Edição nº 671

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 03 de outubro de 2016 a 16 de outubro de 2016 – ANO 2016 – Nº 671

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Estudo do IFGW traz novas contribuições para
o entendimento da interface cérebro-computador

Pesquisa desenvolvida para a dissertação de mestrado do físico Carlos Alberto Stefano Filho, defendida no Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW) da Unicamp, trouxe novas contribuições para as investigações sobre a interface cérebro-computador (BCIs, na sigla em inglês). No trabalho, o autor obteve até 80% de acerto na tarefa de discriminar os sinais cerebrais emitidos durante testes de imaginação motora. “É um resultado significativo, principalmente quando levamos em consideração que esse tipo de abordagem ainda é relativamente novo tanto no Brasil quanto no mundo”, considera. O estudo foi orientado pela professora Gabriela Castellano e coorientado pelo professor Romis Attux, da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC).

De acordo com Stefano, as pesquisas tradicionais sobre BCIs são baseadas em determinadas características do sinal cerebral. Em seu estudo, o pesquisador utilizou um método que tem sido investigado em período mais recente pela ciência, que é a análise da conectividade cerebral. O físico explica que há dois tipos de conectividade no cérebro: a estrutural e a funcional.

A primeira é representada pelas conexões físicas entre os neurônios. “No nosso caso, nós estudamos a conectividade funcional. Nós utilizamos a eletroencefalografia para medir a atividade elétrica do cérebro, durante testes de imaginação motora, realizados por oito voluntários saudáveis. Pedimos para que eles imaginassem que estavam mexendo inicialmente a mão esquerda e depois, a direita. O objetivo foi extrair informações para serem posteriormente usadas em um sistema de BCI”, detalha o autor da dissertação.

Um dos objetivos de Stefano foi identificar as diferenças de comportamento do cérebro entre uma ação e outra. “O que está no foco do nosso estudo é desenvolver um comando binário que possa ser usado para acionar um sistema de interface cérebro-computador. Esse tipo de aplicação é especialmente importante para pessoas que têm severos comprometimentos das funções motoras e da fala, mas que apresentam atividade cerebral intacta”, explica.

O autor da dissertação admite que detectar essas diferenças na conectividade cerebral não é uma missão trivial. “Entretanto, nós encontramos diferenças em situações muito específicas. Nossa intenção é utilizar os dados gerados pela eletroencefalografia para criar uma rede. Essa rede é um objeto matemático que vai descrever as interações entre cada eletrodo da eletroencefalografia. A partir daí, esperamos extrair métricas para avançar em relação à pesquisa”, pormenoriza.

Uma próxima etapa do estudo, entende o autor da dissertação, seria tentar fazer o sistema funcionar em tempo real. Nesse caso, o usuário contaria com dois comandos obtidos a partir da imaginação do movimento da mão esquerda e da mão direita. “A ideia é que a pessoa cumpra determinada ação, como movimentar o cursor do computador para um lado e para o outro. Se ela quiser que o cursor vá para a esquerda, ela vai imaginar esse movimento. O mesmo vale para a mão direita. Um aspecto importante será verificar se o desempenho melhora ou piora em tempo real”, detalha.

Essa forma de comunicação direta entre o cérebro e o computador, reforça o físico, deve gerar novas tecnologias que atendam às necessidades de pessoas que apresentam comprometimento das funções motoras e da fala. “Essas pessoas ainda não contam com esse tipo de recurso, que permite que elas se comuniquem e tenham certo grau de autonomia”, diz Stefano.

Como exemplo do que existe atualmente à disposição das pessoas com esse tipo de comprometimento, o pesquisador cita o caso do físico britânico Stephen Hawking, que contribuiu para o entendimento da origem do universo. Aos 21 anos, ele foi diagnosticado com esclerose lateral amiotrófica, doença que afeta as células nervosas responsáveis pelo controle da musculatura.

A doença o deixou praticamente paralisado e sem voz. “Entretanto, Hawking consegue mover a sua cadeira de rodas e acionar alguns dispositivos acoplados a ela, como o sintetizador de voz, através de movimentos sutis da bochecha. Esse recurso não constitui um BCI, visto que não existe comunicação direta entre o cérebro e o dispositivo externo. São os movimentos remanescentes que permitem que ele acione tais recursos”, pormenoriza.

Embora esta seja a aplicação mais importante e com maior impacto social, os BCIs podem ter outras destinações, como informa Stefano. Segundo ele, a tecnologia também vem sendo investigada para uso em jogos e para monitorar o estado de vigília de motoristas. “De maneira geral, pode-se dizer que o recurso serve a qualquer situação em que os sinais cerebrais sejam utilizados diretamente como comando a um dispositivo externo”, completa Stefano, que contou com bolsas de estudo concedidas pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão do Ministério da Educação, e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), agência do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).

Publicação

Dissertação: “Análise de desempenho de métricas de gráfos para reconhecimento de tarefas de imaginação motora das mãos a partir de dados de eletroencefalografia”
Autor: Carlos Alberto Stefano Filho
Orientadora: Gabriela Castellano
Coorientador: Romis Attux
Unidade: Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW)
Financiamento: Capes e CNPq