Edição nº 606

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 15 de setembro de 2014 a 21 de setembro de 2014 – ANO 2014 – Nº 606

Muro vivo é alternativa para conforto térmico

Estudo demonstra que sistema diminui em até 6°C a temperatura interna do ar em dias quentes

Uma pesquisa da Unicamp conduzida pelo arquiteto e urbanista Fernando Durso Neves Caetano atestou a eficiência da tecnologia de muro vivo externo para maior conforto térmico no interior de um edifício. Também conhecido como living wall, o sistema atenuou, em dias quentes de verão, a temperatura interna do ar em até 6ºC. O living wall também se mostrou eficiente em dias mais frios, ajudando a reter o calor do ar em até 3ºC. A temperatura superficial da alvenaria diminuiu quase 19ºC, em média, passando de 46ºC para 27ºC. A tecnologia, desenvolvida na Europa na década de 1980, foi testada pelo arquiteto num prédio no campus da Unicamp.

O estudo também avaliou a viabilidade de diferentes espécies vegetais para uso específico em sistemas de muro vivo no Brasil, assim como os parâmetros técnicos referentes à irrigação, nutrição e fixação das plantas. Os principais resultados obtidos demonstram que a tecnologia se adapta à realidade construtiva brasileira, garante o arquiteto, cuja pesquisa integrou dissertação de mestrado desenvolvida por ele junto à Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC) da Unicamp.

“É uma tecnologia recente no Brasil. Em termos de custo, ela se compara a um revestimento de alto padrão, sendo bastante indicada para os grandes centros urbanos, onde os edifícios possuem um perfil muito verticalizado. Trata-se de uma alternativa tecnológica mais limpa, em prol do desenvolvimento urbano sustentável”, indica o pesquisador da Unicamp.

“O muro vivo pode facilitar a inserção da vegetação nas cidades, pois compensa a falta de espaços livres no solo utilizando as fachadas, as quais estão amplamente disponíveis. Além disso, a tecnologia propicia um ambiente bastante agradável do ponto de vista do conforto térmico, evitando, ao mesmo, o uso do ar condicionado, um equipamento com consequências negativas ao meio ambiente”, completa.

Os aparelhos convencionais de ar condicionado utilizam o HCFC (hidroclorofluorcaborno), um fluido refrigerante com potencial para destruição da camada de ozônio e para elevar o aquecimento global, embora a substância seja menos poluente que os CFCs (clorofluorcarbonos). Em setembro de 2007, o governo brasileiro e outras nações ao redor do planeta assinaram o Protocolo de Montreal que, dentre outras medidas, objetiva abolir, de maneira gradativa, o uso HCFC até 2040.

O uso da vegetação enquanto estratégia de condicionamento térmico passivo assume papel central neste contexto, situa o arquiteto e urbanista. Ele explica que esta atenuação térmica - passiva no caso do emprego de vegetação e ativa em situações de uso do ar condicionado - acontece pelo sombreamento, isolamento térmico na folhagem e evapotranspiração, uma transferência do calor da planta por meio da transpiração. “Acontece um balanço energético latente, o que contribui para umidificar o ar e prevenir os extremos de temperatura”, pontua.

Fernando Caetano foi orientado pela docente Lucila Chebel Labaki, que atua no Departamento de Arquitetura e Construção da FEC. O estudo, desenvolvido no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura, Tecnologia e Cidade da Unidade, obteve financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), concedido na forma de bolsa ao pesquisador da Unicamp.

Ele explica que os sistemas de muros vivos trazem a inovadora premissa de agregar o meio de crescimento diretamente na superfície vertical, tornando, assim, as plantas independentes do solo. O sistema utiliza recipientes modulares que armazenam o meio de crescimento para o enraizamento e desenvolvimento das espécies vegetais. Isto implica que as plantas sejam alimentadas por um sistema semi-hidropônico, que fornece água e nutrientes às espécies.

“É uma tecnologia irmã da cobertura verde. A vantagem é exatamente a questão da verticalização que limita a cobertura verde ao andar superior no caso de um edifício. No muro vivo, a área é bem maior e o beneficio é para todos os pavimentos. Há também diferenças em relação às técnicas que usam trepadeiras, que ficam enraizadas no solo, limitando também a área coberta. O muro vivo não tem limites de expansão, além do que é possível trabalhar melhor com a questão da decoração”, compara o estudioso da Unicamp, graduado pela Universidade Federal de Viçosa (UFV).


Atraso térmico

Outro resultado importante que comprovou a eficiência da tecnologia de muro vivo foi o atraso térmico, ou seja, o deslocamento dos picos de temperatura. Com a proteção do living wall houve um deslocamento do pico de calor para horários menos quentes. O mesmo aconteceu em dias frios.

Conforme o estudioso, o atraso térmico foi de 4 a 5 horas. Enquanto temperaturas extremas se davam, respectivamente, nos horários mais quentes (15h) e mais frios (6h) nas paredes desprotegidas, nas medições com o muro vivo essas temperaturas se deslocaram para horários mais amenos (20h) e (9h). “O principal efeito de amenização térmica foi proporcionado pela vegetação, sendo responsável por mais de 80% do amortecimento térmico. Já o atraso térmico se deveu também às outras camadas do sistema.”

 

Plantas mais adaptáveis

Em sua pesquisa, Fernando Caetano explica que as plantas constituem o componente ambientalmente funcional dos sistemas de muro vivo por proporcionarem o efeito de refrigeração, umidificação e purificação do ar. O arquiteto e urbanista acrescenta que as espécies vegetais são responsáveis pela aparência final da envoltória e que sua correta escolha e combinação determinarão tanto a capacidade de amenização do muro vivo, quanto o apreço visual proporcionado às pessoas.

Ele informa ainda que as plantas que melhor se adaptaram ao ambiente do experimento possuem, no geral, estratégias eficientes de sobrevivência, como a capacidade de armazenar água nas folhas (suculenta), superfícies brilhosas (reflexão do calor) e capacidade de armazenamento de nutrientes nas raízes.

Dentre as 12 espécies vegetais testadas, 6 tiveram uma melhor adaptação à tecnologia: rosinha de sol (Aptenia cardifolia); dinheiro em penca (Callisia repens); grama amendoim (Arachi repens); Evôlvulo (Evolvulus glomeratus); peperômia (Peperomia serpens); e abacaxi roxo (Trandescantia spathacea).


Experimentos

Foram realizados experimentos comparativos em edifícios similares instalados na Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo da Unicamp. Um deles recebeu o sistema de muro vivo, enquanto o outro foi usado como controle nas medições, dispondo apenas de sua envoltória convencional de alvenaria. Nos dois ambientes, foram monitorados parâmetros de temperatura superficial, temperatura do ar interno e umidade relativa do ar interno. Os experimentos ocorreram durante os meses de verão, de outubro de 2013 a janeiro de 2014.

 

Publicação

Dissertação: “Influência de muros vivos sobre o desempenho térmico de edifícios”
Autor: Fernando Durso Neves Caetano
Orientadora: Lucila Chebel Labaki
Unidade: Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo (FEC)
Financiamento: Fapesp