Edição nº 525

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Jornal da Unicamp

Baixar versão em PDF Campinas, 07 de maio de 2012 a 13 de maio de 2012 – ANO 2012 – Nº 525

Tecnodados



O geoprocessamento utiliza o mundialmente conhecido Sistema de Informação Geográfica (SIG), que constitui um ferramental de que pesquisadores e estudiosos se valem para analisar dados. Esse sistema evoluiu simultaneamente com o poder de processamento dos computadores. Antes desse avanço tecnológico, os dados referentes às populações de determinada região eram representados separadamente em mapas desenhados em papel transparente cuja superposição permitia leitura conjunta em uma mesa de luz. A informática possibilitou reunir, organizar e gerenciar essas informações, facilitando suas análises e a exportação ou a impressão de forma a disponibilizá-las para estudiosos.

O pesquisador Alberto Augusto Eichman Jakob é responsável pela linha de geoprocessamento do Núcleo de Estudos de População (Nepo) da Unicamp. Estatístico, com mestrado em engenharia agrícola e doutorado em demografia, ele tem particular experiência em distribuição espacial de população, geoprocessamento e estatísticas espaciais. Atualmente é membro do Conselho Técnico Científico e do Conselho Superior do Nepo e professor colaborador do Programa de Pós-Graduação em Demografia da Unicamp.

O geoprocessamento perpassa todas as áreas de pesquisa do Nepo e por isso tem caráter transversal. Permite que uma ideia adquira consistência prática, auxilia na coleta de informações e contribui para a tradução dos seus significados. Esta circunstância leva o pesquisador a participar em geral de projetos conjuntos de diversas áreas temáticas do Núcleo. Atualmente, ele está trabalhando mais especificamente em um Projeto Universal do CNPq cujo tema é a "Migração internacional da fronteira norte do Brasil: mobilidade espacial, segregação e vulnerabilidade". Iniciado no final de 2010, o estudo se encerra no final deste ano. Nesse projeto ele utilizará os dados do Censo de 2010, recém-divulgados pelo IBGE, o que lhe permitirá abarcar o período de 2000 a 2010. Anteriormente, ele se dedicara ao período 1995/2000, utilizando o Censo de 2000.

Jakob explica que utiliza o geoprocessamento no estudo dos fluxos que chegam à região Norte: "Com base nas tabelas do IBGE, que mostram quantos migrantes chegaram à região, posso determinar para quais municípios eles se direcionam preferencialmente, caracterizando os perfis dos egressos dos diferentes países e o que os diferenciam em relação aos habitantes das regiões em que mais se concentram. Consigo prever inclusive o local preferencial de destino das várias origens. Caso haja interesse em detalhes mais específicos, por exemplo, sobre os colombianos, basta pegar o município onde eles se concentram e centrar o estudo nesse contingente. Consegue-se assim determinar os setores censitários [delimitação intramunicipal utilizada pelo IBGE] mais ocupados por esses migrantes, suas condições socioeconômicas, mais especificamente o que fazem, como moram, etc. O geoprocessamento permite tudo isso".

A maior contribuição do geoprocessamento nessa área é a de ter aberto a possibilidade de localização bem específica dos migrantes, ao nível de bairros e até de setores censitários (menores que os bairros). A localização dos setores com maior concentração de migrantes possibilita o estudo de segregação socioespacial e permite determinar as características desses setores e de suas populações e o que os diferencia dos demais no município.

A migração na região Norte revelou-se mais curta em termos de deslocamentos e por isso predomina em torno das fronteiras dos países limítrofes. Com base nos grupos migratórios mais significativos que atingem a região – provenientes de Peru, Colômbia, Bolívia e Paraguai – o pesquisador determina as principais características socioeconômicas dos migrantes desses países, como renda, escolaridade, ocupação, entre outras. Comparando-as com as dos residentes e considerando o volume de migrantes, estabelece o possível impacto local.

A análise permite dimensionar as consequências resultantes dessas migrações, possibilitando que as administrações municipais localizem problemas e adotem iniciativas que contribuam para a melhoria da qualidade de vida dos migrantes e do município. Para o pesquisador, se o espaço é importante nas análises, então o geoprocessamento é a ferramenta adequada. "Com sua utilização, por exemplo, é possível comparar os fluxos migratórios através de algumas variáveis e verificar que tipos de trabalho os migrantes procuram. Os dados do IBGE indicam a situação no momento do censo. O quadro comparativo se completa com a utilização dos censos dos países envolvidos e dados coletados por outros centros de estudos".

