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Forno simula incêndio com
estruturas em tamanho real

Luiz Sugimoto

Experimentos visam estabelecer parâmetros nacionais de segurança, além de soluções adequadas à realidade brasileira

O professor Armando Lopes Moreno Junior (à direita), o doutorando Geraldo Silveira  Mateus Sarcedo Sant’Anna: forno (ao fundo e no destaque, em funcionamento) é o primeiro do gênero construído no país (Foto: Antoninho Perri)No caso de incêndio em um edifício, a temperatura onde se registra o foco pode atingir 600 graus centígrados em apenas seis minutos. Sujeita a este calor, uma coluna de aço passa a sustentar apenas metade da carga para a qual foi dimensionada e “entra em ruína” – na expressão utilizada pelos técnicos para caracterizar a ruptura do material. No World Trade Center, a temperatura nos pontos atingidos pelas aeronaves chegou a 1.800ºC.

O primeiro forno construído no Brasil para simular uma situação de incêndio com elementos estruturais em tamanho real, sob carregamento, está na Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp. “É um forno específico para colunas e a temperatura interior chega a 1.300 graus”, explica o professor Armando Lopes Moreno Junior, responsável por este primeiro projeto financiado pela Fapesp, iniciado em 2004 e recém-concluído.

O professor Armando Lopes Moreno Junior (à direita), o doutorando Geraldo Silveira  Mateus Sarcedo Sant’Anna: forno (ao fundo e no destaque, em funcionamento) é o primeiro do gênero construído no país (Foto: Antoninho Perri)Um novo projeto pela Fapesp é temático e envolve a construção de mais dois fornos. Um deles, para ensaios com lajes e vigas, terá as dimensões de um quarto: 4m x 4m e 3m de altura; no outro serão feitos testes com paredes. “Completaremos assim a gama de elementos estruturais que precisam ter o comportamento avaliado em situação de incêndio”.

Segundo Armando Moreno, este projeto previsto para quatro anos será desenvolvido em conjunto com duas unidades da USP: a Escola de Engenharia de São Carlos, que tem tradição em estudos com estruturas de madeira e de aço, e a Escola Politécnica, que contribuirá principalmente com a simulação dos ensaios em computador.

Experimentos em fornos com incêndios padronizados permitirão estabelecer parâmetros nacionais de segurança, além de soluções mais econômicas e adequadas à realidade brasileira. “As normas existentes no país baseiam-se em resultados experimentais obtidos no Exterior. A simulação do comportamento dos nossos materiais em situação de incêndio, e com nossas técnicas de construção, pode orientar um padrão nacional de dimensionamento”, diz o professor da FEC.

Colunas mistas
Geraldo Silveira Leite Junior, aluno de doutorado que trabalha no inédito forno já em funcionamento na FEC, dá o exemplo das colunas de aço ocas preenchidas com concreto, largamente empregadas na construção civil mundial, mas desconsideradas no Brasil. “Observamos nos ensaios que o preenchimento melhora o comportamento da estrutura, aumentando a resistência e rigidez da coluna. A coluna mista permite diâmetros menores e custos também menores”.

De acordo com Armando Moreno, a coluna mista de aço e de concreto se destacou também por um melhor comportamento em situação de incêndio, por vezes dobrando o tempo da ruína quando comparado à mesma coluna sem preenchimento. “O concreto ‘resfria’ o aço, retardando o processo de ruína estrutural. Se um pilar de aço entra em ruína a 600 graus, o preenchimento com concreto pode aumentar o tempo e o nível de temperatura que a estrutura pode suportar”.

O mestrando Mateus Sarcedo Sant’Anna, também participante do projeto, acrescenta que o desconhecimento sobre o comportamento da coluna mista justifica sua rara utilização no país. “O concreto é um preenchimento barato e de fácil utilização, que oferece economia de materiais de revestimento contra o fogo. A questão é que tudo vem da literatura internacional, não há informações nacionais sobre o assunto”.

Geraldo Leite explica que, durante um incêndio, a coluna de aço convencional, geralmente retilínea, sofre uma deformação exagerada, entrando em ruína acima de certos limites de carga. Para Mateus Sant’Anna, a ocorrência de incêndios em edifícios não é freqüente, mas desastrosa quando acontece. “É importante pensar em todas as possibilidades para minimizar as perdas humanas e materiais. E vimos que a coluna mista é um elemento favorável”.

A preocupação dos pesquisadores com o revestimento contra fogo se deve ao seu alto custo para as condições do país, mas esclarecem que o concreto armado tem comportamento excelente em situação de incêndio. “No caso, a armadura de aço, material menos resistente ao calor, está envolta pelo cimento, que faz com que a temperatura interna seja bem inferior à do incêndio. Quanto maior o cobrimento de concreto, maior a proteção contra a ruína”, esclarece Armando Moreno.

