| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 344 -20 a 26 de novembro de 2006
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Longevidade empresarial
Vinho
 

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ARTIGO

A longevidade empresarial
e os avanços de um programa
de extensão pioneiro

MARIA CAROLINA DE A.. F. DE SOUZA
MIGUEL
JUAN BACIC

Maria Carolina de Azevedo Ferreira de Sousa e Miguel Juan Bacic (abaixo) são professores do Instituto de Economia (IE) da UnicampA atenção dos pesquisadores sobre a temática das pequenas e médias empresas (PMEs) tem sido atraída sobre três temas que apresentam forte inter-relação: 1) o processo de criação de novas empresas, especialmente as de base tecnológica; 2) os arranjos produtivos locais (APLs); e 3) a mortalidade empresarial. A elevada taxa de mortalidade é característica das pequenas empresas. O diagnóstico das causas de mortalidade não é suficiente para compreender os fatores que levam à longevidade empresarial. Caso não sejam compreendidos esses fatores, parte dos esforços dirigidos para incentivar a criação de novas empresas será perdida tendo em vista a alta taxa de mortalidade observada. Pesquisa internacional organizada por Kantis et al. (2002) (da qual os autores deste texto participaram, coordenando o capítulo Brasil) revela o perfil dos empreendimentos com até 10 anos de vida. Esses já apresentam algumas características de longevidade.

Dando continuidade à preocupação com a temática da longevidade empresarial, os autores decidiram procurar empresas com mais de 30 anos de vida para estudá-las. Muitas delas são PMEs. A primeira etapa do projeto, recentemente finalizada (que propiciou dois trabalhos de Iniciação Científica no âmbito do Pibic para dois alunos do Instituto de Economia e outro que está sendo desenvolvido como monografia) foi a de identificar empresas industriais duradouras. Para tanto, partindo dos dados de um cadastro industrial da região de Campinas, elaborado em 1976 pelo Centro Técnico-Econômico de Assessoria Empresarial (CTAE) da Unicamp e, recorrendo a diversas fontes de dados, buscou-se identificar as que ainda continuam no mercado. Comparando os dados das fontes a que se teve acesso, foi possível constatar que 25% das empresas continuam em atividade. Isso significa que ao longo dos 30 anos, que correspondem ao período 1976-2006, 75% das empresas industriais da região desapareceram.

O professor Miguel Juan Bacic (Foto: Antoninho Perri)Nessa etapa foram observadas algumas características que parecem contribuir com a longevidade do empreendimento. A próxima etapa da pesquisa consistirá no estudo in loco dessas empresas (já foram desenvolvidas algumas entrevistas preliminares) para entender quais fatores (perfil do empresário, decisões estratégicas, política de tecnologia, decisões de diversificação, uso de fontes de financiamento, aspectos relacionais e culturais, política de sucessão empresarial, etc) contribuíram para longevidade do empreendimento.

Ao observar os nomes das empresas sobreviventes, um aspecto nos chamou a atenção: a familiaridade com os nomes de uma importante parcela de empresas sobreviventes. Muitas dessas empresas tinham participado de um programa de extensão que era considerado como prioritário pelo professor Zeferino Vaz para o fortalecimento da estrutura industrial local e para a consolidação da imagem da Unicamp junto à comunidade local: o programa de pequenas e médias empresas que era desenvolvido pelo CTAE.

Atualmente, a presença da Unicamp é um dos aspectos relevantes na configuração da estrutura produtiva da região de Campinas, e é amplamente reconhecida como uma das mais fortes vantagens competitivas da região. O reconhecimento da relevância dessa presença deve-se não só ao fato de a Universidade representar indiscutível fonte de conhecimento e propiciar formação acadêmica de alto nível, mas, igualmente ao desenvolvimento e consolidação de interações universidade/empresa, sem que isso signifique romper com a autonomia no que tange à pesquisa, extensão e ensino. Assim como com as demais instâncias da comunidade, as relações da Universidade com a base produtiva local vêm desde seus primeiros anos, por meio de diversos programas e contribuindo, pela difusão de conhecimentos, para o desenvolvimento de inovações tecnológicas e organizacionais.

Uma das formas pioneiras de relação Universidade/empresa deu-se por meio do CTAE. O CTAE integrou, ao longo dos anos de 1968 a 1985, o antigo Departamento de Planejamento Econômico (DEPE) do IFCH, desenvolvendo um amplo conjunto de atividades relacionadas com pesquisas e ensino (de extensão e pós-graduação), tendo como foco as PMEs industriais. A difusão do conhecimento na área de estrutura, gestão e estratégia organizacional dava-se por meio de diversos cursos e seminários, com presença ativa de empresários locais. A interação universidade/empresa viabilizada então pelo CTAE propiciou também um número expressivo de pesquisas nas áreas da economia industrial e regional.

As atividades de pesquisa permitiram tecer os primeiros quadros sistemáticos da estrutura industrial da região de Campinas, que se fundaram em estudos de campo que permitiram construir cadastros sobre as empresas industriais aqui atuantes entre os anos de 1974 e 1983 e diversas investigações pioneiras sobre a estrutura industrial e a dinâmica das PMEs. As atividades de ensino eram desenvolvidas na forma de cursos de extensão e cursos de pós-graduação. Os cursos de extensão, denominados Cursos Técnicos para Dirigentes de Empresas (CTDEs) abrangiam as áreas de gestão de produção, determinação de custos e preços, finanças e mercadologia.. Foram executados 36 cursos com um total de 720 participantes, todos com participação de dirigentes ou gerentes de PMEs. O primeiro curso, na área de gestão de produção foi ministrado em Campinas em 1968. Dois cursos foram ministrados em Manaus (Produção em 1970 e Custos em 1971). Os cursos de pós-graduação visavam formar especialistas em consultoria para PMEs industriais e técnicos de Bancos de Desenvolvimento. Ao longo de oito cursos foram formados 129 especialistas e qualificados, por meio de seis cursos, 120 técnicos. Além das atividades de ensino e pesquisa o CTAE desenvolvia ações de consultoria e programas setoriais com foco nas PMEs.