Migração amazônica

Em trabalho apresentado no VII Encontro Nacional sobre Migrações, realizado em Curitiba em outubro de 2011, Alberto Jakob faz um resumo dos estudos que já desenvolveu sobre "A migração internacional na Amazônia brasileira". O trabalho deu ênfase aos migrantes provenientes de países que fazem fronteira com a Amazônia, como Peru, Bolívia, Colômbia e ainda o Paraguai, que, embora não fronteiriço, encontra-se muito próximo. Ao analisar esses migrantes, o autor compara idade, nível de escolaridade e de renda, sexo e ocupação no destino, assim como o período em que chegaram ao país. Mostra também a suas localizações, distinguindo os residentes em municípios ao longo da fronteira, em grandes cidades e capitais de estado.

Para o estudo, que abarca o período de 1995/2000, utilizou dados do Censo Demográfico de 2000 atualizados pela Contagem Populacional de 2007. Mesmo considerando a proximidade do censo de 2010, o autor justifica a discussão mais detalhada dos dados referentes à migração internacional na Amazônia Legal brasileira – constituída fundamentalmente pelos estados da região Norte, Mato Grosso e Maranhão – por considerar pouco estudados os dados desse período e local.

Com base nesse trabalho, o pesquisador identifica três situações distintas em termos de entrada dos imigrantes internacionais nos estados que compõem a Amazônia Legal brasileira. A primeira acontece nas áreas de fronteira internacional, em que a circulação de pessoas é regulada por um conjunto de regras específicas. É o caso principalmente de bolivianos e, em menor escala, de peruanos e colombianos. A segunda caracteriza-se pela busca de centros urbanos maiores, como as capitais estaduais e alguns polos regionais. É o que acontece, mais pronunciadamente, com peruanos e colombianos. A terceira envolve a busca por áreas de ocupação de territórios fronteiriços, que existia ainda na década de 1990. Neste grupo, encaixam-se principalmente os paraguaios.

Em relação aos aspectos socioeconômicos, ele destaca os peruanos, cujos chefes de família têm renda média mensal superior a 20 salários mínimos (25%), e entre os quais aparece importante concentração de ocupação por "conta própria". Entretanto, em termos de ocupação, a maior parte dos chefes imigrantes dos quatro grupos de nacionalidade estudadas encontrava-se na situação de "emprego sem carteira de trabalho assinada", o que configura uma inserção precária no mercado de trabalho.

Jakob entende que a melhoria das condições de comunicação e transportes com os países vizinhos pode vir a ser determinante no aumento da mobilidade populacional com os países próximos, processo que se vaticina com desdobramentos significativos para a região.


Novo projeto

Durante essas pesquisas, Jakob se deu conta da escassez de trabalhos relacionados à migração na Região Norte do País, particularmente em relação aos últimos anos. Embora estudos mais recentes apontem queda na imigração estrangeira no Brasil até o ano 2000, dados posteriores parecem indicar mudanças nesta situação. Neste contexto, ganha importância a migração recente dos países fronteiriços à região Norte.

Um estudo da mobilidade populacional nas áreas de fronteira permite conhecer mais detalhadamente esse processo migratório que vem ganhando força mais recentemente. Com base em análises realizadas sobre regiões de estudo previamente selecionadas podem-se inferir os padrões de comportamento dos migrantes e brasileiros e também as características dos locais de que saem e em que chegam.

O pesquisador considera essa análise fundamental para subsidiar políticas públicas específicas que atendam às necessidades destes migrantes e permitam criar condições que facilitem sua integração na sociedade brasileira. Estas constatações o levaram a trabalhar desde o final de 2010 em um projeto Universal do CNPq, com o intuito de fechar um levantamento da situação entre 2000 e 2010.

O projeto em questão tem como objetivo o estudo da mobilidade espacial recente da população na fronteira norte do País, seja através das migrações internas ou internacionais, seja através da mobilidade populacional diária, assim considerados os deslocamentos realizados através das fronteiras por necessidade de trabalho. Nesses casos, os deslocamentos são realizados pelos trabalhadores principalmente por meio de ônibus ou táxis-lotações que vão de determinadas cidades ou até mesmo de capitais estaduais como Boa Vista (Roraima) à Venezuela e até para a Guiana.

O estudo envolve ainda a definição do perfil socioeconômico dos migrantes em todos esses tipos de deslocamentos e as condições e qualidades de vida atuais. O que chamou particularmente a atenção do pesquisador é a vinda dos haitianos. Os dados de 2009 mostram que eram até então pouquíssimos. Daí para o frente, o crescimento desse fluxo se mostrou exponencial, gerando problemas para os migrantes e para as cidades que os recebem.

O estudo, conclui Alberto Jakob, persegue o entendimento maior sobre as pessoas que estão chegando à região Norte, o delineamento de algumas de suas características socioeconômicas principais e a determinação do tipo de impacto que podem produzir nos municípios de destino. Teoricamente, a pesquisa pode criar demandas para projetos sobre questões específicas. Na prática, a expectativa é a de que forneça subsídios para orientar, ajudar e incentivar a implementação de políticas públicas nos municípios brasileiros envolvidos.