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Anatol Wladyslaw
 


12

As muitas almas de Anatol Wladyslaw

A oniroteca de Wladyslaw

na pintura de Anatol Wladyslaw
um gato azul
sonha universos geométricos
habitados por rosas vermelhas

uma cabeça de madona
se deixa recortar
pelo alfange laranja
da luz

e tudo se atira da janela
aberta
da cor

na mão de Anatol Wladyslaw
a pintura
engendra enigmas perfeitos
regidos por números cabalísticos
mas acessíveis a uma simples
flor

HAROLDO DE CAMPOS

ÁLVARO KASSAB

O professor e artista plástico Geraldo Porto e algumas das telas de Anatol Wladyslaw: acervo conta com 301 obras (Foto: Antoninho Perri)O poema acima é mais que uma homenagem a Wladyslaw, pintor polonês que desembarcou no Brasil em 1930, aos 17 anos. Publicados em 1993 no livro Crisantempo, os versos espelham, para além da admiração que Haroldo de Campos nutria pela obra multifacetada e enigmática do artista, uma amizade iniciada meio século antes nas fileiras do concretismo. Enquanto Haroldo, seu irmão Augusto e Décio Pignatari forjavam em 1952 o Grupo Noigrandes, Wladyslaw, Waldemar Cordeiro, Geraldo de Barros, Lothar Charoux, Kazmer Fejer, Leopoldo Haar e Luis Sacilotto assinavam no mesmo ano o manifesto Ruptura, difundido na exposição homônima no Museu de Arte Moderna de São Paulo. Wladyslaw, entretanto, não escondia sua discordância com alguns dos conceitos – e desdobramentos – da vaga concretista. Essa busca por um caminho pessoal marcaria toda sua obra até 2004, ano de sua morte, aos 90 anos.

Amostras significativas dessa trajetória acabam de ser doadas à Unicamp pela viúva do pintor, Blanka Wladislaw. Ao todo, são 301 obras: 137 pinturas, 136 desenhos e 28 gravuras. No final do ano passado, Blanka, professora aposentada do Instituto de Química da USP, escreveu uma carta endereçada ao professor Geraldo Porto, coordenador da Galeria de Arte da Unicamp, na qual manifestava sua intenção em doar “algumas obras” à Universidade. Em visita ao ateliê do artista, em São Paulo, o docente interessou-se pela totalidade do conjunto. “Podemos dizer que recolhemos a alma de Wladislaw. Toda a sua vida estava naquele ateliê”, afirma Porto, ressaltando a generosidade de Blanka pela cessão imediata das obras, algumas das quais carecendo de maiores cuidados quanto à preservação. “Gostei muito de tudo que vi, e logo fiz a proposta para ficar com todas as peças que estavam no espaço, inclusive o cavalete usado por Wladislaw”, testemunha.

“Não poderia deixar de escolher a Unicamp, onde meu marido já havia feito uma exposição [1993], para oferecer as obras a seu acervo. Entretanto, quanto à escolha e ao número de obras, deixei a critério do professor Geraldo Porto”, revelou Blanka, por e-mail, ao ser indagada por que optara pela Universidade como depositária.

O acervo doado compreende toda a poética do pintor, que deixou o ofício de engenheiro para dedicar-se integralmente à arte durante décadas. “Ele era engenheiro formado pela Universidade Mackenzie, mas não gostava da profissão. No início, trabalhava em tempo parcial e pintava somente em meio período. Depois de algum tempo, ele abandonou a engenharia”, afirma a viúva do artista. Constam do conjunto pinturas figurativas, composições com formas geométricas e espiraladas, paisagens, nus femininos, a abstração informal, o fantástico, a engenharia construtivista, a brasilidade, as raízes judaicas e polonesas. O lirismo é o timbre de todas as fases. “A  Polônia é conhecida por sua poesia maravilhosa, romântica. O  próprio Wladislaw achava que ela influenciou, em parte, a sua pintura”, observa a professora Blanka.

“Trata-se de uma coleção cuja dimensão não dá para mensurar em razão de sua importância. Wladislaw é um nome fundamental no panorama da arte brasileira contemporânea. Ademais, esse conjunto doado à Universidade vai abrir várias frentes de pesquisa”, afirma Porto. Para o docente do Instituto de Artes (IA) é impossível calcular o valor do acervo. “Apenas para efeito de comparação, estive recentemente na SP Arte, que reúne as maiores galerias de arte contemporânea do país, na qual o preço médio de um quadro feito por pintores concretistas estava na casa dos 50 mil dólares”, observa o professor, também artista plástico. “Além de ter obras em vários museus do Brasil e do exterior, Wladislaw recebeu muitos prêmios, entre os quais o Prêmio Nacional de Desenho na VI Bienal de São Paulo, em 1961”.

 

 

 

 

 

No aspecto histórico, Porto lembra que os vínculos de Wladislaw com Campinas remontam à década de 1950, quando o pintor trocava impressões com os artistas plásticos do Grupo Vanguarda, cujo manifesto foi lançado há exatos 50 anos. “A materialização desses contatos deu-se em 1961, ano em que Anatol realizou uma mostra de desenhos na Galeria Aremar, de propriedade do artista plástico Raul Porto, teórico concretista e integrante do Vanguarda”, afirma Porto, que se define como um “garimpeiro” – o docente foi responsável pela aquisição de obras dos pintores Antonio Roseno e Mário Bueno, que hoje integram o acervo da Unicamp.

Porto reencontrará a professora Blanka no próximo dia 6, data de inauguração da exposição A Abstração em Anatol, que se estenderá até 30 de maio na Galeria de Arte da Unicamp. Serão expostos desenhos e 23 pinturas.

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