Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 269 - de 11 a 17 de outubro de 2004
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Livro de professora do IEL conta a história do
gênero, desde os seus primórdios até os dias de hoje

Marisa Lajolo põe o
Brasil no mapa do romance

ÁLVARO KASSAB


A professora Marisa Lajolo: "Comparar  literaturas  nacionais umas  com as outras é meio como comparar culinárias  nacionais"A professora Marisa Lajolo, do Departamento de Teoria Literária do Instituto de Estudos da Linguagem da Unicamp (IEL), lançou no último dia 5 o livro Como e por que ler o romance brasileiro (Editora Objetiva). Dividida em sete capítulos, a obra faz um mapeamento didático e cronológico do gênero, que é abordado sob múltiplas perspectivas. “Gostei muito de fazer o livro. Ele me obrigou a tentar uma organização pouco canônica do romance brasileiro. É sempre um exercício intelectual interessante você rearrumar as gavetas que estavam todas arrumadinhas”, revela a docente.

A viagem empreendida por Marisa Lajolo na linha do tempo começa na “poltrona velha e gorda” de sua infância em Santos, onde leu os primeiros livros, passa pelos autores consagrados e chega até a novíssima geração de escritores, entre os quais Ferréz, autor de Capão Pecado e observador atento da periferia paulistana.

Na opinião de Marisa Lajolo, “o romance brasileiro sempre atingiu a qualidade necessária para cumprir sua função de divertir e educar seus leitores”. Na entrevista que segue, a docente fala de literatura, da importância da leitura, de autores contemporâneos e do papel da mídia e da crítica. (A.K.)

Jornal da Unicamp - Como seu livro lida com a questão-título Como e Por que ler o romance brasileiro?

Marisa Lajolo - Mostrando que temos excelentes romances. Neles, simultaneamente nos reconhecemos e nos distanciamos de nós mesmos.

JU - Como nasceu este livro?

Marisa Lajolo - Foi encomendado. É o terceiro volume da coleção Como e por que ler... . O título rende uma dupla homenagem: ao crítico norte-americano Harold Bloom, que escreveu Como e porque ler e a José de Alencar, autor de um delicioso depoimento sobre o ofício de escritor sob o título Como e porque sou romancista.

JU - A linguagem do seu livro foge dos padrões acadêmicos. Sua intenção foi atingir um público mais amplo?

Marisa Lajolo - Com toda certeza. Tento evitar o jargão acadêmico. Nem sei se sou fluente nele ... Pensando melhor, nem sei se existe um jargão acadêmico. De qualquer forma, ele deve ser reservado para quem escreve para os pares. Já eu prefiro fazer livros para os ímpares...

“Os romances de hoje estão à altura de tudo que melhor se fez antes"

JU - O jargão acadêmico afasta o público da leitura?

Marisa Lajolo - Afasta, sem dúvida. A meu ver, um dos grandes equívocos da crítica literária, quando praticada por professores universitários, é falar de literatura como se para entender e discutir livros fosse necessário fazer curso universitário de Letras .

JU - Como a senhora avalia o papel da mídia no incentivo à leitura?

Marisa Lajolo - Literatura - sobretudo a prosa - teve sempre uma face de produto de consumo . Hoje esta face está muito acentuada. Leitura e livros são, cada vez mais, objetos de mercado. A mídia funciona como pólo de difusão de títulos e de autores. Ela cria produtos, avaliza-os , põe certos livros e certos autores em alguns circuitos . Mesmo sem renunciar a estes papéis, a mídia pode também desempenhar uma função educativa.

O projeto do curso de jornalismo científico e cultural da Unicamp, por exemplo, formará profissionais capazes de tratar de ciência e de cultura de uma perspectiva ao mesmo tempo competente , educativa, e atraente

JU - Ao longo da história do gênero, que avaliação a senhora faz da qualidade do romance brasileiro ?

Marisa Lajolo - Acho que o romance brasileiro sempre atingiu a qualidade necessária para cumprir sua função de divertir e educar seus leitores . Não concordo com as teses que postulam a inferioridade de nossa produção cultural. Não se comparam produtos culturais. Comparar literaturas nacionais umas com as outras é meio como comparar culinárias nacionais ...

