Edição nº 625

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 18 de maio de 2015 a 24 de maio de 2015 – ANO 2015 – Nº 625

Uma etiqueta inteligente

Circuito eletrônico armazena informações que podem ser lidas à distância

O dispositivo desenvolvido na FEEC: operando em frequências elevadasUma etiqueta para identificação de objetos por radiofrequência (RFID) aplicável em metais – utilizando uma abordagem original inclusive mundialmente – é o resultado da pesquisa de mestrado do engenheiro Manoel Vitório Barbin, orientada pelo professor Michel Daoud Yacoub, na Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC). A tecnologia de RFID (Radio Frequency Identification) consiste no uso de etiquetas contendo um circuito eletrônico para armazenar informações que podem ser lidas à distância por um sistema associado. Já difundida em aplicações médicas, científicas e industriais, esta tecnologia se assemelha à do código de barras empregada em produtos do comércio, cuja diferença é a leitura óptica do número identificador, e não por radiofrequência.

A originalidade do estudo de Manoel Barbin está no desenvolvimento de uma etiqueta para RFID operando em frequências elevadas (UHF, de Ultra High Frequency) que pode ser aplicada em objetos metálicos de médias e grandes dimensões, como placas, tubos e containers – e a uma distância de leitura superior a oito metros. “Uma etiqueta convencional operando em UHF pode ter seu desempenho alterado dependendo dos materiais que compõem o objeto ou estão ao redor. Metais degradam significativamente o desempenho, reduzindo a distância de identificação. Isto decorre da interação eletromagnética entre a antena da etiqueta e o metal, alterando características como de diagrama de radiação, largura de banda e eficiência da antena, impedindo a identificação do objeto etiquetado”, explica o engenheiro.

Segundo o professor Michel Yacoub, orientador da pesquisa, todo material pode modificar o padrão de radiação, mas não tanto como o metal, capaz de fazer com que o sistema passe a funcionar em outra frequência. “É como sintonizar uma emissora de rádio e receber o sinal de outra. Por exemplo: se o projetado é de 900 MHz (megahertz), o metal muda o padrão para 800 MHz e o sistema simplesmente não detecta o objeto que se deseja. Daí, o aspecto inovador desta pesquisa, que é de mestrado, mas que valeria como tese de doutorado se o aluno reunisse os créditos necessários.”

O docente da FEEC acrescenta que o sistema de RFID é bastante utilizado em armazéns para controle de entrada e saída de mercadorias, assim como em hospitais, onde deve ser rigoroso o cuidado com medicamentos, instrumentos e outros materiais. “Recentemente recebemos a visita do Corpo de Bombeiros, que gostaria de implantar a etiqueta em capacetes, botas e uniformes, itens de alto custo e passíveis de extravio. Numa indústria de computadores, peças valiosas de hardware são armazenadas em local seguro e é preciso controlar se um componente saiu dali e chegou à linha de produção”, exemplifica.

 

PROCESSO DE FABRICAÇÃO

De acordo com Manoel Barbin, as etiquetas de RFID possuem um ou mais componentes eletrônicos e podem ser ativas (se alimentadas por bateria) ou passivas (a exemplo desta que desenvolveu). Todas, no entanto,O professor Michel Yacoub, orientador: sistema de RFID é muito utilizado em armazéns para controle de entrada e saída de mercadorias possuem uma antena para transmitir ao equipamento leitor ou dele receber os sinais de radiofrequência. “As etiquetas passivas são bem simples, constituídas apenas por um pequeno circuito integrado e uma antena. Geralmente, a antena é desenvolvida através da deposição de metal (cobre ou alumínio) sobre um filme plástico. Produzidas em larga escala, as etiquetas convencionais apresentam baixo custo final, mas o investimento para a fabricação é elevado, por exigir máquinas de grande precisão para implantar o circuito integrado sobre a antena, além de reciclagem e eliminação adequada dos resíduos.” 

O autor da dissertação afirma que a etiqueta que desenvolveu, ao contrário, tem baixo custo de produção porque as máquinas necessárias são bem menos sofisticadas e disponíveis no mercado nacional. “A etiqueta em si é feita como em processo de tornearia, com o corte, dobra e solda da chapa. A parte mais sofisticada, que não se faz em estamparia, é a colocação do chip. Se as etiquetas convencionais são realmente baratas, elas não funcionam em metal, enquanto esta funciona, a um custo bem razoável, que hoje não deve ultrapassar os 4 reais – e que poderia cair bastante na fabricação em escala.”

