Edição nº 551

Nesta Edição

1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12

Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF
Campinas, 25 de fevereiro de 2013 a 03 de março de 2013 – ANO 2013 – Nº 551

PESQUISA


A pesquisa interdisciplinar constitui um fator cada vez mais valorizado no meio científico. O seu programa de gestão contempla alguma linha de ação para avançar nesse aspecto?

Edgar Salvadori De Decca –Apesar de veiculada à importância da pesquisa multidisciplinar, são frágeis as ações e as políticas institucionais da Unicamp visando sua real efetivação. A fragmentação e a especialização é a característica principal da produção acadêmica, inclusive estimulada pelos órgãos de fomento de ciência e tecnologia. Esta situação é estranha à origem da Unicamp, mostrando como a Universidade se adequou às determinações externas, abafando sua própria voz.

É por esta razão que nosso programa está organizado em dois eixos, com destaque para uma agenda estratégica do conhecimento. Perspectiva ausente nas demais proposições, que se concentram nos temas que tratamos no eixo estrutural e que o fazem em uma perspectiva fragmentada. Nossa posição defende interdisciplinaridade, mas sob uma ótica de formação e da pesquisa multidisciplinar. Não basta relacionar conhecimentos diversos, é necessário que haja uma integração entre eles através de esforços coletivos.

Neste sentido, é fundamental que uma perspectiva estratégica guie a próxima gestão, a qual, a nosso ver, passa pela elaboração da agenda do conhecimento, da racionalização dos currículos existentes e da criação de novas formações baseadas na articulação e integração do conhecimento. Ademais, acreditamos que este esforço deve ser validado socialmente, razão pela qual propomos um amplo conjunto de iniciativas visando ativar as relações internas à Unicamp, e desta com as cidades de seus campi e com a sociedade brasileira. Somente uma multidisciplinaridade efetiva pode dar a razão pela qual formamos e pesquisamos.

José Cláudio Geromel – Já ressaltamos muito que a pesquisa interdisciplinar é um fator importante no atual cenário científico nacional e internacional. Mais ainda, é a pesquisa interdisciplinar que agrega inovação, novas tecnologias e novos procedimentos. Além dos acadêmicos e científicos, os aspectos administrativos devem ser considerados. A Unicamp não dispõe, no momento, de uma estrutura administrativa simples e eficiente que permita gerenciar adequadamente esforços científicos interdisciplinares. Uma estrutura que venha sanar essa necessidade será adotada no mais breve intervalo de tempo.

José Tadeu Jorge – A Unicamp foi pioneira na constituição de uma estrutura interdisciplinar de pesquisa com a criação, há quase quatro décadas, de seu primeiro centro interdisciplinar. Foi dado início assim, de forma inovadora e criativa, à estruturação do conjunto de Centros e Núcleos Interdisciplinares, atualmente contando com 21 deles. Sob coordenação da Cocen, eles constituem um sistema dinâmico e produtivo com estrutura e papel acadêmico-institucionais bem definidos. Atuam nesses órgãos pesquisadores e docentes de distintas vinculações disciplinares que, articulados em temas e objetos complexos e próprios da interdisciplinaridade, desenvolvem pesquisa de forma complementar às unidades de ensino e pesquisa.

No tocante às atividades de ensino, os centros e núcleos têm colaborado ativamente com a pós-graduação e a graduação, salientando-se também sua contribuição em atividades e projetos de extensão, e sua prestação de serviços até mesmo para a própria universidade. Nos últimos anos, esse sistema tem aportado à Unicamp um volume significativo de recursos extra-orçamentários para a pesquisa.

Por outro lado, é fato que há ainda, na prática da pesquisa interdisciplinar, um potencial a ser explorado, com benefícios para o ensino. Propomos que essa grande experiência na pesquisa interdisciplinar acumulada pela Unicamp seja aproveitada de maneira mais ampla no ensino de graduação e de pós-graduação. Na graduação, o programa de revisão das estruturas curriculares que faz parte de nossa proposta deverá ter como um dos seus eixos a interdisciplinaridade, assim como as propostas de cursos novos. Na pós-graduação, vamos fomentar e valorizar a criação de programas de cunho interdisciplinar, que busquem superar as barreiras naturalmente impostas pelos arranjos disciplinares convencionais. Na pesquisa, os temas interdisciplinares possuem grande impacto e oferecem respostas às grandes inquietações da sociedade, devendo assim ser estimulados. Já a extensão tem uma vocação naturalmente inter e multidisciplinar, a qual deve ser apoiada em prol do fortalecimento das relações entre Universidade e sociedade.

