Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 240 - de 8 a 23 de dezembro de 2003
Leia nessa edição
Capa
Artigo: crer ou não crer
HC: hospital terciário
Do ofício à experiência
C&T: qualidade de vida
Pesquisa: destilador molecular
Discussão: tecnociência
Cooperunicamp: estímulo
Altec: unicamp é destaque
Estudo: maturação sexual
Painel da semana
Oportunidades
Teses da semana
Idosos: retratos da velhice
Sensoriamento remoto
 


 

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HC reafirma vocação
de hospital terciário
Atendimento no PS será reorganizado e ambulatórios vão priorizar casos de maior complexidade

CLAYTON LEVY

Gastão Wagner de Souza, secretário executivo do Ministério da Saúde: atendimento especializado

A partir de janeiro de 2004 a Unicamp iniciará a implantação de um plano para readequar o Hospital de Clínicas (HC) à sua verdadeira vocação, que é a de hospital terciário e quaternário. A proposta, que já foi discutida com a Divisão Regional de Saúde (DIR12), ligada à Secretaria de Estado da Saúde, e com os conselhos municipais de saúde na região, prevê, entre outras medidas, a reorganização do atendimento no pronto-socorro e nos ambulatórios, que passarão a dar prioridade aos casos referenciados de maior complexidade.

Para isso, o antigo setor de pronto-socorro passará a ser chamado de Unidade de Emergência Referenciada (UER) cujo principal objetivo será atender pacientes graves. Todo encaminhamento à UEF será feito através de contato telefônico pelos sistemas de resgate ou pela Central Reguladora de Vagas da DIR12 e da prefeitura. O mesmo procedimento deverá ser observado para as consultas ambulatoriais. O HC também destinará 18% dos leitos das especialidades para procedimentos considerados estratégicos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), como transplantes, cirurgias de epilepsia e implante coclear, entre outros. Os leitos de UTI, retaguarda do UER e oncologia ficaram fora destas modificações.

O plano foi discutido por um grupo de trabalho formado por 19 integrantes da área de saúde, incluindo docentes, estudantes e profissionais que respondem pelos diversos departamentos do HC. Segundo o grupo, as mudanças têm como principal objetivo preservar o papel do hospital no sistema regionalizado e hierarquizado, instituído pelo governo federal. “A nossa proposta é que o hospital universitário seja um espaço de atendimento especializado, como transplantes e tratamento do câncer, bem como de pesquisa, ensino, residência e pós-graduação”, disse em recente entrevista ao Jornal da Unicamp o secretário executivo Ministério da Saúde e ex-secretário municipal de saúde, Gastão Wagner de Souza.

Isso não significa, porém, que a Unicamp deixará de fazer atendimento primário e secundário na rede pública. Segundo a diretora da Faculdade de Ciências Médicas, Lilian Tereza Lavras Costallat, que integrou o grupo de trabalho, esse atendimento continuará ocorrendo como parte da formação dos alunos de graduação e residência. “A diferença é que eles passarão a atuar com mais intensidade nas unidades básicas de saúde (UBS) e nos hospitais secundários da rede pública, onde são inseridos desde cedo como parte do currículo”, explica.

“Com essa mudança, a população será atendida nas unidades adequadas aos níveis de complexidade dos casos”, diz o diretor da DIR12, Sergio Grecco. Segundo ele, o plano deverá desafogar o sistema e melhorar a qualidade no atendimento regional.

“Os municípios da região já estão equipados para oferecer atendimento primário e secundário”, garante. Grecco classificou o caso específico de Campinas como “privilegiado”. De acordo com ele, a rede municipal dispõe de técnicos de alta qualidade, equipamentos modernos e unidades bem estruturadas. “O município é capaz de atender facilmente à demanda que chega à Unicamp sem estar referenciada para procedimentos mais complexos”, diz.

O diretor da DIR acredita que a readequação do HC à sua vocação original deverá gerar um impacto positivo em todo o sistema. “O que está sendo feito chama-se educação em saúde”, afirma. Segundo ele, na medida em que o sistema é organizado, pode-se racionalizar os recursos e elevar a qualidade do atendimento. “A Unicamp não está fazendo isso sozinha; é um trabalho integrado com a DIR e as prefeituras”, observa.