Preço do pioneirismo
O professor lembra que sua equipe na FEC, formada por dez pesquisadores, sujeitou-se inclusive a acidentes durante a construção do forno e os ensaios com colunas. “Tivemos que projetar praticamente todo o equipamento. Quando se tem acesso à bibliografia internacional, os autores estrangeiros descrevem apenas o que deu certo e nada do que deu errado. No nosso caso, foram tantos os imprevistos que a conclusão do projeto teve dois anos de atraso”.

Moreno se refere a queda de materiais durante a simulação de carga sobre os pilares, choques elétricos e até explosões de amostras, com todos trabalhando próximos a temperaturas extremas. “É um estudo que se completa. Avaliamos desde o comportamento do aço ou do concreto até o elemento estrutural, sob carregamento, executado com esses materiais. O comportamento do concreto, por exemplo, pode ser avaliado por meio de amostras em fornos pequenos – e foi quando ocorreram explosões das amostras, o chamado spalling

Um problema do concreto, como esclarece o docente da Unicamp, é o lascamento explosivo, quando o material sofre um desplacamento a altas temperaturas. “O concreto é poroso. Cada poro contém água e vai funcionar como uma pequena panela de pressão. A água transformada em vapor tenta escapar por microfissuras do concreto e, quando esta fuga é rápida, tem um efeito explosivo – é o spalling, concreto a mais de 600oC explodindo em pequenos pedaços”.

O grupo da FEC prosseguirá com os ensaios para evitar o spalling, focando misturas com concretos de alta resistência a compressão, mais sujeitos ao fenômeno. Segundo Armando Moreno, os estudos podem contribuir para que o meio técnico científico nacional emprego concretos de alta resistência com segurança. “Já foram construídos edifícios com este tipo de concreto em nosso país, mas seu comportamento em situação de incêndio ainda não foi totalmente esclarecido. São respostas a questões como esta que este projeto pioneiro pode trazer”.

A engenharia de segurança como ciência

Os pesquisadores envolvidos no projeto temático Fapesp informam que nos países desenvolvidos a engenharia de segurança é considerada ciência, fazendo parte dos cursos de graduação e de pós-graduação sobre o tema. Aqui, estados como São Paulo e Minas Gerais determinam a verificação das estruturas em situação de incêndio, em que pesem as dificuldades para se fazer cumprir a legislação, devido ao pouco conhecimento técnico sobre o comportamento das estruturas em situação de incêndio.

O Brasil adotou maior rigor em relação a instalações de segurança contra incêndio depois das tragédias do edifício Andraus em 1972 e dos edifícios da Caixa Econômica do Rio de Janeiro e do Joelma em 1974, que resultaram em 195 mortes. No Estado de São Paulo, outros incêndios graves, como do Grande Avenida e do prédio da Cesp na Capital, resultaram em medidas legais efetivas em 1994 e 2001, por meio de decreto. Em 2005 foram publicadas 38 instruções técnicas.

Edifícios de fácil desocupação podem dispensar a verificação da segurança estrutural, exceto quando haja interesse de proteção patrimonial. Edifícios de grande porte, em que o tempo de desocupação é de difícil determinação, ou edifícios com alto risco de incêndio, devem ter a segurança estrutural verificada para evitar o colapso, permitindo assim a desocupação e execução de reforços para sua reutilização.

Métodos analíticos de dimensionamento de edifícios em concreto em situação de incêndio são pesquisados por diversas instituições científicas da Europa, Oceania e América do Norte, à procura de uma padronização. Levam-se em conta as características geométricas dos elementos estruturais (forma, dimensões, cobrimentos das armaduras) e as reduções de resistência, com critérios de segurança adequados à situação excepcional. A norma da União Européia, Eurocode 2, apresenta princípios a serem utilizados no dimensionamento, mas sem detalhamento completo.

No Brasil, considerando-se apenas as características geométricas, conclui-se que para o tempo requerido de resistência ao fogo (TRRF) igual a 30 e 60 minutos, os elementos estruturais com dimensões usuais atendem, com poucas exceções, às prescrições internacionais, exceto as lajes pré-moldadas tipicamente utilizadas no país, que demandam estudos mais aprofundados.

Entretanto, no caso de edificações de maior risco, cujo TRRF é igual ou superior a 90 minutos, as dimensões usuais ainda estão aquém das exigências internacionais. Os pesquisadores consideram que o meio técnico brasileiro precisa se conscientizar da importância de se seguir padrões internacionais para o dimensionamento das estruturas de concreto em situação de incêndio, visando à qualidade do desempenho das construções.

Os pesquisadores julgam ainda que o processo de proteção por meio de revestimento contra fogo, largamente utilizado no Brasil, é dimensionado com base em ensaios simplificados, que consideram um limite de temperatura de 550 °C. Este método, segundo eles, é antieconômico em grande parte das situações, num país que não pode se dar ao luxo de desperdiçar material.

 
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