Mario José Abdalla Saad – Não isoladamente, pois a interdisciplinaridade deve permear todas as atividades da Universidade, pois é benéfica a todas elas. Logo, ela aparece em vários momentos e em praticamente todas as propostas referentes à pesquisa, ao ensino e à extensão. No ensino, por exemplo, um dos pontos de nosso programa é oferecer apoio técnico-pedagógico para as unidades e os cursos que desejem promover reestruturação curricular; outro é manter e ampliar o ProFIS, que tem por base dotar os alunos da rede pública de formação geral e visão crítica, em parte gerada pelo conhecimento interdisciplinar. O ProFIS tem o mérito de promover a inclusão social pela via da formação geral, inovação no ensino que terá impactos  importantes no futuro da pesquisa e da extensão, assim como as diversas iniciativas da mesma natureza que incrementaremos em nossa gestão.

Na pesquisa, trataremos de valorizar, por meio de editais específicos, as atividades de natureza inter-, multi- e transdisciplinar desenvolvidas nas unidades e nos centros e núcleos. Também consolidaremos as ações de diversos Centros e Núcleos, assim como do Centro de Estudos Avançados, que têm como prática atuar sem fronteiras disciplinares.

Assim, em todos os níveis, ensino, pesquisa e extensão, a interdisciplinaridade tem sido reveladora de um importante potencial de sinergia entre diferentes áreas do conhecimento. Não falamos apenas da dissolução de fronteiras de áreas com afinidades epistemológicas: na FCA, por exemplo, os diálogos entre as Ciências Humanas e outras áreas do conhecimento tradicionalmente delas isoladas devem ser incrementados, pois as incipientes atividades interdisciplinares naquela unidade da Unicamp têm trazido benefícios em todos os níveis da atividade acadêmica. 


Os indicadores internos de inovação apresentam crescimento constante, o que coloca a Unicamp no ranking das universidades que mais depositam patentes no Brasil. Qual sua política para esse setor?

Edgar Salvadori De Decca –Este é um tema que exige um debate mais amplo na comunidade, pois valoriza somente a inovação que resulta na produção de patentes. Apesar da sua inegável importância, ela não expressa a complexidade da capacidade real e potência de inovação que a Unicamp possui.

Cabe fortalecer a inovação que resulta em patentes, mas é preciso ao mesmo tempo estabelecer uma política mais ampla, que identifique as contribuições que a Universidade transfere para a sociedade, buscando inclusive estimulá-las ao dar a elas maior visibilidade. Um das áreas de inovação que consideramos relevante, sem demérito das demais, volta-se para o desenvolvimento da educação básica no país. A Unicamp tem uma ampla capacidade para produzir materiais didáticos e paradidáticos nas diversas formas de mídia, inclusive na modalidade de ensino a distância. Propomos um projeto estratégico nesta área, tão carente no desenvolvimento social brasileiro.

Pode-se ainda apontar a importância de a Universidade fortalecer inovações no atendimento à saúde, na segurança alimentar, do desenho e gestão de políticas públicas e sociais, de energia, dentre outras. É preciso, portanto, estabelecer uma nova política institucional de fomento à inovação que, de modo suficientemente, seja capaz de abranger a complexa capacidade que a Universidade possui de produzir conhecimento, tanto em termos econômicos como socialmente válidos.

José Cláudio Geromel – A Unicamp tem um desempenho singular nesse setor. Ele surgiu com a criação da Inova. É um esforço que deve ter continuidade, mas com o reestabelecimento das atribuições originais dessa agência: as de um órgão responsável em prestar apoio técnico às decisões que envolvam patentes e inovações. A Inova deve estar a serviço das unidades para oferecer assessoria técnica aos convênios que tenham essas características. Não deve atuar como instância responsável por emitir pareceres nos mais diversos convênios e contratos, mas sim atuar segundo as demandas solicitadas pela nossa comunidade acadêmica. Desejamos manter e expandir de forma qualificada a preocupação com patentes e inovação não apenas no chamado setor produtivo, mas também no de pesquisa básica.

