Edição nº 647

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 29 de fevereiro de 2016 a 06 de março de 2016 – ANO 2016 – Nº 647

Telescópio


Anticorpos
contra o ebola

Dois anticorpos foram isolados de um sobrevivente de infecção pelo vírus ebola, e um deles se mostrou capaz de eliminar a infecção quando aplicado em macacos, contaminados com a doença até cinco dias antes do início do tratamento, diz nota divulgada pela revista Science, que publica, com acesso gratuito, o artigo que descreve o estudo, de autoria de pesquisadores dos EUA, Europa e República Democrática do Congo.

“Demonstramos que um humano sobrevivente da epidemia de vírus ebola da cidade de Kikwit, em 1995, manteve circulação de anticorpos contra a glicoproteína da superfície do vírus por mais de uma década após a infecção”, afirma o artigo. “Desse sobrevivente, isolamos anticorpos monoclonais que neutralizam variantes epidêmicas recentes e anteriores do vírus ebola”.

Outro artigo, na mesma edição da Science, descreve como se dá a interação entre os anticorpos e o vírus, oferecendo resultados que “definem as bases de neutralização para dois anticorpos e podem facilitar o desenvolvimento de vacinas e terapias”. Ambos os trabalhos podem ser acessados gratuitamente em https://www.sciencemag.org .

Explosão
no espaço

Pela primeira vez, cientistas conseguiram determinar a localização, a galáxia de origem e a distância de uma explosão rápida de rádio (FRB, na sigla em inglês). Essas explosões são surtos abruptos de energia na frequência das ondas de rádio, que vêm do espaço e duram milissegundos. Seu caráter extremamente rápido torna difícil determinar as coordenadas celestes de seu ponto de origem.

Usando um radiotelescópio baseado na Austrália, uma equipe internacional de pesquisadores foi capaz de determinar que o FRB 150418 teve origem numa galáxia espiral a mais de 6 bilhões de anos-luz da Terra.

O artigo, publicado na Nature, indica que algumas características do FRB 150418 tornam improvável que ele tenha sido produzido por uma estrela de nêutrons em rápida rotação, um tipo de astro conhecido como pulsar, ou por uma supernova. As teorias mais aceitas sobre a origem dos FRBs propõem que eles vêm de pulsares ou da explosão de estrelas gigantes, as supernovas. Com isso, os autores especulam que devem existir diferentes categorias de FRBs, sendo alguns associados a pulsares e supernovas e outros, não.

Levando a
evolução em conta

Em artigo de opinião publicado na revista Science, dois pesquisadores franceses pedem que os esforços de conservação do meio ambiente levem em consideração, além do valor imediato dos serviços ambientais prestados para a economia e o bem-estar humano, o impacto de longo prazo das medidas adotadas na evolução das espécies afetadas e de sua interação com o meio.

 Os autores, da Sorbonne e da Universidade Paris-Sul, lembram que a história mostra que o foco em características desejáveis para os seres humanos, na relação com outras espécies, acaba tendo consequências evolutivas imprevistas e distantes do objetivo principal – um exemplo dado é a redução no tamanho do cérebro em animais domesticados.

“Esperamos que processos similares ocorram à medida que começamos a executar uma seleção de larga escala da natureza para propósitos específicos”, escrevem. “Isso é crítico para a exploração intensiva da biodiversidade para os seres humanos. Algumas soluções baseadas na natureza para mitigar a mudança climática (...) provavelmente mudarão os regimes ecológicos locais de seleção, alterando trajetórias evolucionárias”.

Valor da
vergonha

Uma série de experimentos envolvendo centenas de voluntários de três cenas culturais diversas – Estados Unidos, Índia e Israel – indica que, em cada cultura, os comportamentos que mais levam uma pessoa a ser mal vista pelo grupo são, também, os que causam mais vergonha em quem os pratica.

“Por hipótese, vergonha é um programa neurocomputacional moldado pela seleção natural”, escrevem os autores, dos EUA, Israel e Holanda. “Aqui, testamos a hipótese de que a vergonha, embora desagradável (como a dor) serve à função adaptativa de defesa contra a desvalorização social que resulta da informação negativa que chega a terceiros”.

