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Pesquisa da FCM revela que herpes
potencializa risco de hipertiroidismo

Estudo decorrente de tese de doutorado
rende prêmio nos EUA e publicação de artigos

EDIMILSON MONTALTI
Especial para o JU

Janaína Luisa Leite, autora de tese que originou a investigação: troca de informações com pesquisadores da Holanda e da Letônia (Fotos: Antoninho Perri)
Pesquisadores do Laboratório de Genética Molecular do Câncer (Gemoca) da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) da Unicamp descobriram indícios da potencialização do risco para o desenvolvimento de hipertiroidismo causado pela doença de Graves a partir da infecção por herpes-vírus. O trabalho foi enviado para publicação no Clinical Endocrinology. A pesquisa é decorrente da continuação do trabalho de doutorado “Agentes virais e a predisposição para doenças neoplásicas e autoimunes”, da bióloga Janaína Luisa Leite.

A descoberta rendeu ao grupo o prêmio Top Five da HHV-6 Foundation, durante a 6ª Conferência Internacional sobre HHV-6 e 7, realizada em Baltimore, nos Estados Unidos, um artigo on-line para a Revista da Sociedad Iberoamericana de Información Científica e um capítulo de livro Herpesviridae: Viral Structure, Life Cycle and Infections sobre herpes-vírus, para a editora Nova Publisher. O trabalho contou com a colaboração de Natássia Elena Búfalo, Elaine Cristina Morari, Ana Carolina Trindade Guilhen e Roberto Bernardo dos Santos. A coordenação da pesquisa é da médica endocrinologista e responsável pelo Gemoca, Laura Sterian Ward.

A relação entre vírus e doenças humanas vai muito além dos quadros infecciosos desencadeados por eles. Já são bem conhecidos vários tumores induzidos ou associados a vírus, como o Sarcoma de Kaposi, presente em pacientes com HIV, e o câncer de colo de útero, que aparece em mulheres com papiloma vírus. Entretanto, a relação dos vírus com doenças autoimunes é menos conhecida.

A doença de Graves é uma doença autoimune específica da glândula tireóide, caracterizada pela produção de anticorpos que elevam a produção de hormônios e desencadeiam o hipertiroidismo ou bócio. De acordo com dados da literatura internacional, a doença de Graves atinge cerca de 0,5% da população mundial, na proporção de nove mulheres para cada homem, e pode ser desencadeada por fatores ambientais associados a uma predisposição hereditária.

Em 2006, num congresso em Barcelona, na Espanha, durante a apresentação de um trabalho sobre herpes-vírus 6 e 7 em pacientes imunossuprimidos transplantados renais do ambulatório de nefrologia do Hospital de Clínicas (HC) da Unicamp, Janaína conheceu a pesquisadora Mora Murovska, do Instituto de Microbiologia e Virologia da Universidade de Riga, na Letônia, que estava pesquisando o mesmo vírus em pacientes com doença de Hashimoto, que causa o hipotiroidismo.

“Ela encontrou uma alta prevalência do herpes-vírus nesses pacientes. Assim como a doença de Graves, a doença de Hashimoto também é uma doença autoimune da tireóide. Tivemos então a ideia de estudar os herpes-vírus em pacientes brasileiros com Graves”, explicou Janaína.

Para tanto, foram estudados 127 pacientes portadores de doença de Graves confirmados por diagnósticos clínicos e pela realização de testes de dosagem de anticorpos no ambulatório da PUC-Campinas. Esses pacientes foram comparados com 150 indivíduos saudáveis pareados por sexo, idade e condições de exposição ambiental.

Natássia Elena Búfalo, integrante do grupo de pesquisadores: “Trata-se de uma associação bastante relevante” (Fotos: Antoninho Perri)Outros pesquisadores, anteriormente, já haviam encontrado o herpes-vírus 6 em diferentes órgãos como estômago, intestino, fígado e pâncreas e em glândulas, entre as quais a tiróide. Os pesquisadores do Gemoca descobriram um aumento de 21% na incidência de herpes-vírus 6 em pacientes portadores da doença de Graves, sugerindo que esses indivíduos tinham um aumento de risco para desenvolver a doença de Graves duas vezes maior que em indivíduos saudáveis.

Apesar de os resultados encontrados pelos pesquisadores demonstrarem essa associação, era necessário aprofundar essa teoria. Os pesquisadores do Gemoca estabeleceram, então, contato com o professor e pesquisador Wilmar Wiersinga, do Departamento de Endocrinologia e Metabolismo do Centro Médico Acadêmico da Universidade de Amsterdã, na Holanda, que cedeu amostra de DNA de seus pacientes. Comparando com as amostras brasileiras, os pesquisadores verificaram que os pacientes holandeses com doença de Graves também tinham uma grande incidência de herpes-vírus, no entanto, em proporção muito menor que os brasileiros.

A primeira hipótese a que os pesquisadores chegaram foi com relação à questão da higiene. Pelo fato de, no Brasil, a população ter mais contato com agentes infecciosos, ela produziria mais anticorpos que as pessoas que moram na Holanda.

