Edição nº 572

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 26 de agosto de 2013 a 01 de setembro de 2013 – ANO 2013 – Nº 572

Dissertação avalia impacto
da internacionalização de empresas

No início do século, países em desenvolvimento começaram
uma expansão inédita de suas empresas para o Exterior

“As políticas públicas de apoio à internacionalização empresarial são ainda incipientes no Brasil, apesar do aumento da preocupação com o tema por parte do governo nos últimos anos.” A afirmação faz parte da dissertação de mestrado apresentada no programa de pós-graduação do Instituto de Economia da Unicamp pelo economista Newton Kenji Hamatsu, que analisou esse fenômeno atual da economia a partir das experiências de Brasil, China e Índia.

Ainda não sabe o que é internacionalização? Lembra que as empresas dos países desenvolvidos, no passado, expandiam filiais de multinacionais para o resto do mundo, principalmente para as nações [então] subdesenvolvidas? Pois nas últimas décadas, países em desenvolvimento, como o Brasil, começaram a levar suas empresas, em dois sentidos, para o exterior: rumo a países desenvolvidos e para outros também em desenvolvimento.

“Cada vez mais a economia não se baseia em países, mas em grandes corporações, empresas. Então se você não fortalecer suas empresas, você não será competitivo globalmente”, afirma o autor do trabalho, realizado sob a orientação do professor Célio Hiratuka, do Instituto de Economia (IE). “A internacionalização é importante e tem que ser apoiada pelo governo, não só com financiamento direto”, explica Hamatsu.

Conforme o trabalho, o estoque de investimento direto externo realizado pelo Brasil saltou de US$ 52 bilhões em 2000 para US$ 181 bilhões em 2010. No mesmo período, na China, esse montante saltou de US$ 28 bilhões para US$ 298 bilhões. Na Índia, saiu de US$ 1,7 bilhão para US$ 92 bilhões. “Uma característica marcante do movimento recente de internacionalização tem sido o aumento da participação dos países em desenvolvimento como origem dos investimentos”, afirma o autor na dissertação. Na década de 70, esses países foram responsáveis, em média, por 1% dos fluxos de investimentos diretos externos realizados. Na década de 80, esse número saltou para 6%, chegou a 12%, nos anos 90, e a 17% nos anos 2000. “Em 2009, essa participação foi de 27%, ao passo que em 2010 atingiu 29% [quando atingiu a cifra recorde de US$ 388 bilhões em investimentos].”

Brasil, China e Índia foram escolhidos para o estudo, de acordo com o autor, em razão da crescente internacionalização de suas empresas e das perspectivas políticas e econômicas no cenário mundial. Em comum, os três países integram o grupo de cinco nações que fazem parte dos “BRICS”, ao lado de Rússia e África do Sul.

Como “internacionalização”, a pesquisa realizada na Unicamp considerou como sendo “os investimentos realizados em outros países em que haja interesse duradouro em uma ou mais empresas e/ou projetos, e em cuja gestão se deseja influir de modo efetivo”. Não estão incluídas nessa definição as exportações realizadas pelas empresas.

Na análise, o autor buscou traçar um panorama geral do processo de internacionalização nos três países, identificar pontos em comum e as principais diferenças nos investimentos realizados. “Desde o início da década de 1980, os fluxos de investimento direto externo cresceram a taxas muito superiores às do produto global”, afirma o economista.

Mas que vantagens a internacionalização traz para um país? Segundo o autor do estudo, em médio prazo, as empresas transnacionais começam a gerar dividendos como se estivessem exportando mercadorias, por exemplo. Além disso, nas sedes, ou seja, nos países de origem, estão os melhores empregos oferecidos, os mais bem remunerados e qualificados, mas também as pesquisas e o desenvolvimento de novas tecnologias. Todos esses fatores servem para gerar renda, empregos e aquecer a economia.


Análise

“A ideia [do estudo] era entender melhor a situação do Brasil, por isso a comparação com outros países que, além de integrarem os BRICS e registrarem crescimento, viveram o mesmo fenômeno no mesmo período, nos anos 2000”, explica Hamatsu, ao justificar as economias selecionadas para a pesquisa de mestrado.