Para executar esse teste, os autores realizaram três experimentos. Em um deles, apresentaram aos voluntários, divididos em dois grupos – um de “vergonha” e um de “público” – listas de comportamentos e pediram, aos membros do “vergonha”, que dissessem como se sentiriam caso fossem acusados deles (as listas incluíam, por exemplo, “maltratar crianças” ou “ter maus modos à mesa”) e aos da “audiência”, como julgariam alguém acusado dessas práticas. A correlação entre os índices de desaprovação pela “audiência” e de vexação dentro do grupo “vergonha” foi bem alta.

De acordo com os autores, na série de três experimentos também ficou claro que a correlação entre vergonha pessoal e desaprovação social era específica: outras emoções negativas avaliadas, como ansiedade e tristeza, não seguiram a mesma curva. O artigo foi publicado no periódico PNAS.

Esquecendo
cocaína

Uma manipulação dos neurônios do hipocampo de camundongos conseguiu fazer com que os animais esquecessem a associação entre a cocaína e um local específico. Os autores, das universidades de Oxford e Tufts, treinaram os animais para associar um determinado local à presença de cocaína, o que levou os roedores a procurar passar mais tempo nesse ambiente, em relação a outra localidade, associada a uma solução salina.

Usando manipulação genética para tornar as células de uma região cerebral, o hipocampo – ligado à formação de memórias e à localização espacial – sensíveis à luz, os autores conseguiram silenciar os neurônios que normalmente se ativavam quando os animais estavam no ambiente ligado à cocaína. Com isso, diz artigo publicado no periódico Nature Neuroscience, “possibilitou-se a emergência de um mapa alternativo” do ambiente, neutralizando a preferência pelo local associado à droga.

Acidez menor ajuda
recuperação de corais

Um fluxo maior de água marinha alcalina ajuda os recifes de coral, atingidos pela acidificação dos mares trazida pelas emissões humanas de CO2, a se recompor, diz estudo publicado na Nature. De acordo com nota divulgada pelo periódico, trata-se do primeiro experimento de campo controlado numa comunidade de recifes de coral a isolar os efeitos da acidificação dos oceanos.

Os autores, da Austrália, Israel e Estados Unidos, lembram que “aproximadamente um quarto do dióxido de carbono antropogênico lançado a cada ano na atmosfera é absorvido pelos oceanos globais”, causando acidificação das águas e danos a ecossistemas.

O estudo foi realizado em uma parte da Grande Barreira de Coral da Austrália onde, na maré baixa, trechos de coral ficam isolados em lagoas de água salgada. Os autores acrescentaram hidróxido de sódio, um sal alcalino, à água de uma das lagoas, e acompanharam as variações de alcalinidade à medida que essa água fluía entre diferentes lagoas, comparando essas mudanças a uma medida de crescimento do coral. A conclusão foi de que o crescimento aumenta quando as águas atingem um pH próximo ao dos níveis pré-industriais.

Semelhantes
se atraem

Gostos, opiniões e atitudes semelhantes são fatores de grande importância para o início de um relacionamento – seja uma amizade ou um envolvimento romântico – mas essa importância cai à medida que a relação perdura. Além disso, pares dissimilares que, a despeito das diferenças, acabam formando um relacionamento tendem a manter seu desacordo ao longo do tempo: a ideia de que, com o passar dos anos, é possível “mudar” o outro, ou de que amigos e amantes tendem a convergir para uma posição comum, parece ter muito pouca realidade prática.

Essas conclusões aparecem em artigo publicado por pesquisadores dos Estados Unidos no periódico Journal of Personality and Social Psychology. Com a ajuda de assistentes, os autores conduziram entrevistas com milhares de pares de pessoas vistas interagindo em público, perguntando a natureza da relação (se amigos, conhecidos, namorados), há quanto tempo o relacionamento existia e pediram aos integrantes de cada par que preenchessem questionários em separado sobre suas opiniões e atitudes.

“Se a similaridade nos relacionamentos pode ser atribuída à influência social, então podemos esperar que a similaridade seja maior quando os pares são mais íntimos, próximos e existem há mais tempo”, diz o artigo, notando que essa hipótese acabou não sendo comprovada. O que os dados revelaram foi outro efeito, chamado de “construção de nicho”, em que as similaridades são usadas como fator de seleção prévio para dar início à relação, e não dependem de variáveis como intimidade ou tempo de relacionamento.