“Verificamos que há de fato uma maior produção de anticorpos contra herpes-vírus nos pacientes com doença de Graves daqui em relação à Holanda. Portanto, concluímos que estava havendo uma reação cruzada, pelo fato dos anticorpos contra herpes-vírus e os anticorpos da doença de Graves serem semelhantes. É o que chamamos de mimetismo molecular. Como os anticorpos são semelhantes, ocorre, então, uma potencialização da doença de Graves”, explicou Janaína.

A doença de Graves, de acordo com a bióloga Natássia Búfalo, não tem cura. “Você controla e ameniza os sintomas com as drogas antitireoidianas, ou remove a glândula tireóide, ou ainda a destrói com radiodo”, explicou, observando que a utilização de antivirais para o combate ao herpes-vírus parece ser uma boa alternativa para esses pacientes.

O estudo, de acordo com Janaína, abre a possibilidade para um novo tratamento destinado aos pacientes com doença de Graves. O médico, ao verificar a doença, pode pedir um exame para o herpes- vírus. Ao constatar a presença do vírus, a indicação é tratar primeiro o herpes-vírus e depois entrar com o tratamento para a doença de Graves.

Para o estudo do mecanismo de como a ação dos anticorpos do herpes-vírus potencializa a doença de Graves, Janaína disse que seria necessário cultivar o vírus in vitro e, depois, transpô-los para um modelo animal. “Para isso, seria necessário estabelecer parcerias com outros laboratórios da Unicamp que estudam esse tipo de vírus ou até mesmo no exterior”, comentou a pesquisadora.

Precedentes
A descoberta da correlação entre o herpes vírus 6 e a doença de Graves abriu, para os pesquisadores do Gemoca, outra frente de pesquisa que caminhou paralela e complementariamente à primeira: o estudo da correlação com o gene TP53, que é um supressor tumoral que atua no reparo do DNA da célula e evita o crescimento de tumores. Os pesquisadores se debruçaram sobre um polimorfismo desse gene em pacientes infectados pelo herpes 6 e 7 com doença de Graves. Há três variantes para esse polimorfismo: a normal ou selvagem e a heterozigoto e homozigoto.

“Nós encontramos uma relação entre os herpes-vírus e as variantes em heterozigose e em homozigose desse polimorfismo do gene, mostrando uma maior suscetibilidade à doença de Graves quando esses pacientes estão infectados pelo herpes-vírus. Trata-se de uma associação bastante relevante que, até então, não se conhecia na população brasileira”, explicou Natássia.

“A importância dessa descoberta está na possibilidade de uma vacina que, eventualmente, poderá diminuir a incidência da doença de Graves”, comentou a coordenadora do Gemoca, a médica endocrinologista Laura Sterian Ward.

O próximo passo desse trabalho será correlacionar os fatores ambientais, como exposição solar, fumo, produtos químicos, com fatores biológicos (vírus) e fatores genéticos.

“Com essa perspectiva, fechamos todo o projeto. Daqui para frente, pretendo pesquisar o herpes-vírus 8 e a sua relação com o câncer, que é uma outra linha de pesquisa aqui do Gemoca”, explicou Janaína.

 

O que é herpes-vírus

O herpes-vírus é uma classe de vírus que possui oito subtipos. O mais comum é o subtipo 1, conhecido apenas por herpes. Ele infecta a pele e os neurônios da raiz dos gânglios dorsais onde fica latente por toda vida.

É responsável pelo herpes genital e orofacial. O subtipo 1 é, normalmente, adquirido na infância. A transmissão pode ser via placenta, leite materno ou pela saliva. Os primeiros sintomas são o rash cutâneo, também conhecido por roséola.

O herpes vírus tem a capacidade de se integrar ao genoma humano e ficar latente dentro do hospedeiro.
Quando o indivíduo tem uma baixa na imunidade, adquire uma infecção ou sofre um transplante, fica mais suscetível a certas doenças e, então, o herpes pode se manifestar.

O herpes-vírus do subtipo 6 foi isolado, primeiramente, em 1986 em células mononucleares de sangue periférico de pacientes com doenças linfoproliferativas. Possui uma alta incidência na população mundial e, geralmente, é a causa de infecções virais em pacientes imunossuprimidos.

O herpes-vírus do subtipo 7 foi primeiramente isolado a partir de células T CD4+ estimuladas de indivíduos saudáveis e, posteriormente, foi isolado a partir de pacientes com síndrome da fadiga crônica. Estudos epidemiológicos mostraram que esse tipo de herpes-vírus é amplamente distribuído na população e a infecção ocorre precocemente também na infância.

 

Glossário

Alelo – Um alelo é cada uma das várias formas alternativas do mesmo gene. Por exemplo, o gene que determina a cor da flor em várias espécies de plantas - um único gene controla a cor das pétalas, podendo haver diferentes versões desse mesmo gene. Uma dessas versões pode resultar em pétalas vermelhas, enquanto outra versão originará pétalas brancas.

Homozigoto – É um termo da genética para indicar que os alelos presentes em um gene são idênticos.

Heterozigoto – Em genética, chama-se heterozigoto ou heterozigótico o indivíduo que possui os dois alelos diferentes do mesmo gene.

Polimorfismo – Mutação do DNA.

 

 


 
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