 Quem 
                      hoje em dia não conhece pelo menos um amigo ou colega que 
                      “explodiu” em músculos de uma hora para outra? Em seis meses 
                      essa pessoa, em geral jovem, salta de míseros 55 kg para 
                      80 kg ou mais de pura massa muscular. A antiga camiseta 
                      de banda de rock cede espaço à regata ou baby look. Em academias 
                      ou em raves há chance de encontrá-lo exibindo seus músculos 
                      hipertrofiados. Embora muitas vezes a família nem desconfie, 
                      quem convive com esses jovens logo identifica a causa de 
                      tantas mudanças físicas e comportamentais repentinas. Seu 
                      nome: esteróides anabolizantes.
Quem 
                      hoje em dia não conhece pelo menos um amigo ou colega que 
                      “explodiu” em músculos de uma hora para outra? Em seis meses 
                      essa pessoa, em geral jovem, salta de míseros 55 kg para 
                      80 kg ou mais de pura massa muscular. A antiga camiseta 
                      de banda de rock cede espaço à regata ou baby look. Em academias 
                      ou em raves há chance de encontrá-lo exibindo seus músculos 
                      hipertrofiados. Embora muitas vezes a família nem desconfie, 
                      quem convive com esses jovens logo identifica a causa de 
                      tantas mudanças físicas e comportamentais repentinas. Seu 
                      nome: esteróides anabolizantes.
                    Estudar as relações de causa e efeito do 
                      uso de anabolizantes em alta dosagem é a tarefa a que vem 
                      se dedicando a equipe da bióloga Fernanda Klein Marcondes, 
                      professora de Fisiologia da Faculdade de Odontologia de 
                      Piracicaba (FOP). A literatura médica há bastante tempo 
                      tem associado os esteróides a uma série de malefícios que 
                      acometem seus usuários. Entretanto, para se estabelecer 
                      uma relação desses efeitos com suas respectivas causas é 
                      preciso considerar todo um contexto: hábitos de vida, a 
                      rotina de treinamento físico intenso e o uso simultâneo 
                      de vários anabolizantes e de suplementos alimentares, entre 
                      outros fatores. 
                    “Por força desse contexto é que os nossos 
                      estudos controlados foram feitos em ratos de laboratório. 
                      Apenas dessa maneira é que se pode dizer que certa substância 
                      em dosagem x causa o efeito y. Só assim é possível, também, 
                      esclarecer os mecanismos que causam esse efeito e as formas 
                      de evitá-lo ou até mesmo revertê-lo”, observa a docente. 
                      Sem contar o problema ético da realização desse tipo de 
                      pesquisa em humanos. “Seria inaceitável, do ponto de vista 
                      ético, convocar voluntários humanos saudáveis para um estudo 
                      em que eles recebessem hormônios, como é o caso dos anabolizantes. 
                      A administração de hormônios somente deve ocorrer em casos 
                      de patologia, e com acompanhamento médico”.
                    Financiada pela Fapesp, a pesquisa de Marcondes 
                      teve início em 2002 e contou com a colaboração de pesquisadores 
                      da PUC-Campinas, da UFSCar e da área de Histologia da FOP. 
                      Seu objetivo era analisar os efeitos cardiovasculares, metabólicos 
                      e comportamentais que o anabolizante mais usado no Brasil 
                      e no mundo, o decanoato de nandrolona (conhecido pelo nome 
                      comercial Deca-durabolin), causa nos indivíduos. 
                                          Para a análise cardiovascular, que foi a que apresentou 
                      os resultados mais alarmantes à saúde, a metodologia de 
                      pesquisa da equipe da FOP se deu da seguinte forma. Espécimes 
                      masculinos da raça Wistar com dois meses de idade foram 
                      separados em quatro grupos. O primeiro era o dos que não 
                      passaram pelo treinamento de força e foram tratados com 
                      placebo (não ingeriram anabolizante). No segundo estavam 
                      os não-treinados que receberam a nandrolona. O terceiro 
                      continha os que foram tratados com nandrolona e não treinaram 
                      e, no último, os treinados e tratados com anabolizante.
                    A quantidade de decanoato de nandrolona 
                      utilizada foi de 5 mg por kg do animal, duas vezes por semana, 
                      durante seis semanas. Isso equivale a uma dosagem em humano 
                      de cerca de 800 mg por semana. Trata-se de uma super dosagem. 
                      Em conversa com usuários veteranos de anabolizante e em 
                      fóruns sobre o tema na internet, constata-se que a média 
                      semanal de aplicação é 200 mg, em ciclos que vão de dois 
                      a quatros meses. No entanto, essa substância geralmente 
                      é usada em conjunto com um preparado de quatro ésteres de 
                      testosterona, chamado comercialmente de Durateston, cujo 
                      consumo fica na casa de 500 mg por semana.
                    O treinamento de força a que foram submetidos 
                      os animais foi realizado em um tanque com 38 cm de altura 
                      de água a uma temperatura de 300 C (ideal para atividade 
                      física na água). Nas costas dos ratos se colocou um colete 
                      que pesava entre 50% e 70% do peso corpóreo. Esse colete 
                      fazia com que o animal afundasse na água e precisasse saltar 
                      para respirar. A cada 10 saltos ele era retirado do tanque 
                      para descansar por um minuto. O procedimento era repetido 
                      quatro vezes ao dia. O quinto e sexto dias eram de descanso.
