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Velhas e novas fronteiras agrícolas

Sergio Salles Filho

Segundo estimativas, país tem cerca de 211 milhões de hectares em pastagens

Foto: Antoninho Perri)O Brasil tem 850 milhões de hectares de território; destes, calcula-se que 350 milhões são agricultáveis. Hoje, temos algo em torno de 63 milhões de hectares com áreas de lavoura, 22 só de soja, um mundo de soja. Cana deve ter alcançado 8 milhões já em 2007, um crescimento de 25% em menos de dois anos. Entretanto, o mais impressionante é que temos algo como 211 milhões de hectares em pastagens extensivas. Com pouco mais de 200 milhões de cabeças, dá um boi por ha. Um luxo em qualquer lugar onde a civilização humana tenha se instalado neste nosso planeta. Produz-se gado assim porque há terra disponível para isso e porque o preço da terra, até bem pouco tempo, manteve-se em níveis baixos o suficiente.

Aí entra o tema da fronteira agrícola e do desmatamento. A derrubada da floresta e a ampliação da fronteira têm quatro fatores de estímulo econômico principais: a madeira, que se extrai e se vende a preços cada vez mais atraentes; a pecuária, que normalmente entra em seguida à derrubada para a ocupação da área; a lavoura, que muitas vezes substitui a pecuária; e a terra, por que ninguém é bobo e continua sendo uma importante forma de reserva de valor, antes mesmo de ser capital. Explico-me sobre essa última afirmação. Terra tem funcionado neste país como reserva de valor, muito mais do que como um recurso produtivo (capital). Se assim não fosse, não teríamos uma relação de ¼ de lavoura para ¾ de pecuária extensiva. Quando a terra se torna atrativa para a produção agrícola (porque a demanda, os preços e as políticas justificam isso), ela se valoriza e tende a transitar da condição de patrimônio para a de capital (terra como meio de produção para a criação de mais valor).

Os 211 milhões de hectares de pastagens são, pelo menos em parte (e uma parte grande), patrimônio que atua fracamente como capital. A média de um boi por hectare revela uma muito baixa produtividade dessa terra. É terra mal empregada, mal aproveitada, e só existe assim porque a pressão dos preços e a ausência de políticas não promovem a transição efetiva da terra patrimônio para a terra capital.

Aqui voltamos para o tema da fronteira agrícola e do desmatamento. Lá na fronteira, que hoje é basicamente a gigantesca área da Amazônia Legal, há atrativos econômicos múltiplos maiores que os atrativos encontrados nos tais 211 milhões de ha de pastos (terra, madeira). Pergunta: onde estão as políticas de estímulo ao melhor uso da imensidão de terra com produção pecuária de tão baixa produtividade? Por que não atrair o investimento para essas áreas criando alternativas mais estimulantes para lavouras e pecuária mais produtivas (produtividade física, por hectare)?

De fato, competir com os atrativos da fronteira não é fácil. Mas o capital vai para onde lhe parece mais atraente. Evidentemente que dificilmente o avanço da fronteira na floresta seria evitado pelo estímulo à re-incorporação das áreas de pastagens a uma nova agricultura (incluindo aí a pecuária), mas isso ajuda. Na fronteira agrícola, na derrubada da floresta, o que falta mesmo é a presença do Estado, que hoje fala e regulamenta muito, mas infelizmente ainda faz muito pouco.

Há área e tecnologia de sobra no Brasil para ampliarmos a produção de produtos agrícolas, sejam estes alimentos ou matérias-primas (inclusive matéria-prima para produção de biocombustíveis). A questão da alta mundial dos preços agrícolas, causada por aumento de demanda por alimentos e por matérias-primas (como o caso do milho nos EUA), mas também por especulação, joga pressão sobre todas as fronteiras agrícolas do planeta.

É preciso entender que há dois tipos de fronteira: a que ainda não foi e a que já foi incorporada à produção. Pois é, no nosso caso, temos uma vasta área pseudo-ocupada pela pecuária que é, na prática, uma fronteira. Uma fronteira a ser re-ocupada, mas desta vez com um uso mais produtivo, sustentável e definitivo. A pressão de demanda por alimentos é uma curva crescente, por vezes inflexionada para baixo, ou para cima. No longo prazo, ela só cessará de crescer quando a população do planeta se estabilizar no tamanho e no acesso generalizado e suficiente de todos os habitantes aos alimentos. Enquanto isso, precisamos usar melhor nosso precioso recurso chamado terra, não apenas maltratado, como também mal aproveitado.

Sergio Salles Filho é pesquisador do Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT) do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp.

 
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