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Ensino terá impacto positivo

Lilian Tereza Lavras Costallat, diretora da FCM: discussão começou na academia

A diretora da Faculdade de Ciências Médicas, Lilian Tereza Lavras Costallat, diz que o plano de readequação no atendimento do HC da Unicamp deverá gerar um impacto positivo na formação dos estudantes de medicina. “A redução de pacientes primários é boa para o ensino porque permitirá aos alunos mais tempo para acompanhar os casos que chegam ao hospital”, diz. Além disso, segundo a diretora, os estudantes também continuarão em contato com pacientes primários e secundários, só que nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) e nas unidades intermediárias, como o Hospital Estadual de Sumaré.

“A vantagem é que o médico se formará compreendendo os diferentes papéis das unidades que integram o SUS em cada nível de complexidade”, explica. Lilian. Segundo ela, o contato dos estudantes com pacientes primários será garantido por uma parceria com a administração municipal de Campinas, que garante o acesso deles às UBS. “A própria FCM custeou a reforma de várias UBS para poderem acolher os alunos de graduação e residentes do HC”, conta.

A diretora lembra, ainda, que o grupo de trabalho que elaborou o plano de readequação contou com a presença de representantes da Comissão de Ensino e Graduação, Comissão de Residência Médica, e representante dos alunos de graduação. “É importante destacar que essa discussão começou na academia”, afirma.

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Os números de uma distorção cultural

Ivan Toro, superintendente do Hospital das Clínicas: meta é reduzir déficit mensal

Outra meta do plano, segundo o grupo de trabalho, é reduzir o déficit mensal do HC, da ordem de R$ 450 mil. De acordo com o superintendente do hospital, Ivan Toro, o prejuízo é em parte causado por procedimentos que o hospital realiza, mas que não são remunerados pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Toro diz que boa parte desse atendimento resulta da demanda espontânea de pacientes que, em muitos casos, segundo ele, deveriam ser atendidos em unidades de nível secundário ou primário da rede pública. Para ele, trata-se de uma distorção cultural que se consolidou nos últimos anos em razão da falta de informação sobre o princípio de hierarquização que rege o sistema de saúde.

Essa distorção fica evidente, por exemplo, quando são examinados os números do pronto-socorro. O grupo de trabalho que elaborou o plano de adequação constatou que dos 350 pacientes que todos os dias recorrem ao pronto atendimento do HC, 80% chegam espontaneamente, ou seja, sem encaminhamento médico. Pela avaliação dos diagnósticos de procura, observou-se que apenas 20% dos pacientes caracterizam casos graves e portanto deveriam ser assistidos pela Unicamp. Do total de pessoas atendidas, 70% são procedentes de Campinas, 20% de Sumaré e Hortolândia, e os 10% restantes vêm de outros municípios.

Toro diz que esse quadro gera impactos negativos em várias frentes. Em outubro desse ano, por exemplo, o custo dos atendimentos no pronto-socorro chegou a R$ 657 mil enquanto a remuneração do SUS cobriu apenas R$ 122,5 mil. Segundo o superintendente, isso ocorre porque o SUS, pela pactuação do sistema, remunera a Unicamp apenas pelos casos de alta e média complexidade. “Como temos uma demanda batendo à porta, acabamos atendendo”, diz. “Com isso, atendemos a um excedente pelo qual não temos contrato”, destaca.

O superintendente explica que o pacto com o SUS estabelece um teto anual de R$ 85 milhões, mas os gastos efetivos chegam a R$ 230 milhões. Mensalmente, o SUS destina à Unicamp R$ 7 milhões. Esse dinheiro, porém, é dividido entre as demais unidades de saúde da Unicamp, como Gastrocentro, Hemocentro e Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism). Com isso, sobram para o HC R$ 3,5 milhões, que são insuficientes para cobrir todos os gastos.

