Edição nº 618

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 09 de março de 2015 a 15 de março de 2015 – ANO 2015 – Nº 618

Melatonina é testada em casos
de alterações cardíacas e pulmonares

Pesquisador conclui que o hormônio aumentou as defesas enzimáticas antioxidantes do coração

Luiz Alberto Ferreira Ramos, autor da tese

A Hipertensão Arterial Pulmonar (HAP) é uma doença progressiva que afeta, primariamente, as arteríolas pulmonares. Ela resulta da contração dos vasos sanguíneos pulmonares e tem como consequência o aumento progressivo da resistência vascular ao fluxo sanguíneo, aumentando a pressão arterial pulmonar. Embora se considere que a doença possa ser decorrente de fatores genéticos, ela é classificada genericamente como idiopática, isto é, de causas desconhecidas.

A vasoconstrição diminui o calibre das artérias, dificulta a oxigenação do sangue e causa um extravasamento de líquido no pulmão, promovendo um processo inflamatório pulmonar e comprometendo o lado direito do coração.

As primeiras evidências da HAP incluem sinais clínicos clássicos como fadiga, dispneia e síncope ao esforço, que decorrem da insuficiência cardíaca e pulmonar. Dentre os diversos métodos disponíveis para o diagnóstico dos problemas cardíacos induzidos pela HAP, o eletrocardiograma pode ser utilizado para registrar alterações na atividade elétrica cardíaca e na determinação do grau de hipertrofia do ventrículo direito. O ventrículo direito tem uma estrutura de paredes delgadas e bombeia o sangue em baixa pressão para o sistema vascular pulmonar com alto fluxo. Em decorrência, a HAP impõe mudanças compensatórias no lado direito do coração através de um remodelamento cardiovascular devido ao aumento da carga de trabalho, levando à hipertrofia ventricular compensatória. Essa doença, altamente incapacitante, limita sensivelmente a atividade física do individuo, afetando sua qualidade de vida.

A melatonina, hormônio produzido pela glândula pineal, situada entre os hemisférios cerebrais, é sintetizada predominantemente à noite, pois a luminosidade tem efeito inibitório na sua produção. Diversos estudos têm demonstrado a participação do hormônio melatonina na regulação do sistema cardiovascular, o que viabiliza seu uso no estudo dos efeitos deletérios da HAP. A melatonina possui efeito vasodilatador e, consequentemente, diminui a pressão arterial sistêmica, reduzindo, então, a resistência periférica, além de exercer efeito cardioprotetor devido a sua ação antioxidante.

Desde o mestrado, em que estudou a indução da HAP em animais com a utilização da substância monocrotalina, o educador físico Luiz Alberto Ferreira Ramos tem se dedicado ao estudo dessa doença. No doutorado seu objetivo principal foi demonstrar que a melatonina reduz alterações deletérias cardíacas e pulmonares em ratos Wistar portadores de hipertensão arterial pulmonar induzida por monocrotalina.  O trabalho foi realizado no Laboratório de Estudos do Estresse (LABEEST), da professora Dora Maria Grassi Kassisse, do Departamento de Biologia Estrutural e Funcional do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, sob a orientação do professor Miguel Arcanjo Areas.

Na tese apresentada junto ao IB, o pesquisador conclui que a melatonina aumentou as defesas enzimáticas antioxidantes do coração, minimizando os efeitos deletérios da HAP sobre o sistema cardiovascular, no modelo animal, podendo vir a se constituir em nova abordagem terapêutica no tratamento da hipertensão arterial pulmonar de humanos.

O trabalho “Melatonina previne alterações cardiovasculares em ratos portadores de Hipertensão Arterial Pulmonar induzida por monocrotalina” teve apresentação oral do autor no XV Simpósio Brasileiro de Fisiologia Cardiovascular realizado na Universidade de São Paulo - USP, em 2011. O mesmo estudo foi publicado na revista Circulation - Jornal of the American Heart Association, em abril de 2012, época em que foi também apresentado em pôster no World Congress of Cardiology, realizado em Dubai, nos Emirados Árabes.

