| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 331 - 31 de julho a 6 de agosto de 2006
Leia nesta edição
Capa
Artista-Residente
Cartas
Faculdade de Educação
Cérebro
Cérebro: suporte logistico
Mandarim 34
Desnutrição
Valorização dos veteranos
Unicamp por 40 ângulos
Música Erudita
José Caldas
Cênicas: Prêmios em Blumenau
Painel da semana
Teses
Livro da semana
Veneno da copa
Câncer
 

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Desde sua criação com os cursos de Licenciatura,
unidade foi desafiada a justificar a própria implantação

A Faculdade de Educação
e seu papel na Universidade

A professora, as crianças em atividade e a questão: o professor deve ter formação  em educação ou buscar o bacharelado e depois se preparar para o ensino? (Fotos: Antoninho Perri,  Acervo Histórico do Arquivo Central (Siarq) e Acervo Cedoc RAC/AAN )Qual é o papel de uma faculdade de educação dentro da universidade? O professor de matemática deve ter formação em educação? Ou bacharelar-se em matemática e depois, querendo, se preparar para ensinar matemática? Temos aí uma discussão de décadas, até hoje não resolvida satisfatoriamente, inclusive entre os educadores. Criada oficialmente em 1972, a partir da necessidade de formar professores em Licenciatura, a Faculdade de Educação da Unicamp já nasceu desafiada a justificar a própria implantação. Em relação às Licenciaturas, sempre houve quem argumentasse que a metodologia de ensino de Física, por exemplo, deveria ser de responsabilidade do Instituto de Física, de Biologia pelo Instituto de Biologia, e assim por diante. E a criação do curso de Pedagogia, em 1974, fez aflorar certa descrença em relação ao pedagogo, como se exercesse atividade de segundo nível quando a vocação da universidade seriam as pesquisas de ponta.

A história da Faculdade de Educação da Unicamp é contada pelos professores Antonio Muniz de Rezende, Eduardo Oscar de Campos Chaves, Luiz Carlos de Freitas e Jorge Megid Neto, cada qual falando de seu tempo e externando suas posições. Rezende e Chaves contam que Montezuma, ex-padre, tentou imprimir uma linha mais humanística e menos profissionalizante à faculdade. As cargas horárias de disciplinas como Filosofia e História da Educação iam bem além do mínimo exigido pelo MEC, o que não deu certo porque os alunos, submetidos a período integral, tinham ingressado no curso justamente porque precisavam trabalhar.

Diretor de 1972 a 1976, Montezuma poderia ter permanecido no cargo, pois a indicação era prerrogativa do reitor. No entanto, havia insatisfação interna com sua maneira de administrar, tida como autoritária e centralizadora – ele argumentava que a experiência pessoal o autorizava a agir assim. Decidida sua saída, o reitor endossou a preferência da unidade por Antonio Mariz de Rezende, que voltava do exterior com um doutorado em teologia (em Roma) e outro em filosofia (em Louvain). Embora estivesse dando aulas no Canadá, aceitou voltar ao Brasil por sugestão do professor Newton Aquiles von Zuben, para lecionar Filosofia da Cultura na Unicamp.


A Faculdade de Educação vista do alto: 4.871  alunos na Pedagogia, Licenciatura e Pós-GraduaçãoEm 1976 Rezende recebeu de Rogério Cerqueira Leite, coordenador geral dos Institutos, o convite-desafio de elevar o status da Faculdade de Educação ao nível dos Institutos de Física, Biologia e Matemática, unidades que contribuíram para o prestígio conquistado pela Universidade em menos de dez anos de existência. Ciente de que seu papel era buscar a afirmação política da Faculdade, dentro e fora do campus, Rezende convidou para diretor associado Eduardo Chaves, que chegara em 1974 para coordenar o curso de Pedagogia e no ano seguinte a Pós-Graduação, estando a par, portanto, da legislação, da composição curricular e das carências nos quadros de docentes e de funcionários.

