“Precisamos de mais diversidade na ciência”, diz Jaqueline Goes

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“Quantos aqui nesta sala são alunos de pós-graduação?” perguntou a palestrante, que viu quase a totalidade da plateia erguer os braços, no encerramento do V Encontro de Pós-graduação em Genética e Biologia Molecular da Unicamp. “Quantas são mulheres?”, um pouco mais da metade da audiência levantou os braços. “Quantas se consideram negras?”, menos de dez braços acenavam em uma plateia de cerca de 140 pessoas. “Quantas se consideram indígenas?”, nenhum braço avistado. “Quantas aqui são mulheres-trans?”, os olhos da palestrante custaram a encontrar um ou dois braços na plateia.

E foi assim que Jaqueline Goes, biomédica de 33 anos, que ficou famosa por coordenar o primeiro sequenciamento genético do novo coronavírus no Brasil em 2020, provocou a plateia no Centro de Convenções da Unicamp no dia 10 (sexta-feira). Jaqueline e a equipe de pesquisadoras do Instituto de Medicina Tropical da Universidade de São Paulo fizeram o primeiro mapeamento genético do coronavírus na América Latina em apenas 48 horas — enquanto a média mundial era de cerca de 15 dias. O primeiro caso no Brasil foi confirmado entre 25 e 26 de fevereiro de 2020, e, no dia 28, o sequenciamento do SARS-CoV-2 estava feito.

Em 13 de março do mesmo ano, a Unicamp suspendeu as atividades presenciais em seus campi, sendo a primeira universidade do país a adotar o distanciamento social. “O pioneirismo da Unicamp encorajou outras instituições a assumirem a mesma posição. Esta foi uma decisão acertada”, relembra a pesquisadora.

Quatro meses após o sequenciamento, as pesquisadoras e seus colaboradores publicaram um estudo na revista Science, mostrando que as cidades que mais recebem voos da Europa (São Paulo, Rio de Janeiro e Fortaleza) também eram as que mais cresciam em o número de casos positivos de covid-19. “Estávamos importando vírus”, resumiu Goes. Isto reforçava a necessidade de medidas de isolamento social. “Sou uma das responsáveis pelo lockdown”, brincou a palestrante.

A fama rendeu à pesquisadora inúmeros reconhecimentos, como a Comenda Zilda Arns e o Prêmio Mulheres na Ciência Amélia Império Hamburger. Ela também coleciona homenagens públicas. Figurou na lista Forbes das 20 Mulheres de Sucesso do Brasil em 2022. Já desfilou na São Paulo Fashion Week e foi convidada especial do desfile da escola de samba carioca Beija-Flor de Nilópolis, em 2022, cujo enredo exaltava o povo negro. Além disso, Jaqueline Goes se tornou personagem de Maurício de Sousa e virou uma boneca Barbie, numa homenagem da fábrica de brinquedos às mulheres que atuaram na linha de frente da luta contra a covid-19.

A repercussão de sua imagem assustou Jaqueline, que, na época, considerava o que fez “mais do mesmo”, preocupando-se também porque não havia feito nada sozinha. Na ocasião do sequenciamento, Goes integrava a equipe do laboratório de Ester Sabino (USP) junto com outras pesquisadoras. “Aos poucos, fui entendendo que essa exposição era importante para a ciência e para inspirar outras mulheres e negras.” Hoje, Goes é coordenadora da Rede Colaborativa de Sequenciamento Genético no Brasil (Rede SEQV Br) e aproveita sua projeção para falar sobre ciência e dar voz às questões de representatividade feminina e negra.

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A pesquisadora Jacqueline Goes é coordenadora da Rede Colaborativa de Sequenciamento Genético no Brasil: "Assim como a representatividade feminina na ciência é urgente, a de raças também"

Representatividade na Ciência

“Por que as mulheres não estão em todas as instâncias de decisão, já que somos 50% da população? O homem pode ter muita empatia, mas não é mulher”, pontua a pesquisadora, ao mostrar as estatísticas que apontam a preponderância de homens na ascensão da carreira acadêmica.

Assim como a representatividade feminina na ciência é urgente, a de raças também, defende a biomédica. Um exemplo é o caso do aparelho usado para detectar a porcentagem de oxigenação no sangue por meio de luzes infravermelhas, o oxímetro, que foi bastante usado durante a pandemia de covid-19. O aparato médico apresentou falhas de até 8% em indivíduos negros, latinos e indígenas. A grande probabilidade é que os oxímetros tenham sido calibrados tendo peles claras como referência. A situação se agrava quando consideramos que pessoas negras são as que mais morrem de covid-19 no Brasil.

“Quem faz pesquisa em negros é branco. Assim, não tem como trazer a vivência desta população. Não dá para fazer pesquisa em negros, sem incluir negros. Da mesma forma, com asiáticos, indígenas, trans, sem trazer pesquisadores representantes destes grupos. Não se trata de apenas ter um grupo diverso, e sim de trazer outros olhares” explica Goes. “Meus questionamentos sobre reproduzir uma ciência branca, masculina e europeia só vieram no doutorado”, conta Goes. “O método está acontecendo a todo instante. Mas precisamos pensar em como ele se deu”, pontua a biomédica.

Segundo a palestrante, para alterar esta realidade, precisamos de mais diversidade na ciência. Para isso, cita a importância das políticas de mobilidade social, o investimento em educação, o incentivo à ciência, a criação de oportunidades — como, por exemplo, a política de cotas — e de estarmos abertos a novas colaborações na ciência. “O mundo hoje está a um e-mail de distância. Arrisque-se a sair da sua zona de conforto”, encoraja Goes.

“A base da pirâmide [populacional brasileira] é muito preta e feminina. Quando essas mulheres se movimentam, como diria Angela Davis, toda a sociedade se movimenta”, cita a palestrante. “Se não houver oportunidades, isso não vai acontecer”, finaliza.

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Jaqueline Goes e a equipe de pesquisadoras do Instituto de Medicina Tropical da USP fizeram o primeiro mapeamento genético do coronavírus na América Latina em apenas 48 horas — enquanto a média mundial era de cerca de 15 dias

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