Segundo Toro, em setembro os gastos superaram o teto em R$ 900 mil e, em outubro, o déficit chegou a R$ 400 mil. Só com tomografias o prejuízo chega a cerca de R$ 50 mil por mês. “Pelo teto, podemos realizar 600 tomografias mensais, mas na prática acabamos fazendo mais de mil”, exemplifica.

A readequação do atendimento, segundo Toro, permitirá corrigir estas distorções, fazendo com que o HC retome o seu papel de hospital terciário. Outra vantagem, segundo o superintendente, será a ampliação no atendimento aos casos considerados estratégicos pelo SUS, como transplantes de órgãos, cirurgias de epilepsia e implante coclear, entre outros. Por serem considerados estratégicos e de alta complexidade, estes procedimentos contam com verbas extra-teto garantidas pelo Ministério da Saúde independente de sua quantidade.

A médio prazo, diz Toro, o HC Unicamp terá, com as mudanças, melhores condições de participar da regionalização, hierarquização da demanda e equidade no atendimento, cumprindo o papel esperado pela academia e pela população , na direção de um Sistema Único de Saúde melhor.

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Atendimento básico é responsabilidade do município

Paulo Eduardo,
pró-reitor de Desenvolvimento Universitário: a porta de entrada do sistema não deve ser o hospital

A política que direciona as ações do Sistema Único de Saúde (SUS) atribui aos municípios a responsabilidade pelo atendimento básico de saúde. Para isso, o governo federal instituiu o Piso de Atenção Básica (PAB), através do qual as prefeituras recebem mensalmente 1 real por habitante, a fim de garantirem os procedimentos fundamentais na rede primária. Campinas, com cerca de um milhão de habitantes, recebe anualmente R$ 12 milhões para oferecer esse atendimento.
Além do PAB, os municípios também podem fazer ações mais complexas, dependendo de sua estrutura. “Através do modelo de gestão plena, a prefeitura recebe por aquilo que se propõe a fazer”, explica o pró-reitor de Desenvolvimento Universitário e ex-superintendente do HC, Paulo Eduardo Moreira Rodrigues da Silva. “O município está credenciado e tem autonomia para gerir o sistema controlado pelo seu conselho municipal de saúde”, completa.

Em razão dessa política, há cinco anos os hospitais universitários de perfil terciário, a exemplo do HC da Unicamp, deixaram de receber verbas federais para o atendimento primário, a fim de centrar seu foco nos casos mais complexos, que não podem ser atendidos nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) ou hospitais secundários. “Isso significa que a porta de entrada do sistema não é o hospital, e muito menos o hospital terciário”, diz o pró-reitor.

O pró-reitor explica que a porta de entrada do sistema é sempre uma UBS. “Quando se trata de um caso de emergência, o paciente deve ser levado para uma unidade de pronto atendimento”, diz. Segundo ele, o sistema também funciona na horizontal, permitindo que pacientes de uma determinada cidade sem hospital secundário sejam atendidos em municípios vizinhos que disponham dessa estrutura, em vez de serem levados ao hospital terciário.

“Alguns municípios fazem isso, mas outros, acabam buscando outras maneiras de atender o paciente, como oferecer o transporte para levá-lo ao hospital terciário”, diz Rodrigues da Silva. De outras vezes, segundo o pró-reitor, o município faz a sua parte, mas os moradores acabam se dirigindo espontaneamente ao hospital terciário quando poderiam ser atendidos numa UBS próxima à sua casa. “O pronto atendimento referenciado tem como objetivo direcionar para o lugar certo essa demanda espontânea”, explica.

O paciente só poderia ser encaminhado ao pronto atendimento com a garantia de que o hospital terá vaga para interná-lo em seguida. “Quando o paciente chega sem essa referência, ocorre uma sobrecarga na capacidade de atendimento do hospital”. Segundo Rodrigues da Silva, o plano de readequação do HC só não foi implementado antes porque as prefeituras não estavam dotadas da estrutura necessária. “Agora elas estão e precisam fazer pelo menos o atendimento básico”, conclui.

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