Edição nº 602

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 11 de agosto de 2014 a 24 de agosto de 2014 – ANO 2014 – Nº 602

Consumo de café e refrigerante de cola causa alterações ósseas

Constatação de pesquisa desenvolvida na Faculdade de Odontologia de Piracicaba corrobora dados da literatura

O consumo frequente de café e de refrigerante à base de cola (Coca-Cola) promove alterações ósseas e pode aumentar o risco de fraturas, principalmente no sexo feminino. A conclusão é da tese de doutorado do cirurgião-dentista Amaro Ilídio Vespasiano Silva, defendida recentemente, no programa de Pós-Graduação em Radiologia Odontológica da Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP), sob a orientação do professor Lourenço Correr Sobrinho. Embora a pesquisa tenha sido feita em modelo animal (ratos), sustenta o autor, seus resultados podem ser extrapolados para os seres humanos. “Estudos encontrados em literatura específica acompanharam populações (homens e mulheres) que consumiram refrigerante à base de cola e chegaram a resultados semelhantes aos encontrados na minha tese”, afirma o pesquisador.

Em seu trabalho, que teve a coorientação do professor Francisco Haiter Neto, Amaro Silva também analisou os efeitos do consumo de refrigerante à base de guaraná (Antárctica) sobre os tecidos ósseos. De acordo com ele, a bebida causa igualmente alterações na estrutura óssea, mas os resultados não foram determinantes a ponto de reduzir a resistência do osso, assim como ocorreu com o café e o refrigerante à base de cola. A grande responsável por esse efeito deletério, informa o pesquisador, é a cafeína, presente nas três bebidas consideradas, em proporções diferentes.

A substância, conforme o cirurgião-dentista, age sobre o metabolismo ósseo. “Ela induz a diferenciação de células precursoras de tecido ósseo em osteoclastos, células responsáveis pela reabsorção óssea. Quando a cafeína está presente em grande quantidade, ocorre um aumento na diferenciação de osteoclastos, e com isso um aumento significativo na reabsorção óssea. Como consequência, temos uma redução da massa óssea e o aumento do risco de fraturas”, detalha. 

A ideia de desenvolver o trabalho, conforme o autor, veio da necessidade de saber se a cafeína interferiria na qualidade do osso – estrutura e resistência. “Alguns estudos apresentam controvérsias a respeito. O fato de as bebidas serem amplamente consumidas no Brasil, inclusive por crianças e adolescentes, foi determinante para a escolha do tema”, diz.  Amaro Silva esclarece que as alterações mais pronunciadas nos ossos das fêmeas apuradas na pesquisa se dão provavelmente por causa de fatores hormonais. 

Apesar de o estudo não ter avaliado os teores hormonais, afirma, a grande diferença entre machos e fêmeas está na variação hormonal. “No caso dos seres humanos, a mulher possui um ciclo hormonal que influencia diretamente sobre o metabolismo do osso. Ocorre que a cafeína interfere sobre esse ciclo, o que faz com que haja maior desmineralização do tecido ósseo”, reforça. Questionado sobre a possibilidade de se fazer um consumo seguro das três bebidas investigadas, Amaro Silva informa que até o momento a ciência não determinou um valor máximo nesse sentido. “Os estudos apontam que a menor concentração de cafeína, consumida no menor intervalo de tempo, já é capaz de produzir efeitos adversos sobre o metabolismo ósseo”, aponta.


Metodologia

Como dito anteriormente, a pesquisa para a tese de doutoramento de Amaro Silva foi desenvolvida em modelo animal. Ele selecionou 80 ratos adultos do Biotério Central da Unicamp, sendo 40 machos e 40 fêmeas, com idade de 90 dias. Durante o transcorrer do estudo, os animais foram mantidos em gaiolas de policarbonato, em local com temperatura e umidade controladas, com ciclos alternados de 12 horas em ambientes claro e escuro. 

A alimentação constou do fornecimento de ração balanceada padrão e água à vontade para todos os grupos de animais, além de dieta à base de café e refrigerantes de cola e guaraná para os grupos experimentais. As gaiolas possuíam dois bebedouros, um com água e o outro com a dieta selecionada, dispostos em posições opostas e reabastecidos diariamente com 500 ml de cada substância. O volume diário consumido era anotado e posteriormente tabulado, com a finalidade de estabelecer a média de consumo diário de água, café e refrigerantes à base de cola e de guaraná em cada grupo experimental. Todos os animais foram pesados semanalmente, para verificar se havia ocorrido ganho e/ou perda de peso, em função das dietas utilizadas.

