção mais precisa”.

Na tela do computador, Gonçalo Pereira mostra seqüências que parecem verdadeiras sopas de letrinhas, cada qual com uma função no genoma da planta. “Por comparação, pode-se perceber um gene importante para o crescimento, mas que é pouco expresso. Transportando maior número de cópias do gene para dentro de um clone, talvez cheguemos a uma planta que atinja o ponto de corte em quatro anos e não em seis”.

Arquitetura – “Ocorre que, comparando a arquitetura do genoma com a de um edifício, nós mapeamos apenas a área útil. Estamos indo diretamente ao apartamento, sem observar a fundação ou se há vazamentos no sistema hidráulico e problemas em outros espaços invisíveis”, ressalva o pesquisador do Laboratório de Genômica e Expressão.

Ele afirma que esta estratégia é muito mais rápida e barata, mas não oferece a certeza de que todos os genes expressos foram identificados, nem permite a localização de porções chave do genoma que controlam a expressão dos genes.

“Seguramente, entre 20% e 25% dos genes não podem ser observados. Pode haver, por exemplo, um gene fundamental que se expressa apenas às quatro horas da manhã e sob certa temperatura. Se vamos a campo somente às nove horas, para nós este gene está perdido”, exemplifica.

Agora, os pesquisadores brasileiros do Genolyptus diretamente envolvidos na liderança do projeto internacional terão tempo e recursos para observar como funciona o metabolismo do Eucalyptus grandis em todo o seu interior. “Num edifício seria mais fácil, já que os engenheiros controlam o sistema e podem identificar os gargalos. Mas, dentro de uma estrutura viva, o nosso trabalho vira arte”.

Segundas intenções

O professor Gonçalo Amarante Guimarães Pereira, que coordena um dos oito subprojetos da Genolyptus: “Nosso trabalho vira arte"O professor Gonçalo Pereira ignora o valor de financiamento e outros detalhes do projeto para o seqüenciamento completo do genoma do eucalipto, mesmo porque ele acaba de ser aprovado pelo Departamento de Energia Americano, vindo somente agora a fase de planejamento da implantação.

O pesquisador, no entanto, antevê ganhos extras para o Brasil, além da possibilidade de executar um projeto de alto custo. “Primeiro, porque existem pouquíssimas árvores seqüenciadas. Segundo, porque o que descobrirmos neste processo poderá ser aplicado para a compreensão de outras plantas tropicais, um foco nunca desenvolvido até hoje”.

Pereira informa que a planta modelo para o estudo da genética é a Arabidopsis thaliana, a primeira cujo genoma foi completamente seqüenciado (e publicado no ano 2000). Com 125 milhões de pares de bases, o seu genoma é pequeno se comparado com o das outras espécies vegetais.

“Podemos dizer que o Eucalyptus grandis será a primeira árvore tropical – e de grande importância econômica – a ser totalmente seqüenciada. Este projeto vai trazer muitas novidades na área da biologia vegetal, algumas que talvez nem imaginemos. Voltando ao exemplo do edifício, veremos como é a fundação das plantas tropicais”, prevê o pesquisador do IB.

Em relação ao eucalipto, Gonçalo Pereira ressalta a sua importância para a recuperação ambiental, não apenas pela capacidade de capturar o carbono, mas também pelo rápido crescimento. Como exemplo, ele aponta o extremo sul da Bahia, região que possuía densa mata atlântica, mas que foi reduzida a menos de 10% de remanescentes pela expansão desordenada da agricultura e da pecuária.

“Ali, em solo já degradado, o eucalipto demora apenas seis anos para crescer. Os ecologistas muitas vezes demonizam o eucalipto e a sua baixa variabilidade. Mas precisamos observar que ele é plantado em área já desmatada, cumprindo um papel fundamental de floresta de substituição na produção de fibras e energia. Muitas vezes, o eucalipto cresce onde nada mais poderia ser plantado”, finaliza Pereira.

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