Enquanto Chaves cuidava do dia-a-dia da unidade, Rezende dedicava-se à política universitária, coerentemente com uma concepção da educação como aprendizado da cultura. Passou-se então a contratar mais filósofos, historiadores e cientistas sociais do que especialistas em educação. O Departamento de Filosofia e História da Educação, que deu as diretrizes da unidade por quase vinte anos, reunia nomes como Dermeval Saviani, Rubem Alves, Régis Francisco de Moraes, Antonio Joaquim Severino, Moacir Gadotti, Evaldo Amaro Vieira e Augusto Novaski, aos quais um pouco mais tarde veio juntar-se Paulo Freire.

Rezende, em foto de época: missão de elevar o status da Faculdade Internamente, Rezende conseguiu o envolvimento de professores e funcionários ao adotar a política de nada decidir sozinho, sempre buscando apoio no Conselho Interdepartamental. Fora, tratou realmente de colocar em outro patamar as relações com as demais unidades e outras instituições. Atuou intensamente nas greves contra o governo Maluf em 1978 e 1979, comparecendo às assembléias e defendendo os docentes engajados no movimento junto ao Conselho Diretor. Ao final de sua gestão, abriu-se um processo sucessório democrático, com consulta a docentes, funcionários e alunos. Processo similar foi levado na Faculdade de Engenharia, que escolheu Maurício Prates, e em outras unidades, fazendo emergir o chamado grupo de “diretores democráticos”.

Jogo político – Na Faculdade de Educação, Eduardo Chaves encabeçou naturalmente a lista enviada ao reitor – que já era Plínio Alves de Moraes. No entanto, só viria a assumir a direção em maio de 1980, a muito custo. Isso porque naquele momento surgia uma celeuma em torno da exigência de titularidade máxima aos diretores ditos independentes, iniciando-se um tenso jogo político que culminaria no episódio mais crítico da história da Unicamp, a intervenção decretada por Maluf em 1981 e a resistência a ela.

Era Eduardo Chaves, então, quem entrava na cena política, entregando ao diretor associado Pedro Goergen os problemas administrativos da unidade. Tornou-se um dos personagens da resistência, como mostra o Jornal da Unicamp nos últimos capítulos da série O mandarim. O capítulo sobre a contratação de Paulo Freire (edição 329), porém, não relata o temor de Chaves de ser demitido, quando foi convocado pelo staff de Plínio Moraes para explicar porque assinara, em nome da Faculdade, um documento ao Itamaraty pedindo a liberação do passaporte do educador.

Chaves: exonerado, foi à Justiça para se manter na direçãoJá o capítulo de O Mandarim desta edição (páginas 6 e 7) revela as nuances que permitiram a Chaves obter o mandado de segurança para sua reintegração ao cargo na faculdade, oferecendo o exemplo seguido por outros diretores exonerados como Aécio Pereira Chaves Chagas (IQ), Ayda Ignez Arruda (Imecc), Carlos Argüello (IFGW) e Carlos Franchi (IEL). O amontoado de petições judiciais no gabinete forçaria negociações para pôr fim à crise na Universidade. Chaves, no entanto, não gostou do jogou que viu e aquela experiência bastou. Com mais dois anos de mandato a cumprir, até 1984, sentiu-se desmotivado mesmo para a política interna da unidade, envolvendo-se cada vez mais nos assuntos administrativos.
Ao sucessor Pedro Goergen é atribuído o mérito de promover um alto grau de institucionalização da unidade, complementado pela construção do prédio próprio. Segundo Luiz Carlos de Freitas, com a ampliação do quadro de professores e funcionários e com o ingresso de profissionais das mais variadas concepções, foi havendo uma maior dinâmica na produção científica e na participação política. Contudo, os filósofos e historiadores, entre os quais Goergen se inclui, ficariam à frente da faculdade por quase outra década, até as gestões de José Dias Sobrinho (1988-1990) e José Luís Sanfelice (1990-1996).

