| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 341 - 23 a 29 de outubro de 2006
Leia nesta edição
Capa
Artigo: Renato Dagnino
Cartas
40 anos: Brito Cruz
Prioridade em C&T
Agroturismo
Gripe aviária
Cognição artificial
Jazz e bossa nova
Jacob do bandolim
Crianças e diabetes
Idoso e gripe
Livros destratados
Açucar no catchup
Presuntos com Zinco
Patrimônio ferroviário
Painel da semana
Teses
Portal no JU
Livro da semana
Centro de Ensino de Linguas
Licenciatura
Cinema da boca
 

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Eduardo Krieger, Ennio Candottti, Carlos Vogt e
Ruy Quadros pedem política de estado ao novo governo

Comunidade científica
aponta prioridades para a pesquisa

(Foto: Antoninho Perri/Antonio Scarpinetti/Neldo Cantanti)Fim do contingenciamento de recursos, implementação de uma política industrial articulada com o sistema de CT&I (ciência, tecnologia e inovação) e fortalecimento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Estas são as prioridades a serem adotadas pelo próximo ocupante do Palácio do Planalto, segundo representantes da comunidade científica ouvidos pelo Jornal da Unicamp. Independente de quem vença as eleições de 29 de outubro, eles esperam que o presidente eleito passe a tratar os investimentos em P&D como política de estado, com peso estratégico, e não mais como ações de governo, sujeitas às instabilidades político-partidárias.

“Ainda não temos uma política de estado, como ocorre, por exemplo, na saúde”, diz o presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Eduardo Moacir Krieger. “Quando se trata de C&T, cada um que sobe lá, faz o que quer”, dispara. Para Krieger, o Brasil precisa de uma agenda que defina um plano nacional de CT&I. “Estamos lutando para que haja um amadurecimento de forma que o governo consolide propostas em colaboração com a comunidade científica e empresarial”.
Uma das principais medidas a serem adotadas, segundo Krieger, é o fim do contingenciamento dos recursos destinados aos fundos setoriais. Criados no segundo governo FHC como instrumentos de financiamento de projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação, os fundos acumulam um continenciamento de R$ 3 bilhões. Em 2006, do orçamento de R$ 2 bilhões, foram liberados cerca de R$ 1 bilhão. “É um dinheiro carimbado que o governo não pode usar para outras coisas”, destaca o presidente da ABC.

Eduardo Krieger: pelo fim do contingenciamento de recursosKrieger relata que a comunidade científica chegou a negociar com o ex-ministro de C&T, Eduardo Campos, um cronograma de desembolso para reduzir gradualmente o contingenciamento até estancá-lo de uma vez. A idéia era limitar a retenção dos recursos em 40% no ano de 2006, 30% em 2007, e assim sucessivamente. “Com isso, em três ou quatro anos estaríamos livres”, diz. A tentativa, porém, não foi bem sucedida. Quando a medida foi encaminhada para assinatura do presidente Lula, o governo alegou que seria inconstitucional. “Voltamos à estaca zero”, lamenta.

Eduardo Krieger não é voz isolada quando se cobra o fim do contingenciamento para C&T. Mais que uma reivindicação, trata-se de um consenso na comunidade científica. “Os cortes atingem não apenas os fundos setoriais, mas também o CNPq e o FMDCT (Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico)”, destaca o presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), Carlos Vogt. Segundo ele, o país conta com uma capacidade virtual de investimento que não se traduz na realidade. “O sistema federal de financiamento à pesquisa sofre de uma espécie de ‘contingencialite’ aguda”, completa.

O assunto também ressoa na carta que a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) enviou aos presidenciáveis, relacionando ações que considera prioritárias para o setor. “Recursos recolhidos com a precípua função de financiar CT&I devem ser aplicados com essa finalidade”, diz o presidente da entidade, Ennio Candotti. “Trata-se de uma questão legal e estratégica”, acrescenta. Além da desobstrução dos canais de financiamento, Candotti defende a criação de novos fundos. “Propomos, por exemplo, que se constitua um fundo com 10% dos lucros dos bancos para financiar programas educacionais em ciências humanas e naturais”.

