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Jornal da Unicamp - 10 a 16 de junho de 2002
Agora semanal

Pesquisa

Técnica desenvolvida para tese de doutorado obtém melhor aproveitamento do alimento, que pode ser congelado e formatado

Mandioca no palito

Manuel Alves Filho

Principal fonte de caloria para aproximadamente 500 milhões de pessoas no mundo, a mandioca ainda é um alimento pouco estudado no Brasil e, por isso mesmo, praticamente inexplorado industrialmente. Uma tecnologia desenvolvida para a tese de doutoramento de Shirley Aparecida Garcia Berbari, defendida recentemente na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, traz uma nova perspectiva para o aproveitamento dessa raiz, que tem no Brasil o seu segundo maior produtor mundial (24.354 milhões de toneladas). Após quatro anos de pesquisas, Shirley obteve palitos formatados, pré-fritos e congelados de polpa e farinha de mandioca, que apresentam diversas vantagens sobre os produtos convencionais à venda no mercado. A principal delas é a homogeneidade de forma e textura.

De acordo com a pesquisadora, os palitos de mandioca convencionais são resultado de um processo muito simples, que envolve apenas o descascamento, corte, cozimento e congelamento da raiz. De acordo com ela, esse preparo é semelhante ao aplicado à batata, cujas características são muito diferentes das da mandioca. “Isso cria alguns problemas, pois tanto o cozimento quanto o formato dos palitos não ficam uniformes”, afirma Shirley, que é graduada em engenharia de alimentos. Para resolver esse problema, ela desenvolveu uma técnica inovadora: depois de descascada e cozida, a mandioca é triturada, ganhando a consistência de uma massa. Em seguida, essa polpa vai para uma máquina onde é transformada em palitos estruturados.

As duas últimas etapas são a pré-fritura e o congelamento. Ao final do processo concebido por Shirley, obtém-se palitos homogêneos na forma e na textura. A pesquisadora, porém, foi mais longe e resolveu um outro entrave que envolve a industrialização da mandioca. Por ser um alimento altamente perecível, a raiz tem que ser trabalhada num prazo máximo de 48 horas após a colheita. A alternativa foi transformar a polpa cozida em dois tipos de farinhas de granulações diferentes. Misturadas, elas transformam-se na matéria-prima para a produção dos palitos pré-fritos e congelados.

Para chegar à composição das farinhas, que podem ser armazenadas por mais de um ano, a pesquisadora seguiu o processo anterior. A diferença é que a massa da mandioca cozida é desidratada e moída. Para obter novamente a pasta que gerará os palitos, basta adicionar água e óleo, cujas proporções são definidas por meio de um cálculo específico. A seguir, o processo é retomado com a formatação, a pré-fritura e o congelamento. “Essa tecnologia é dominada por outros países, mas apenas em relação à batata”, explica a autora da tese.

Uma vantagem adicional proporcionada pela técnica desenvolvida por Shirley está relacionada ao rendimento. No processo convencional de produção de palitos pré-fritos e congelados de mandioca, o aproveitamento gira em torno de 45%. Em relação ao produto estruturado, esse índice sobe para 65%. Para concluir sua pesquisa, a engenheira de alimentos utilizou as plantas pilotos do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital). “Isso foi importante, pois ficou comprovado que todo o processo pode ser perfeitamente reproduzido numa indústria.”

Os palitos de mandioca estruturados também foram objeto de um teste de aceitação (degustação) com funcionários e cientistas do Ital. Conforme Shirley, o produto foi aprovado por unanimidade. “Os palitos estruturados também permitem algumas variações, como a adição de sabores. Além disso, podem ser produzidos em formato de estrelinha e bichinho, o que estimulará o consumo pelas crianças”, acrescenta a pesquisadora. De acordo com ela, o seu objetivo, que é o de difundir e conferir maior status à mandioca, está próximo de ganhar dois importantes impulsos.

Um grupo nacional e um boliviano já demonstraram interesse em adquirir a tecnologia. “O melhor aproveitamento da mandioca pela indústria brasileira trará certamente ganhos financeiros e sociais para o País. Trata-se de uma cultura com grande produtividade e que praticamente não requer o uso de defensivos agrícolas. Além disso, ela se dá bem em solos pobres e não requer um manejo mais elaborado. Isso sem contar que a raiz é a maior fonte de calorias e garante a subsistência de um grande número de famílias no Nordeste”, lembra Shirley.