Segundo o economista, no Brasil, a internacionalização tornou-se uma política explícita do governo federal com o lançamento da Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) em 2007, que destacou a necessidade de se expandir a liderança internacional em setores como os de mineração, petróleo e petroquímica, celulose e papel, e carnes. Na época, as empresas com potencial de “internacionalização” ganharam o apelido de “campeãs nacionais”.

Em 1990, como exemplo do crescimento da participação dos países em desenvolvimento no mercado global, 19 das 500 maiores do mundo eram originárias dessas nações em expansão. Em 20 anos, esse número saltou para 95 (número cinco vezes maior), com destaque para países como Coreia do Sul e Taiwan, com 18 empresas no total, mas que começaram antes esse processo de internacionaliza, segundo a revista Fortune. Nesse mesmo ranking (2010), 7 empresas eram brasileiras, 46 chinesas e 8 indianas – em comum, essas três nações começaram a participar mais tarde desse processo de expansão internacional.

No contexto das empresas transnacionais, conforme o estudo, a ajuda dos governos tem sido fundamental. “Todos os grandes países, hoje, ainda ajudam suas grandes empresas ou as ajudaram num passado recente, como no caso da Alemanha, Coreia do Sul, Japão e Estados Unidos”, afirma Hamatsu. Como exemplo, menciona o caso da fabricante de celulares Nokia, que centraliza em sua sede, na Finlândia, grande parte das pesquisas realizadas e dos melhores empregos oferecidos.

No caso brasileiro, a pesquisa apontou os seguintes fatores como determinantes para o processo de internacionalização: a melhoria dos preços relativos das commodities (que possibilitou maior lucratividade das empresas nacionais); o elevado grau de maturidade das empresas nacionais; a valorização do Real (que permitiu que ativos localizados no exterior se tornassem mais atrativos); a estabilidade macroeconômica (que facilitou o planejamento de médio e longo prazo das empresas); além do fortalecimento do mercado de capitais e da conjuntura internacional de excesso de liquidez que reduziu o custo de capital.

“Os investimentos chineses e indianos, por sua vez, tiveram como elemento comum o aumento das reservas internacionais. Na China, esse fator aliado à maior liberalização financeira do país e às crescentes necessidades de recursos naturais fizeram com o que o governo, por meio da política ‘China Going Global’, passasse a apoiar fortemente este processo de internacionalização, conduzido principalmente pelas estatais. Já na Índia, as melhores condições macroeconômicas fizeram com que o governo passasse de uma posição de restrição aos investimentos para outra de apoio. A grande disponibilidade de mão de obra barata e de qualidade e a proteção ao mercado interno (que propiciou o desenvolvimento de grande número de empresas locais) foram também preponderantes nesse processo”, escreveu o economista na conclusão da dissertação de mestrado.


Conclusões

Uma das principais diferenças entre os processos de internacionalização dos três países, de acordo com o autor, foi o diferente nível de apoio governamental. Segundo ele, no Brasil, o apoio governamental baseou-se basicamente em financiamentos liberados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). “Na China, a participação foi mais direta, já que além de conduzir o processo diretamente por meio de suas estatais, o governo concedeu empréstimos subsidiados, contribuição direta de capital e subsídios associados com os programas de apoio oficiais. Já na Índia, o principal papel do Estado foi facilitar os procedimentos para a internacionalização das empresas do país, como resposta a um cenário externo mais positivo, e o consequente aumento das reservas.”

Em abril deste ano, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, disse ao jornal O Estado de S.Paulo, que a “promoção de competitividade de grandes empresas de expressão internacional é uma agenda que foi concluída”, que a política tinha “méritos” e chegou “até onde podia ir”, em razão do número de setores com potencial para projetar empresas líderes, mencionando segmentos como os de petroquímica, celulose, frigoríficos, siderurgia, suco de laranja e cimento. “Não enxergo outros com o mesmo potencial”, disse à época.

Ao longo de seis anos de uma política de incentivo às “campeãs nacionais”, empresas que receberam incentivos para expandir pelo mundo, o BNDES investiu mais de R$ 18 bilhões, mas algumas delas, hoje, passam por situação financeira delicada.

Publicação
Dissertação: “O processo de internacionalização das empresas de Brasil, China e Índia no período recente”
Autor: Newton Kenji Hamatsu
Orientador: Célio Hiratuka
Unidade: Instituto de Economia (IE)