Ennio Candotti: pelo fortalecimento da Finep e do BNDESJá o economista Ruy Quadros, professor do Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT) da Unicamp, alerta que a descontinuidade na aplicação dos recursos oriundos dos fundos setoriais, bem como dos demais programas de financiamento de P&D, acaba inibindo o investimento privado em programas considerados estratégicos. “A lógica para que as empresas invistam em P&D está ligada ao fator segurança”, explica. Segundo ele, seria importante ter prioridades claras e fundos estabilizados, com perspectiva de continuidade do dispêndio governamental. “Talvez essa seja a mudança mais importante no que diz respeito à política de C&T”.

Quadros também define como prioridade a integração da política de C&T com as políticas voltadas para outros setores, como energia, saúde, defesa e telecomunicações. “Seria importante que a política de C&T estivesse vinculada aos investimentos públicos voltados para outras áreas”. O docente considera um erro limitar a política tecnológica apenas a setores como semicondutores ou software. “As políticas de C&T devem ter caráter mais horizontal. Só assim poderemos aproveitar as oportunidades criadas pela Lei de Inovação, gerando encomendas de pesquisa de interesse público”. Em sua opinião, em vez de serem tratadas como política setorial, as ações de ciência e tecnologia deveriam ser tratadas como estratégicas.

Carlos Vogt: estímulo ao investimento privado em P&DAos candidatos – A mesma visão é compartilhada pela SBPC. Na carta enviada aos presidenciáveis, a entidade defende a articulação da política industrial com o sistema de CT&I. Segundo o presidente Ennio Candotti, a medida é necessária para estimular o setor produtivo a investir em P&D. Para isso, ele considera prioritário o fortalecimento da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) como financiadores da inovação nas empresas. “O grande desafio dos próximos anos será trazer o BNDES para o financiamento maciço em P&D”, destaca. Lembrando que o agente financeiro foi um dos principais financiadores da infra-estrutura industrial no país, Candotti diz que não há mais como dar suporte às indústrias sem financiar inovação tecnológica. “Veja, por exemplo, o caso das infovias”.

Para Candotti, no Brasil, as ações do governo em C&T estão distribuídas de modo “difuso” em diferentes agências, secretarias estaduais e órgãos federais. “Deve-se fortalecer o papel do Ministério de Ciência e Tecnologia como articulador dessas ações e valorizar as resoluções do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT) para assegurar as ações de longo prazo”, pondera. Nesse aspecto, Krieger, presidente da ABC, destaca o papel estratégico do CCT. “Ainda é o melhor canal para dialogar com o governo e o empresariado. “Por essa razão, é preciso fazê-lo funcionar regularmente, o que até agora não conseguimos”, ressalva.

Ruy Quadros: políticas voltadas a setores como saúde e defesaÀ frente da Fapesp, cujo desembolso total para financiamentos de projetos de pesquisa científica e tecnológica foi de R$ 324 milhões, entre janeiro e agosto de 2006, Carlos Vogt também considera prioritário o governo federal adotar ações que estimulem os investimentos em P&D no setor privado. Segundo ele, é fundamental que o empresariado encontre motivação para participar efetivamente do processo de inovação. “É preciso que a economia real incorpore a atividade de P&D ao seu cotidiano. Sem isso, vamos continuar andando de lado”, alerta

A Fapesp – Vogt sabe da importância desse tipo de ação para o desenvolvimento de uma cultura voltada para a inovação tecnológica dentro das empresas. A Fapesp tem aprovado semanalmente uma proposta de apoio à pesquisa em pequenas empresas, ao mesmo tempo em que organiza, com empresas grandes e médias, propostas conjuntas para co-financiarem projetos de pesquisa inovadora.

Ainda no plano do financiamento à pesquisa, desta vez voltado ao meio acadêmico, Vogt defende a autonomia de gestão financeira para o CNPq, nos moldes do que já acontece com a própria Fapesp e com as universidades estaduais paulistas, cujo orçamento está vinculado a um percentual da arrecadação tributária no Estado. “Esse modelo confere às universidades paulistas uma capacidade de planejamento muito grande. No CNPq, a vantagem desta medida seria a maior regularidade nos repasses”, acredita.

“O CNPq está recuperando o seu orçamento, mas o atendimento ainda está limitado a 40% da demanda”, acrescente Ennio Candotti. O presidente da SBPC também defende o fortalecimento da maior agência de fomento à pesquisa do país, a fim atender o crescente volume de projetos voltados para pesquisa básica e aplicada. “Além de assegurar a liberdade temática, isso estimularia o crescimento científico em todas as áreas do conhecimento”.


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