Da raiz ao freezer

1 A mandioca é descascada e cozida

2 Trituramento, 2ª fase do processo

3 Início do preparo da massa

4 Processo de pré-fritura

5 Os palitos já formatados

6 O congelamento do alimento

Um cimento ortopédico mais resistente
Uma tecnologia recém-desenvolvida por um aluno de pós-graduação da Unicamp promete melhorar significativamente os resultados das cirurgias de remodelação e reconstrução ósseas. Resultado da tese de doutoramento defendida por Luís Alberto dos Santos na Faculdade de Engenharia Mecânica (FEM), o cimento ortopédico de fosfato de cálcio reforçado por fibras apresenta uma série de vantagens em relação aos materiais em uso no mercado. A principal delas é a alta resistência a impactos, muito próxima da dos ossos humanos. Graças a essa característica, o novo material aumenta consideravelmente o seu campo de aplicação, atualmente restrito às intervenções odontológicas, crânio-maxilo-facial e de preenchimento de cavidades císticas e tumorais.

De acordo com Santos, atualmente as cirurgias de remodelação e reconstrução ósseas usam materiais como a cerâmica à base de fosfato de cálcio e o cimento de fosfato de cálcio. O primeiro tem como principal característica a biocompatibilidade, o que favorece o crescimento ósseo para o local onde ele se encontra. Entretanto, por ser encontrada na forma de blocos e granulados, a cerâmica, também conhecida como “osso sintético”, não permite modelações, dificultando assim a sua adequação ao local do implante. Já o cimento de fosfato de cálcio convencional não impõe essa limitação, pois se trata de uma pasta passível de modelagem, obtida a partir da mistura de um pó de fosfato de cálcio com uma solução aquosa.

Apesar de apresentar essa vantagem sobre a cerâmica de fosfato de cálcio e de ser absorvível, dando lugar a um novo tecido ósseo, o cimento de fosfato de cálcio convencional tem uma baixa resistência mecânica, que é de cerca de um quinto do osso cortical (osso denso) humano. O desafio encarado com sucesso por Santos foi justamente aumentar a resistência mecânica e tenacidade desse material, fazendo com que ele mantivesse suas propriedades positivas. Após quatro anos de pesquisas, orientadas pelo professor Celso Arruda , da FEM, e pelo professor Anselmo Boschi, da Universidade Federal de São Carlos, ele atingiu esses objetivos por meio da incorporação de fibras de reforço. “Dentro da matriz de cimento, a fibra contribui para aumentar a capacidade de suportar esforços do corpo. A carga é transferida através da matriz para a fibra, ampliando a resistência a impactos”, explica o autor da tese.

As fibras utilizadas para o reforço do cimento de fosfato de cálcio são obtidas de fornecedores nacionais e internacionais. São materiais comerciais e de uso cotidiano, como microfibras de náilon e polipropileno, utilizadas na confecção de roupas, e fibras de carbono, empregadas na indústria aeronáutica. Santos afirma que seu projeto obteve a conjugação de três características distintas: a bioatividade da cerâmica, a maleabilidade do cimento e, claro, a elevada propriedade mecânica. “O projeto possibilitou, ainda, o desenvolvimento de tecnologia para obtenção de formulações de cimento de fosfato de cálcio– técnica dominada por poucos países–, a partir de matérias-primas nacionais. Isso permitirá, futuramente, uma redução de preços ao consumidor, uma vez que o grama do material importado custa em torno de US$ 200,00”, afirma o pesquisador.

De acordo com Santos, novas composições de cimento de fosfato de cálcio foram desenvolvidas e estão em processo de patenteamento pela Unicamp e pelos pesquisadores. Elas apresentam melhores propriedades mecânicas, suportando impactos superiores aos dos ossos humanos. “Essas composições mais resistentes podem ter o seu uso estendido para além dos locais de baixa solicitação por cargas. Elas se aplicam também à ortopedia e à neurocirurgia, como alternativa para a consolidação de fraturas múltiplas de ossos longos, fixação de próteses articulares cimentadas e substituição de discos intervertebrais”, ressalta.

Os novos materiais, acrescenta o autor da tese, foram testados em animais, em parceria com a Faculdade de Ciências Agrícolas e Veterinárias de Jaboticabal, da Unesp, e apresentaram excelente biocompatibilidade. “Atualmente, estamos fazendo contato com empresas especializadas no ramo da ortopedia e da odontologia, objetivando o repasse das tecnologias desenvolvidas”, finaliza Santos. (M. A. F.)