Também não acho que literatura, cultura e arte tenham uma evolução qualitativa . Entendo que há, digamos assim, um percurso ao longo do qual os perfis das obras vão mudando . Vão mudando, mas não piorando ou melhorando. Não acho que A Moreninha, que é um dos primeiros romances brasileiros, seja pior do que Dom Casmurro. Acho que A Moreninha é o melhor livro possível para os autores e leitores brasileiros de 1844 assim como Dom Casmurro é um dos melhores livros possíveis para os leitores do fim do século 19.

JU - Alguns críticos afirmam que a qualidade da produção literária brasileira das três ou quatro últimas décadas do século 20 fica aquém daquela produzida por nomes como Graciliano Ramos, Guimarães Rosa, Clarice Lispector etc. A senhora concorda?

Marisa Lajolo - Discordo completamente. Acho que os romances brasileiros de hoje estão à altura de tudo que melhor se fez antes deles. Temos grandes autores e grandes obras do final do século 20 e do começo do século 21. É equivocada essa idéia de que quanto mais contemporâneos os romances, piores eles são. Os críticos é que talvez se sintam inseguros para falar da contemporaneidade.

JU - A senhora poderia citar autores que hoje se destacam?

Marisa Lajolo - Luis Ruffato , Ana Miranda , Assis Brasil , Roberto Gomes, Ferréz, Ignácio Loyola Brandão, Ana Maria Machado , Moacir Scliar. O time é bom, e não cabe no espacinho deste ping-pong, que acaba por me deixar mal com muita gente !

JU - A senhora vem se dedicando ao projeto Memória de Leitura. Qual a importância da leitura num país como o Brasil?

Marisa Lajolo - Uma formação mais qualificada de leitores é importante em todo o mundo , não só no Brasil. A leitura está em pauta . Todos esses testes internacionais avaliando proficiência em leitura, são ponto de chegada e ponto de partida de políticas educacionais e culturais que dão à leitura e à escrita papel central na sociedade contemporânea.

JU - Qual o papel da universidade nesse contexto?

Marisa Lajolo - É fundamental. A universidade forma professores, e os professores formam leitores. A universidade não pode omitir-se relativamente a isso : ela tanto precisa formar professores, como produzir as pesquisas necessárias para formar educadores qualificados e competentes.

“Leitura e livros são, cada vez mais, objetos de mercado”

JU - E a importância da internet?

Marisa Lajolo - Acho que a Internet facilita a vida dos leitores. Dos professores, com toda a certeza. Estou dando neste semestre, por exemplo, um curso de literatura colonial brasileira, e muitos textos de que preciso estão na internet. A internet, neste aspecto , permite ao professor esperar alunos mais ativos , independentes de reserva de livros na biblioteca, e - sobretudo- independentes da lamentável instituição do xerox. A internet também facilita muito a circulação de autores jovens, obras literárias , além de permitir a criação de fóruns. Trata-se de um espaço bom de leitura e de escrita.

JU - Temos no Brasil grupos regionais que trabalham a literatura de uma maneira muito peculiar. Como a senhora avalia esses agrupamentos?

Marisa Lajolo - Acho que há uma tendência dupla. De um lado, um movimento forte centralização através da concentração editorial e de capital internacional (vale a pena salientar aqui as recentes vendas de editoras brasileiras para grupos internacionais ). De outro, movimento oposto: uma espécie de fragmentação da produção e da circulação literária. Criam-se grupos de escritores ( e de leitores...) de diferentes fatores identitários: identidade regional, temática por faixa etária ... Mas não acho que este movimento seja marca de nosso tempo . Acho que sempre foi mais ou menos assim, que a literatura sempre teve essas múltiplas faces. Elas coexistem bem, o que considero muito interessante.

SERVIÇO

Título: Como e por que ler o romance brasileiro

Autora: Marisa Lajolo

Páginas: 174

Editora: Objetiva

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