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As faces da violência na América Latina
Livro aponta tipos e índices de violência e
coloca o Brasil atrás apenas de Bolívia e Guatemala

CARLOS TIDEI

Paradoxal – assim como a própria definição filosófica de paz, que se
traduz pela ausência de seu antônimo, a violência –, a solução para reduzir a criminalidade e o sofrimento da população da América Latina passa necessariamente pelo desenvolvimento social e econômico, embora o modelo vigente aumente a concentração de riqueza e agrave as diferenças causadoras de problemas da região.

Segundo Jorge Brovetto, secretário executivo da Associação de Universidades Grupo Montevidéu (AUGM), que assina o prólogo do livro “O Estado da Paz e a Evolução da Violência – A situação da América Latina”, traduzido pela Editora da Unicamp, a região carrega o triste privilégio de apresentar as maiores desigualdades sociais e econômicas do mundo. A publicação original é do Centro Internacional de Investigação e Informação para a Paz (CIIIP/UPAZ).

O livro tem a pretensão de servir como um instrumento para ajudar a promover a paz, por meio de pesquisas e outras informações úteis que revelam os diversos tipos de violência: onde, quando e em que grau de incidência ela ocorre em diversos países da América Latina. Os pesquisadores partem de análises setoriais e classificam os países em um índice final de violência global. Brasil, Bolívia e Guatemala figuram no topo desta classificação.

“Desarrojo” (desenvolvimento), repete exaustivamente Brovetto, apontando a solução para a maioria dos casos de violência. “Este é o primeiro passo de um grande projeto que pretende ampliar os estudos sobre a violência, e futuramente apontar soluções para a busca da paz no mundo. Identificamos e apontamos onde está a violência, as ações de combate podem seguir esse caminho”, diz. O livro é destinado a profissionais especialistas, que podem utilizar as informações para desenvolver ações de promoção da paz, e também para o público em geral, à medida que a violência é a maior preocupação de nosso tempo.

“A continuação desta obra precisa ser considerada indispensável. Pensamos em trabalhar sobre mais indicadores, dentro do objetivo de fornecer uma resposta crítica a essa primeira apresentação, com propostas concretas de desenvolvimento humano”, antecipa. “Vamos demonstrar a existência e onde se dá a violência. As soluções devem ser encontradas pelos governantes”, esclarece.

Conceitos – Os conceitos de paz e violência sofrem contínuo processo de mudança, assim como mudam o tipo e a natureza dos conflitos e o grau de visibilidade. A paz já foi entendida como ausência de guerra, ou a conjunção de vários “Ds”: desenvolvimento, direitos humanos, democracia e desarmamento. A ausência de um deles resulta em fator de violência.
Este conceito evoluiu seguindo a dinâmica dos conflitos e, para caracterizar a paz, é necessário definir a violência e suas diversas dimensões, entre as quais se destacam as violências militar, cultural, estrutural, política, étnica, de gênero, a do Estado e a da sociedade do tipo anômico (sem normas).

A conceituação básica de violência está na diferença entre realização e potencialidade, ou seja, segundo definição de Galtung: “A violência está presente quando os seres humanos são persuadidos de tal modo que suas realizações efetivas, somáticas e mentais, ficam abaixo de suas realizações potenciais”.

A paz seria a identificação e a resolução favorável de fenômenos caracterizados por algum tipo de violência. No entanto, Galtung distingue duas grandes categorias: a paz negativa e a paz positiva. A primeira é relacionada à violência direta e pessoal, visível como a guerra; a segunda refere-se à violência indireta, estrutural, nem sempre visível. Se a paz negativa reside na ausência de guerra, a paz positiva existe quando há justiça social, harmonia, satisfação das necessidades básicas, autonomia, diálogo, solidariedade, integração e igualdade.

É justamente na violência estrutural que reside a maior dificuldade para sua identificação, pois muitas vezes ela está camuflada por mecanismos de acobertamento e dominação. É o grau de visibilidade que permite distinguir os tipos de violência e, neste aspecto, a manifestação de descontentamento de grupos sociais contemporâneos, como minorias discriminadas, contribui para que o conceito de visibilidade ganhe destaque.

Dessa forma, o conceito de paz pode ser entendido como “a capacidade de uma sociedade de tornar visível e resolver favoravelmente os tipos de violência nela existentes”. “Políticas econômicas e sociais que colocam em risco a saúde, educação e emprego de amplos setores da população são também formas de violência, à medida que impedem a plena realização intelectual e física das pessoas”, esclarece Brovetto.

Classificação – As pesquisas do CIIIP classificam cinco tipos de violência: coletiva, estatal, estrutural, cultural e individual, com destaque para a independência teórica entre os tipos. Um caso clássico é a pobreza, tratada como geradora de violência direta ou indireta, sem que os estudos contemporâneos revelem evidência nessa direção. Medellin, por exemplo, é a cidade mais violenta da Colômbia e tem 100% dos serviços básicos supridos, enquanto Quibdó, o município menos violento daquele mesmo país, é a mais carente desses serviços.

O fim da Guerra Fria e de grandes guerras entre países provocou uma mudança qualitativa nos conflitos, que não devem ser subestimados. Em lugar da bipolarização entre Oriente e Ocidente, são consideradas causas dos conflitos modernos a etnia, religião, identidade e outras formas de identificação social, além da globalização e a dominação por blocos econômicos poderosos. A escassez de produtos naturais ampliará os conflitos. E a degradação do meio ambiente é a forma de violência global mais em evidência atualmente.

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Continua...

 

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