Decorridos quarenta e oito dias de administração das dietas à base de café e refrigerantes, todos os animais foram novamente pesados, com o objetivo de registrar a média de peso corporal final em cada grupo experimental, o que permitiu analisar se havia ocorrido ganho ou perda de massa corporal em cada rato. Após o procedimento de pesagem, todos os animais foram sacrificados, seguindo o protocolo estabelecido pela Comissão de Ética no uso de Animais. Em seguida, os fêmures direitos dos animais foram dissecados e armazenados em recipientes de vidro individualizados para cada amostra, contendo formol. 

Após esses procedimentos, dois métodos avaliaram as consequências da dieta sobre os tecidos ósseos. Para análise da microarquitetura óssea trabecular dos fêmures foi utilizado um equipamento denominado microtomógrafo computadorizado. Para a análise da resistência óssea, foi empregado o teste de resistência à flexão de três pontos, por meio de uma máquina de ensaios mecânicos. Segundo o autor, a tese não avaliou os efeitos do consumo das bebidas sobre os dentes dos ratos. “Isso será feito em um próximo estudo, dentro do pós-doutorado”, adianta Amaro Silva.

O pesquisador destaca que os resultados obtidos por sua pesquisa corroboram com dados já presentes na literatura sobre o efeito adverso do consumo de café e refrigerante à base de cola cobre o tecido ósseo. “Em relação ao consumo do refrigerante à base de guaraná, não existia até então a avaliação de seus componentes sobre a microarquitetura e resistência óssea, sendo este o pioneiro na área”, garante Amaro Silva, que contou com bolsa de estudo concedida pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

O cirurgião-dentista observa, ainda, que a sua tese faz parte de um projeto amplo, no qual outra aluna do doutorado está realizando a análise da densidade mineral óssea e a avaliação dos níveis séricos de cálcio, fósforo e magnésio. O objetivo é encontrar valores característicos de redução da densidade mineral óssea e de perda de minerais.

Os estudos provenientes desse projeto já foram premiados na 30ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira de Pesquisa Odontológica, tendo recebido o primeiro lugar. Também receberam o prêmio no IX Congresso Nacional de Radiologia Odontológica (Conabro). A equipe de trabalho é composta ainda pelos alunos de doutorado Yuri Nejaim, Gina Roque Torres e Maria Beatriz Carrazoni Cal Alonso.

 

Publicação

Tese: “Avaliação da microarquitetura e resistência óssea em ratos submetidos à dieta diária de café e refrigerantes à base de cola e guaraná”
Autor: Amaro Ilídio Vespasiano Silva
Orientador: Lourenço Correr Sobrinho
Coorientador: Francisco Haiter Neto
Unidade: Faculdade de Odontologia de Piracicaba (FOP)
Financiamento: Capes

Comentários

Comentário: 

Parabéns pela pesquisa! Precisa de ampla divulgação. O açúcar, presente em grandes quantidades nessas bebidas mencionadas, também promove a descalcificação acentuada.

zeramalho01@gmail.com

Comentário: 

então, com esta análise e pesquisa podemos concluir que o café, seguidor do nosso dia-a-dia também se enquadra no mesmo quesito? que também causa desmineralização óssea? esse efeito não pode ser devido à alguma outra substância presente no refrigerante, como ácido fosfórico?

hiiagocosta@gmail.com

Comentário: 

Muito interessante esta pesquisa pesquisa.
Pena que estou na rota da osteoporose. Eu e minhas 4 xícaras diárias de café.
O trabalho quantifica o teor de cafeína consumido diariamente por cada animal? Seria interessante que estivesse claro, na reportagem, a equivalência da ingestão de cafeína por dia e peso de cada animal com o consumo presumido de café e refrigerante em um humano adulto.

joseliamarques@yahoo.com.br

Comentário: 

Não acredito muito nisso, pois tenho 65 anos e tomo café desde criança, gosto forte, se fosse verdade eu estaria toda deformada. Conheço um senhor de 80 anos que é viciado em Coca-Cola desde criança e está em pé.

Abraços,
Célia Maria

cemagoleal@yahoo.com.br