                                          “Sabemos que o correto seria um dia de treino para um ou 
                      dois dias de descanso. No entanto, não é isso que fazem 
                      os usuários de esteróides anabolizantes. Nós queríamos reproduzir 
                      um ambiente semelhante ao que se vê nas academias. Por isso 
                      foi feito treinamento de alta intensidade, com menor período 
                      de descanso”, diz a pesquisadora.
                    Efeitos
                      Os resultados dessa pesquisa mostraram que o volume do coração 
                      dos membros de todos os grupos, menos o dos sedentários 
                      que não receberam anabolizante, sofreu um aumento concêntrico 
                      (de fora para dentro). Isso significa que as paredes das 
                      cavidades cardíacas ficaram mais espessas, e seu diâmetro 
                      interno menor. Isso faz com que seja menor o espaço para 
                      a entrada de sangue a ser bombeado pelo coração.
                    Esse efeito causado pelo fisiculturismo 
                      já é conhecido pela comunidade científica. “Só que dentro 
                      de alguns limites isso não causa prejuízo à função cardíaca 
                      porque, a princípio, é compensado por um aumento de força 
                      do coração”, afirma Fernanda. Porém, nos animais em que 
                      houve associação do uso de anabolizante ao treinamento intenso, 
                      a hipertrofia foi acompanhada por uma deficiência no bombeamento 
                      cardíaco.
                    Essa conclusão se deu depois que os grupos 
                      de animais pesquisados passaram por um exame chamado ecodopplercardiograma, 
                      em estudo feito juntamente com a professora Maria Claudia 
                      Irigoyen, do Incor/USP. Semelhante ao ultra-som, o ecodoppler 
                      cria uma imagem do coração e do seu funcionamento no qual 
                      é possível fazer medidas do coração e analisar o fluxo de 
                      sangue durante o seu funcionamento.
                    No grupo treinado com anabolizante não se teve apenas um 
                      aumento de massa muscular, mas também de fibras de colágeno 
                      (tecido conjuntivo). Enquanto o grupo treinado sem nandrolona 
                      ficou com o nível de colágeno estabilizado em 3µm2, o treinado 
                      com nandrolona saltou para 33µm2. “Essas fibras fazem parte 
                      da estrutura do coração, mas não participam do bombeamento 
                      de sangue. Tem-se um coração maior, mas não mais eficiente. 
                      Ao contrário, há maior resistência a esse bombeamento”, 
                      completa a bióloga.
                    Na literatura médica existem vários estudos de caso que 
                      relatam mortes súbitas de fisiculturistas usuários de anabolizantes 
                      relacionadas a esse aumento concêntrico do coração. “O que 
                      a nossa pesquisa mostra agora é que, com certeza, uma parcela 
                      disso se deve ao anabolizante, e outra ao treinamento intenso 
                      de força; as duas coisas juntas amplificam os efeitos. A 
                      relação causa e efeito está bem-estabelecida e confirmada 
                      pelo experimento”, alega Fernanda. 
                     O 
                      trabalho da professora analisou não apenas o coração, mas 
                      também o sistema vascular por onde o sangue circula dentro 
                      do corpo. Os pesquisadores da Unicamp queriam saber se o 
                      uso de anabolizante alteraria a capacidade do vaso sangüíneo 
                      se dilatar ou passar por contração conforme a necessidade 
                      do organismo. Essa função dilatadora é extremamente importante 
                      para manter a pressão sangüínea e a temperatura corpórea 
                      regulada diante de movimentos do corpo ou de alterações 
                      da temperatura do ambiente, assim como para fazer o sangue 
                      chegar a todos os tecidos corpóreos.
O 
                      trabalho da professora analisou não apenas o coração, mas 
                      também o sistema vascular por onde o sangue circula dentro 
                      do corpo. Os pesquisadores da Unicamp queriam saber se o 
                      uso de anabolizante alteraria a capacidade do vaso sangüíneo 
                      se dilatar ou passar por contração conforme a necessidade 
                      do organismo. Essa função dilatadora é extremamente importante 
                      para manter a pressão sangüínea e a temperatura corpórea 
                      regulada diante de movimentos do corpo ou de alterações 
                      da temperatura do ambiente, assim como para fazer o sangue 
                      chegar a todos os tecidos corpóreos.
                    Para isso foi avaliada, in vitro, a resposta da aorta torácica 
                      a uma substância que causa a contração automática do vaso 
                      sangüíneo. Percebeu-se, então, que os grupos que passaram 
                      pelo treinamento físico de força diminuíram a resposta a 
                      essa substância vasoconstritora. A contração do vaso ficou 
                      menor. A docente observa que esse é um efeito benéfico do 
                      exercício físico, pois evita que a pressão arterial aumente 
                      demais enquanto se pratica a atividade.
                    No entanto, o grupo que foi treinado e tratado com anabolizante 
                      teve esse efeito benéfico bloqueado pelo esteróide. Além 
                      disso, o anabolizante associado ao treino também diminuiu 
                      a produção de óxido nítrico na aorta. Essa substância trabalha 
                      na dilatação dos vasos. Segundo Fernanda, a diminuição de 
                      óxido nítrico está relacionada ao aumento de colesterol 
                      LDL (colesterol ruim) encontrado no sangue dos membros desse 
                      grupo. Essa situação pode levar, também, ao crescimento 
                      no número de placas de gordura no vaso. Um melhor conhecimento 
                      do processo de influência do decanoato de nandrolona sobre 
                      a formação de placas de gordura nos vasos sangüíneos é o 
                      que se espera obter com um estudo que a equipe da Unicamp 
                      deve concluir até o final de 2009.
                    Principais efeitos associados ao 
                      uso de anabolizantes em homens*