Três trabalhos de Luiz Alberto foram publicados, em 2014, no periódico Global Heart Journal: “Melatonin reduces the pulmonar vasoconstriction in rats with Pulmonar Arterial Hypertension (PAH) induced by monocrotaline”; “Melatonin Protects Against Cardiovascular Alterations In Rats With Pulmonary Arterial Hypertension (PAH) induced by monocrotaline”; e  “Melatonin Protects Against Hemodynamic Alterations In Rats With Pulmonary Arterial Hypertension (PAH) Induced By monocrotaline”. Nesse mesmo ano esses estudos foram apresentados, na forma de pôster, no World Congress of Cardiology, realizado em Melbourne, Austrália. A pesquisa foi patrocinada pela Coordenadoria de Apoio à Pesquisa - Capes.

Equipamento usado nos experimentos

O que foi feito

Luiz Alberto explica: “No doutorado, o meu objetivo foi verificar o efeito da melatonina depois de instalada a doença no modelo animal e como poderiam ser atenuados os seus efeitos deletérios utilizando-se da melatonina como substância cardioprotetora”.

Para a execução da parte experimental o pesquisador distribuiu os animais por quatro grupos de cinco componentes: um grupo de controle, constituído por animais sadios; outro com animais igualmente sadios que recebiam apenas uma dose diária de melatonina; um terceiro em que a doença foi induzida pela monocrotalina, mas que não seriam tratados; e um quarto grupo com a doença induzida, mas que receberia diariamente uma dose de melatonina.  Nestes dois últimos grupos a doença foi instalada com o emprego de uma dose única de monocrotalina.

Quinze dias depois, tempo necessário à instalação da HAP, iniciou-se a administração da melatonina no quarto grupo durante treze dias. Os outros grupos foram usados como controle.  Com isso, o pesquisador pode comparar as diferenças observadas nos parâmetros de controle, mais particularmente entre os dois grupos que têm a doença, em que um foi tratado com melatonina e outro não. Do primeiro ao último dia, durante os 28 dias da duração do experimento, que começou com a administração da monocrotalina, em intervalos periódicos, foram realizados eletrocardiogramas que permitiram avaliações cardiovasculares do desenvolvimento dos animais de todos os grupos.

Com base nessas análises Luiz Alberto observou que, quanto aos parâmetros cardíacos observados, não havia muita diferença entre os componentes do grupo que recebeu apenas melatonina e o de controle. Por outro lado, no grupo sob o efeito da monocrotalina, mas que não recebeu melatonina, ele observou um coração hipertrofiado, pouco irrigado e apresentando aspectos isquêmicos característicos.  Por sua vez, os animais portadores de HAP e tratados com melatonina mostraram uma sensível melhora quanto a esses parâmetros. O autor esclarece que a melatonina não reverte o quadro, mas o atenua, diminuindo o efeito da lesão instalada e garantindo maior sobrevida ao animal.

Para determinar a atividade elétrica cardíaca e aspectos hemodinâmicos sistêmicos e ventriculares, o pesquisador utilizou eletrocardiógrafo específico para ratos, assim como procedimentos cirúrgicos para determinação de diversos parâmetros hemodinâmicos. Além disso, ele avaliou também a reatividade vascular da artéria pulmonar “in vitro”, nos diversos grupos experimentais. Constatou, então, que ocorreram melhoras em todo o sistema cardiovascular do animal, assim como em aspectos pulmonares.

Detalhamentos

Os resultados mostraram que nos animais que receberam apenas a dose única da monocrotalina, os vasos estavam bem contraídos.  Já no grupo doente tratado com melatonina, esses vasos encontravam-se mais dilatados, o que comprova que a melatonina promoveu uma melhora da perfusão do tecido, ou seja, irrigou-o tornando-o mais saudável e não tão afetado.

Quanto à reatividade vascular pulmonar, as artérias dos animais com HAP tratados com melatonina, apresentaram maior vasodilatação, conferindo assim, melhor perfusão tecidual devido ao seu efeito antioxidante.

Para determinação dos marcadores de lesão cardíaca, foram utilizadas técnicas de biologia molecular (citometria de fluxo e western blot), analisando as proteínas contráteis cardíacas (troponina i) e enzimas antioxidantes, demonstrando que melatonina exerceu efeito protetor contra a lesão. Assim, a ação antioxidante da melatonina possibilita sua utilização como eventual coadjuvante no tratamento dessa doença.

 

Publicação

Tese: “Melatonina reduz alterações deletérias cardíacas e pulmonares em ratos portadores de hipertensão arterial pulmonar induzida por monocrotalina”

Autor: Luiz Alberto Ferreira Ramos

Orientador: Miguel Arcanjo Areas

Unidade: Instituto de Biologia (IB)

Financiamento: Capes