Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 310 - de 28 de novembro a 4 de dezembro de 2005
Leia nesta edição
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O tamanho do preconceito
DIU
Rabiscos na França
Produção de fármacos
Bacia do Piçarrão
Utopia e Renascimento
Nas bancas
Mortadela e salsicha de tilápia
Ecologia: teoria deve se
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Pesquisa revela degradação ambiental e exclusão social na bacia do Piçarrão


CARMO GALLO NETTO



Sérgio Henrique Vannucchi Leme de Mattos, autor do estudo: "Deterioração é a mesma que a de grandes centros urbanos brasileiros" (Foto: Antoninho Perri)Avaliação da qualidade ambiental da bacia do Picarrão, em Campinas, revela as conseqüências de um modo de urbanização regida por interesses econômicos em detrimento do bem-estar coletivo. O processo gera e reforça desigualdade e exclusão sociais, que têm reflexos na segregação sócio-espacial e nas vulnerabilidades diferenciadas em relação aos riscos naturais, além de degradar o meio físico-natural. Essas conclusões fazem parte da dissertação de mestrado apresentada por Sérgio Henrique Vannucchi Leme de Mattos, ao Departamento de Geografia do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp, orientada pelo professor Archimedes Perez Filho.

Área da nascente é a mais urbanizada

Essa forma de urbanização gerou, nas unidades ambientais em que pode ser dividida a bacia do Piçarrão, em situações extremas: de um lado, a saturação da capacidade de sustentação do subsistema físico-ambiental nas áreas em que este favorece a ocupação urbana – situação provocada principalmente pela impermeabilização elevada do solo e alta concentração ambiental; de outro lado, revelam-se áreas de maior fragilidade natural que tendem a serem ocupadas preferencialmente pela população socialmente excluída e mais vulnerável aos riscos ambientais – resultando uma dinâmica em que baixa qualidade de vida e baixa qualidade ambiental se reforçam mutuamente.

Sergio Mattos diz que “essa situação não é exclusiva da bacia do Piçarrão, mas retrata o processo que orienta a urbanização do município de Campinas e que se repete em outros grandes centros urbanos brasileiros”. E acrescenta: “É na superação desse quadro que reside o grande desafio, mas também a maior esperança, do paradigma de sustentabilidade do ambiente urbano”. O pesquisador esclarece que modernamente a utilização de indicadores constitui uma das formas de mostrar os limites e possibilidades do ambiente urbano, que constitui um sistema complexo. E, para tanto, considera que deve ser evitado o erro, bastante difundido na política de vários setores, de tomar os indicadores como uma realidade em si mesma. O pesquisador enfatiza que esse procedimento metodológico deve ser empregado com objetivos utilitários: o de auxiliar no planejamento e na tomada de decisões, apontando para os principais processos que atuam em determinado sistema.

Indicadores – O Piçarrão nasce no leste da cidade, pelos lados do Cemitério da Saudade, próximo à divisa de Campinas e Valinhos, deságua no Capivari, na região sudeste, atravessa uma das regiões mais urbanizadas da cidade e o seu sentido corresponde ao principal vetor de expansão urbana de Campinas, que aponta da alta para a baixa bacia. Por essas razões, Sérgio Mattos considera que o estudo do que ocorre ao longo do Piçarrão e afluentes constitui exemplo emblemático do tipo de urbanização que acontece em Campinas e em outros grandes centros urbanos.

O pesquisador constata que a área da nascente do Piçarrão é a mais urbanizada e cheia de casas até o médio curso e lá se constituíram os primeiros núcleos urbanos (Vila Industrial, Vila Teixeira, São Bernardo). Com a expansão da população fruto da especulação imobiliária, outros núcleos isolados e distantes daqueles surgiram (Jardim Florence, Jardim Cosmo), levando à valorização dessas novas terras ocupadas e das situadas no caminho ou nas suas adjacências. Para ele, esse tipo de desenvolvimento é típico de países subdesenvolvidos. A especulação imobiliária conduz a um processo de periferização porque a infra-estrutura é levada para essas regiões periféricas e valoriza novas áreas com a chegada de água, luz e transporte. O processo de urbanização, não planejado pelo município, sofre a agravante dos loteamentos clandestinos e atende interesses privados.

O trabalho foi desenvolvido com base em indicadores de qualidade ambiental que permitem avaliar um modelo sustentável de desenvolvimento urbano. E o autor esclarece que “a concepção utilizada na pesquisa é a de que o meio ambiente resulta da interação da sociedade com a natureza e que essa bacia hidrográfica constitui um sistema ambiental resultante da interação entre o subsistema socioeconômico e o subsistema natural. Então os indicadores devem levar em consideração as condições de vida dessas populações e do meio físico natural”.

Sérgio Mattos explica que no trabalho utilizou um conjunto de indicadores de qualidade ambiental da metodologia denominada “Pressão-Estado-Resposta” (PER), devidamente adaptada. Os indicadores de pressão referem-se às fontes de perturbação de origem antrópica, relacionadas à ação do homem, que afetam o sistema, como densidade demográfica, condições de moradia e serviço de coleta domiciliar de lixo. Os indicadores de estado mostram a organização atual do sistema ambiental como relevo, quantidade de córregos, impermeabilidade e cobertura vegetal do solo, e renda dos responsáveis pelo domicílio. Os indicadores de resposta refletem reações da sociedade frente às perturbações por eles produzidas na tentativa de manter a estabilidade do sistema ou de se ajustar às novas condições, como participação na definição das prioridades do orçamento participativo e diretrizes definidas pelo plano diretor de Campinas.