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Jornal da Unicamp 180 - Página 4

10 a 21 de julho de 2002
Agora semanal


Morte garante sobrevida aos super-heróis

Jornalista conclui que destino de personagens está condicionado à evolução da sociedade

Antonio Roberto Fava

Quando o jornalista e professor Dario Carvalho Jr. percebeu que muitos heróis de histórias em quadrinhos (HQs) estavam morrendo de forma estranha e curiosa, começou a querer saber as razões. Passou então a investigar os motivos que levaram, por exemplo, Angeli, criador de Rê-Bordosa, a “matá-la”. Mergulhou fundo ainda no desaparecimento de heróis como Super-Homem e Sandmam, um dos mais cults já publicados por revistas de histórias em quadrinhos, que, segundo Dario, configura-se numa paródia à morte dentro desse tipo de mídia.

Aficionado por HQs desde criança, Dario diz que começou a perceber tal fenômeno na década de 90. Conclui, por exemplo, que Super-Homem teve na vida, morte e ressurreição, uma “reprodução” da trajetória de Jesus Cristo.

Essas são algumas das conclusões do jornalista, presentes na dissertação de mestrado A Morte do Herói – Introdução ao Estudo de Sobrevivência dos Modelos Míticos nas Histórias em Quadrinhos, apresentada recentemente junto à Faculdade de Educação (FE) da Unicamp. O jornalista diz que a morte dos super-heróis levou-o a uma reflexão: por que as histórias em quadrinhos têm um tipo de narrativa que permite que os heróis sejam imortais? “Os personagens estão morrendo porque se afastaram demais do modelo do herói épico; por isso estão fadados a morrer de uma vez, a não ser que seus mundos afastem-se do ‘mundo real’”, deduz.

“De início, decidi dividi-los em três tipos: o herói cotidiano, o super-herói e o herói de fantasia maravilhosa. O passo seguinte foi, por meio de um criterioso estudo e análise, estabelecer paradigmas que relacionassem as mortes diretamente às narrativas desses personagens”, explica o jornalista.

Para ele existe toda uma relação entre ficção e realidade. Um personagem cotidiano, por exemplo, veiculado em tiras de jornal, representa a época em que vive. “Só assim o leitor consegue projetar-se e identificar-se com a personagem”, acredita. Observa ainda que quando a Aids surgiu no mundo real (começo dos anos 80), a doença afetava consideravelmente o mundo fictício da personagem Rê-Bordosa. A doença obrigaria Angeli, o criador da personagem, a mudar as características, ou ela ficaria sem trânsito entre ficção e realidade, “perdendo dessa forma a credibilidade e leitores, porque este não vai conseguir identificar-se com Rê-Bordosa”, explica. Dario observa ainda que os heróis cotidianos morrem quando o “mundo de verdade” muda e seus autores, por qualquer razão, se recusam a alterar a personalidade de seus personagens, fazendo com que os mundos da ficção e o real entrem em conflito.

A morte desses personagens não seria resultado da própria evolução dos tempos e do desenvolvimento das HQs? Dario diz que sim, que é conseqüência da evolução da sociedade. “Não no sentido de evolução, sinônimo de melhora, mas de mudanças. A sociedade se transforma, mudam os valores e padrões, e os heróis têm que acompanhar essa evolução. Se não acompanharem, acabam morrendo. O que não significa que isso represente a decadência das histórias em quadrinhos. Pelo contrário, é o que está permitindo uma sobrevivência dos quadrinhos”. Segundo o autor da dissertação é preciso ressaltar que morte do herói ocorre justamente porque ele mudou demais. “Por incrível que pareça, a morte dos personagens é um forte recurso para a sua sobrevivência”, conclui o jornalista.