O protótipo construído e testado por Manoel Barbin traz um novo método de alimentação do sinal de radiofrequência O engenheiro Manoel Vitório Barbin, autor do estudo: protótipo tem um novo método de alimentação do sinal de radiofrequênciapara conexão entre o circuito integrado e a antena – principal dificuldade da PIFA (sigla para Antena Planar de F-Invertido), utilizada no experimento. “Neste caso, a alimentação se dá através de uma fenda no elemento radiante da antena. Os resultados da simulação indicaram que este método não somente viabiliza a montagem do circuito integrado, como pode ser utilizado para realizar o casamento de impedâncias entre o circuito e a antena. É um formato que também facilita bastante a construção e montagem da etiqueta em um processo produtivo, diminuindo custos.”

De acordo com o engenheiro, para que etiquetas passivas de RFID em UHF operem nas faixas regulamentadas pelos diferentes organismos no mundo, devem possuir uma banda com largura em torno de 100 MHz e centrada em 910 MHz. “Este é um requisito importante para atender a um mercado o mais amplo possível. Diversos esforços têm sido realizados para desenvolver etiquetas passivas de menor custo e que possam ser utilizadas em variados objetos e bandas em UHF. No nosso caso, simulações eletromagnéticas da antena e posterior análise de desempenho da etiqueta mostraram que foram atendidos os requisitos de largura de banda (860 MHz a 960 MHz) e distância máxima de leitura, maior que oito metros.”

 

A RFID na habilitação da Internet das Coisas 

Manoel Vitório Barbin tem idade acima da média dos pós-graduandos e traz uma experiência profissional acumulada em diversas empresas como especialista em eletromagnetismo, com foco nos últimos anos em sistemas de RFID (identificação de objetos por radiofrequência). “O que me motivou para esta pesquisa foi a engenharia pela engenharia, a vontade de desenvolver ideias que possam ser aplicadas. Detectado o problema, eu quis resolver a questão da dificuldade do uso de RFID em UHF para metais. O interesse não foi comercial, mas gostaria muito que o protótipo vingasse no mercado, pois seria a melhor coisa para a engenharia – é o que esperamos sempre.”

Na dissertação intitulada “Etiqueta de RFID em UHF para objetos metálicos”, Barbin conta que este conceito de comunicação utilizando técnicas de retroespalhamento (backsacttering) remonta à origem da tecnologia de radares. Um exemplo de aplicação da técnica está no sistema IFF (sigla para Identify Friend-or-Foe), desenvolvido na Inglaterra e que permitia a identificação das aeronaves amigas pelos aliados: refletores passivos eram colocados nos aviões para torná-los mais brilhantes que os dos inimigos na tela do radar.

“Os avanços na tecnologia de circuitos integrados de silício para RFID tornaram as etiquetas confiáveis e baratas, tanto que na primeira década do século 21 vimos a sua adoção generalizada e em grande escala, movimento que tem sido contínuo e traz perspectivas de comercialização crescente em todo o mundo. Atualmente, a RFID é apontada como uma das principais tecnologias habilitadoras da internet do futuro: a Internet das Coisas (IoT)”, diz o autor da pesquisa.

Internet of Things (IoT), segundo Barbin, é um conceito nascido na área de RFID e que vem empolgando pesquisadores na perspectiva de uma web que não terá somente pessoas interagindo com pessoas, mas “coisas com coisas”. “Na Internet das Coisas podemos imaginar, por exemplo, sensores que monitoram sua atividade e a temperatura de uma sala, e também acessam a internet colhendo informações climáticas em tempo real. A partir desses dados climáticos, o sistema pode atuar no ambiente para fique mais agradável e reduzir o consumo de energia, sem qualquer interação humana.”

Manoel Barbin é líder do grupo de infraestrutura e arquitetura do Fórum Brasileiro de IoT (www.iotbrasil.com.br), espaço criado em 2011 por pessoas motivadas para Internet das Coisas, vindas dos segmentos empresarial, editorial, acadêmico, pesquisa e desenvolvimento, governo e organizações não governamentais. É um fórum que visa à discussão permanente desta que é considerada “a nova onda” da internet e suas tecnologias habilitadoras. Dele participam outros grupos, como de saúde, segurança, educação, protocolos e padrões, aplicações e serviços, e automotivo.

Para o autor da dissertação, os entusiastas da área vivem ainda uma fase de empolgação, antevendo a ampliação da Internet das Coisas para aplicações infinitas e um mercado de bilhões de dólares. “Mas depois todos ‘vão cair na real’, trabalhando sobre o que é realmente possível. Meu grupo discute diversas tecnologias aplicáveis em IoT, sendo a RFID uma das mais promissoras, pois as etiquetas para identificação de objetos são baratas e, diferentemente do código de barras, ainda têm processamento e memória, fornecendo certa inteligência.”

 

Publicação

Dissertação: “Etiqueta de RFID em UHF para objetos metálicos”

Autor: Manoel Vitório Barbin

Orientador: Michel Daoud Yacoub

Unidade: Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC)