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Em busca do espumante inteiramente nacional
Pesquisadora consegue isolar duas leveduras que poderiam ser usadas na fermentação e produção de vinho

MANUEL ALVES FILHO

A pesquisadora Maria Eugênia de Oliveira Mamede: análise de aproximadamente 300 microorganismo

Quando o brasileiro pede um vinho espumante nacional para acompanhar a refeição, ele não faz idéia de que toda a tecnologia usada para a produção da bebida é importada. Sem ela, a qualidade do produto certamente seria muito inferior, o que reduziria o prazer à mesa. O primeiro passo para tentar colocar fim a essa dependência tecnológica acaba de ser dado por uma pesquisadora da Unicamp.

Estudo desenvolvido para a tese de doutorado de Maria Eugênia de Oliveira Mamede, defendida junto à Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA), isolou dois microorganismos presentes nas uvas produzidas na região da Serra Gaúcha. Por meio de análises sensoriais, a especialista verificou que o aroma gerado por essas leveduras durante a fermentação era de excelente qualidade e apresentava forte semelhança ao do vinho espumante presente no mercado.

O estudo de Maria Eugênia é o resultado de um esforço científico numa área em que o Brasil tem pouca tradição. As leveduras isoladas por ela são da região Sul do País, portanto próprias de um ecossistema natural e que poderiam ser utilizadas para a fermentação e produção de vinho. Na prática, porém, isso não acontece. “As leveduras utilizadas para a produção do vinho brasileiro são importadas e atendem às necessidades de produção de vinhos com características desejáveis para os países que as comercializam”, diz. O que se faz atualmente, conforme a pesquisadora, é uma adaptação do uso dessas leveduras para a fabricação da bebida nacional.

A autora da tese analisou aproximadamente 300 microorganismos para chegar a duas leveduras (Pichia membranaefaciens e Kloeckera apiculata). Inicialmente, Maria Eugênia tomou um meio sintético, composto por nitrogênio e açúcar, e inoculou separadamente cada um dos 300 microorganismos. O objetivo era identificar quais leveduras produziam o aroma frutal, floral e doce, com intensidade de média para forte, conforme escala sensorial utilizada. A análise sensorial foi feita junto aos próprios alunos da FEA. Foram selecionadas inicialmente quatro leveduras com base nas características de produção do aroma desejado. Estas foram posteriormente inoculadas em um mosto de uva (suco) destinado à produção de vinho espumante, cedido por uma vinícola do Rio Grande do Sul.

Após sete dias de fermentação, a pesquisadora promoveu uma análise de aceitação junto a 25 consumidores de vinho espumante. A meta era checar se o aroma produzido pelas leveduras brasileiras era semelhante ao das bebidas industrializadas. Duas delas proporcionaram o resultado desejado. “Nós registramos a intenção de compra do produto (mosto fermentado), caso ele fosse colocado no mercado. Cerca de 32% das pessoas afirmaram que provavelmente comprariam e 16% certamente comprariam um vinho com aquele aroma. A linhagem usual de leveduras não teve melhor aceitação por parte desse público”, afirma Maria Eugênia.

De acordo com ela, todo o experimento foi realizado em escala laboratorial. A transferência da tecnologia para a indústria, diz, não é tão complexa. Mas antes de chegar a esse estágio, adverte a pesquisadora, será necessário produzir outros estudos em torno das duas leveduras isoladas por ela. Maria Eugênia explica que, embora os microorganismos sejam eficientes para a produção de aroma, eles não conseguem responder sozinhos por todo o processo de fermentação do mosto, pois são poucos resistentes ao etanol.

A saída para esse problema, segundo a autora da tese, será clonar o gene que produz o aroma desejado em uma levedura mais resistente, do gênero Saccharomyces. Desse modo, seria possível ter uma fermentação completa, com a quantidade de etanol desejada e um aroma muito melhor. “Embora esse estudo demande mais alguns anos, acredito que o meu trabalho abra boas perspectivas para as vinícolas nacionais”, prevê a pesquisadora. O trabalho desenvolvido por Maria Eugênia foi realizado no Laboratório de Bioaromas da FEA sob a orientação da professora Gláucia Maria Pastore e contou com o suporte financeiro do CNPq.

Consumo - No ranking dos maiores produtores de vinho do mundo, o Brasil aparece em 15º lugar. Segundo a União da Viticultura Brasileira (Uvibra), em 1992 os brasileiros consumiam aproximadamente 25 milhões de litros por ano. Em sete anos esse volume aumentou para algo em torno de 29 milhões de litros. Embora o crescimento seja visível, o País não tem tradição no desenvolvimento de pesquisas e, conseqüentemente, de tecnologias nesse setor. “Os estudos na área ainda são incipientes por aqui, diferentemente do que acontece na Europa, por exemplo”, afirma Maria Eugênia.

A pesquisadora acredita, porém, que a produção brasileira ainda possa ser ampliada tanto em quantidade como em qualidade, sobretudo no segmento de vinhos espumantes. Como é servida preferencialmente gelada, a bebida é muito apreciada em países de clima tropical. A própria Maria Eugênia decidiu dedicar-se ao estudo da melhoria da qualidade dos vinhos por ser uma amante da bebida. Ela lembra que atualmente as vinícolas já exercem algum controle de qualidade sobre os seus produtos, mas nada em relação à área da biotecnologia.

A produção não é mais feita como antigamente, quando as uvas eram simplesmente esmagadas e o suco deixado para fermentar por si só, sem qualquer monitoramento, a partir das leveduras presentes da microflora da fruta. “Hoje em dia, a linhagem das leveduras é toda controlada. Isso assegura uma qualidade muito superior ao produto final”, esclarece a pesquisadora.

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