Somando águas – Freitas, primeiro pedagogo a assumir a direção, rebate a visão de que sua gestão significou um divisor de águas na história da Faculdade de Educação, ressaltando que a intenção não foi dividir, mas “somar águas” com quem quis se apresentar. O que Freitas divide são os créditos do esforço para aprimorar a estrutura de produção científica na Pós-Graduação e dos cursos de licenciatura, para a inserção da faculdade no âmbito das novas tecnologias, e pela abertura dada aos funcionários administrativos em termos de participação e crescimento profissional. Cita parceiros como Ana Luiza Smolka, Angel Pino Sirgado, Helena Lopes de Freitas, Elizabete Mercury, Ivany Rodrigues Pino, entre outros.

Freitas, primeiro pedagogo a dirigir a unidade: “Somando águas” Com Freitas assumiram a Faculdade profissionais que defendem, como base do curso de Pedagogia, a formação do professor – e não de especialistas habilitados em diferentes áreas fragmentadas. Esta ênfase ele justifica com uma comparação: assim como a Faculdade de Medicina tem seu campo definido pela responsabilidade social que lhe compete em relação à saúde, a Faculdade de Educação tem seu âmbito definido pela sua responsabilidade social em relação à educação e dentro deste âmbito à escola. Daí, o papel central da unidade ser formar profissionais para a educação, ainda que isso não deva ser entendido de forma restritiva.

Nesse sentido, Luiz Carlos de Freitas faz severa crítica à Universidade, que no começo da gestão de sua sucessora Agueda Bernadete Bittencourt (2000-2004) retirou da Faculdade de Educação a responsabilidade pelas licenciaturas e entregou-as aos Institutos. Crítica acentuada com outra comparação: não se formam médicos no Instituto de Biologia, apesar da importância da biologia na formação do médico.

O prédio próprio da Faculdade em construção: mérito atribuído à gestão de Pedro Goergen O atual diretor Jorge Megid Neto, que sofreu o revés como diretor associado de Agueda Bittencourt, observa que este preconceito visto na universidade reflete uma contradição da sociedade, que por um lado reconhece a importância da educação para o país, mas por outro vê com naturalidade um futebolista amador dando aulas de educação física aos finais de semana em uma escola pública. Assim, embora todos exerçam atividades de ensinona universidade, nem por isso devem se achar entendedores de educação. Graduado em Física pela Unicamp, Megid Neto fez a licenciatura e tem mestrado e doutorado na área de educação, tendo trabalhado por 16 anos professor no ensino médio. Apesar de físico, ressalta que sua formação profissional é como educador.

Megid Neto: físico, mas com formação de um  educador A FE hoje – Em 2005 freqüentaram os cursos de Pedagogia, Licenciatura e de Pós-Graduação, 4.871 estudantes, sendo 450 nos períodos diurno e noturno do curso regular de Pedagogia. A Pós-Graduação recebeu 700 alunos – nos programas em Educação e Gerontologia já foram defendidas 970 dissertações de mestrado e 671 teses de doutorado. A Faculdade vem oferecendo há alguns anos um curso novo de Pedagogia, dentro do Programa Especial de Formação de Professores em Exercício (PEFoPex), que tinha 114 matriculados no ano passado. O Programa Especial de Formação de Professores da Educação Infantil e Séries Iniciais do Ensino Fundamental (Proesf) atendeu a 1.600 alunos da Região Metropolitana de Campinas. Um curso de especialização para gestores do sistema público estadual, modalidade lato-sensu, está contemplando cerca de 6.000 gestores.

Desde o final dos anos 1980, a Faculdade de Educação vem mantendo um quadro com cerca de 100 docentes (99 em 2005). No entanto, a partir de 96, metade do quadro foi alterado com a aposentadoria dos antigos professores e a contratação de novos. Jorge Megid Neto, que está entre os ingressantes dos últimos dez anos, admite que sua geração padece por já ter de assumir cargos de administração acadêmica. E ele, que não é filósofo, historiador ou pedagogo, observa que esta renovação vai mudando a feição da Faculdade.

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