José Tadeu Jorge – A Unicamp, com base em sua qualidade acadêmica e científica, deve estimular ações que façam com que o conhecimento e a tecnologia gerados cheguem até a sociedade e contribuam para o desenvolvimento do país.

O compartilhamento do conhecimento como base para a inovação tem sido uma tendência mundial contemporânea, com a universidade agindo como catalisadora do processo de inovação. Nela, os resultados de algumas pesquisas podem ser protegidos por meio de pedido de patente, gerando assim uma invenção protegida. A invenção em si não gera automaticamente a inovação. Para que isso ocorra é necessário que empresas, em parcerias com as universidades, transformem o conhecimento e a tecnologia – protegida ou não - em inovações para a sociedade. Assim, a universidade assume o papel de parceira e não apenas fornecedora das instituições participantes das atividades de inovação.

Nas áreas não tecnológicas, as parcerias para a inovação podem se dar com órgãos públicos para levar a essas esferas o conhecimento gerado com grandes benefícios sociais e de cidadania.

As patentes não devem ser consideradas como o único indicador de inovação, pois o número de patentes depositadas mostra apenas que a universidade tem potencial inventivo, não assegurando a contribuição efetiva para gerar inovação. É importante também que a Universidade amplie seus indicadores de inovação, permitindo aferir não só o desempenho acadêmico, mas também os benefícios e impactos econômico, social, ambiental, resultantes dos projetos e das parcerias – tecnológicas ou não – que a Universidade desenvolveu. 

Propomos uma política de fortalecimento e incentivo à participação da Unicamp no processo de inovação com ações que incluem o aprimoramento da metodologia de identificação de projetos inovadores nas unidades/órgãos, incremento da interação com instituições diversas, melhoria e inserção da atividade de incubação na política de inovação, estímulo ao empreendedorismo dos alunos, adequação da infraestrutura e serviços de apoio necessários e qualificação e capacitação da organização e sua gestão.

Mario José Abdalla Saad – A Inova talvez seja o exemplo mais evidente de como a Unicamp se destaca no panorama nacional e latino-americano de inovação tecnológica. A Inova foi criada há menos de 10 anos e, graças em grande parte ao seu trabalho, a Unicamp consolidou o seu protagonismo no estímulo à inovação e empreendedorismo no ambiente universitário, preservando os princípios acadêmicos. Com a experiência adquirida, pretendemos dar um novo salto, aperfeiçoando as ações já implantadas e ampliando a sua abrangência, através do ensino de graduação e pós-graduação, para que nossos alunos se tornem criativamente independentes e contribuam como agentes de transformação do seu entorno. Especial atenção deve ser dada à educação empreendedora e para a inovação, por meio do apoio a iniciativas já existentes e da ampliação da oferta de disciplinas curriculares pelos institutos e faculdades da Unicamp, com a mobilização de competências complementares por meio da ativa participação da Inova.

Precisamos ainda consolidar o Parque Científico e Tecnológico da Unicamp, aumentando a interação da Universidade com empresas públicas e privadas, e projetar a criação de um parque tecnológico, envolvendo Inova e Secretarias Municipais e Estaduais nos campi de Limeira, com apoio e financiamento de órgãos federais, estaduais e municipais. Queremos também promover o crescimento significativo do número de empresas start-up nas novas instalações da Incubadora de Empresas de Base Tecnológica, fortalecendo o ecossistema de inovação.

Pretendemos ainda criar uma linha no Faepex dedicada a aumentar a atratividade dos resultados de nossas pesquisas para parceiros, visando ao seu desenvolvimento e disponibilização na Sociedade. A Política Institucional de Propriedade Intelectual também será aprimorada, visando atender melhor aos interesses institucionais e também favorecer o estabelecimento de parcerias estratégicas em pesquisa e desenvolvimento.