As raízes da concepção do CTAE remontam ao ano de 1966. Seus idealizadores Osmar Marchese e Eolo Pagnani integraram o primeiro grupo de especialistas formados pelo Programa Delft, desenvolvido pela Universidade de São Paulo (instituição coordenadora), Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDES), como instituição financiadora, e o RVB da Universidade de Delft, instituição executora e técnica, como partes integrantes de um Programa de Cooperação Internacional intergovernamental entre Brasil e Holanda, sob égide da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (ONUDI).

O conhecimento e experiência acumulados junto ao Programa Delft foram os elementos inspiradores para a concepção e definição do projeto (embrião do CTAE.) submetido ao reitor Zeferino Vaz, em julho de 1968, como uma das atividades programáticas do DEPE.

Na percepção do reitor Zeferino Vaz era importante inserir a jovem Unicamp dentro da comunidade local e a ação junto às pequenas e médias empresas industriais foi o caminho escolhido. Assim relata Eustáquio Gomes a relação do professor Zeferino Vaz com os cursos para os empresários de PMEs:

Os cursos de planejamento econômico, por exemplo, eram a pedra de toque das relações de Zeferino com o empresariado. Ele tinha enorme prazer em assinar os certificados de conclusão desses cursos. Fazia questão de estar presente nas cerimônias de diplomação. Ao apertar a mão de cada formando, era como se desse um impulso à indústria brasileira. Aos empresários da indústria internacional, com quem se reunia freqüentemente para definir os currículos dos cursos tecnológicos, dizia que o programa de pequenas e médias empresas devia interessar também a eles, pois lucrariam na medida em que o setor periférico se organizasse e formasse uma linha auxiliar eficiente. Somente uma vez, quando os cursos ainda estavam sendo montados e tratava-se de escolher um nome para o programa, questionou:

— Mas por que “pequena e média” e não simplesmente “empresa”?

Osmar Marchese, o idealizador dos cursos, convenceu-o com um argumento que costumava tocá-lo fundo:

— Porque é importante o fortalecimento de um segmento empresarial de conotação nacionalista” (GOMES, 2006, p. 105)

Um dos trabalhos mais importantes do CTAE foi a elaboração de cadastros industriais da região, com intenso e minucioso trabalho de campo e com um conjunto de informações detalhadas. A disponibilidade dos cadastros representa uma preciosa fonte para estudos sobre a evolução das empresas longevas na região.

Das empresas sobreviventes, cerca de 86% eram em 1976 de pequeno porte (PEs), portanto demonstraram capacidade de resistência e algum tipo de competitividade, apesar das típicas fragilidades inerentes ao pequeno capital. É pois possível afirmar que, a despeito das fragilidades inerentes ao pequeno capital, algumas PEs podem sustentar posições competitivas, são capazes de consolidar espaços nos mercados.

As possíveis explicações para aquelas que se mantêm em atividade, superando a fase de maior risco de mortalidade, continuando no mercado por muitos anos, devem ser buscadas na história de cada empresa. Há presença significativa de empresas longevas tanto em setores de baixo dinamismo e nos quais a concorrência é predominantemente baseada em preços, tanto em setores mais dinâmicos (PEs em nichos específicos). Não se constata grandes diferenças entre o percentual de sobrevivência, em geral, e o de empresas localizadas em APLs. A competitividade das empresas tende a atrelar-se, cada vez mais, ao conjunto de interações que definem o sistema de inter-relações no qual a empresa se insere e do qual representa apenas um dos elos. Ao menos na região de Campinas, o que é possível afirmar, é que as pequenas empresas sobreviventes, a despeito das dificuldades e das diversas crises que marcaram a economia no período, demonstraram capacidade de gestão e percepção da importância da diversificação (que de alguma forma requer capacidade de inovação, mesmo que, em geral, incremental, em processos, produtos e mesmo de segmentos de mercado). Isso permitiu não só a sobrevivência, como em vários casos a passagem de pequena empresa para o patamar de média (e em alguns casos para grande, considerando-se o número de empregados). São decisivas a experiência acumulada pelos empresários/dirigentes e a sua capacidade de perceber e traduzir em estratégias compatíveis as oportunidades que se abrem para empresas com pouca disponibilidade de capital.

A contribuição dos cursos (CTDEs) ministrados pelo CTAE para as PMEs na criação e no aprimoramento da capacidade de gestão e na visão estratégica é amplamente reconhecida em muitas dessas empresas. Essas empresas longevas contribuem gerando emprego e renda (e, portanto, ICMS) na região. De certa forma constituem um quadro estável que caracteriza a identidade empresarial local e que diferentemente das grandes empresas multinacionais, têm suas raízes e sua sorte intimamente relacionadas com o território onde nasceram. A Unicamp e essas empresas fazem parte de uma mesma localidade e têm participação, cada qual em suas funções específicas, na evolução da estrutura produtiva local.

Assim, consideramos que em um momento significativo como a comemoração dos 40 anos da Unicamp, as empresas locais longevas e que atestam a longa tradição da universidade no desenvolvimento de relações com empresas, em especial as de menor porte, devem, de alguma forma, integrar as comemorações.

É com esse intuito que no dia 1 de dezembro às 19 horas, no auditório do IE, um grupo de 20 empresas longevas, ex-alunas dos cursos de extensão pioneiros da Unicamp ministrados pelo CTAE, receberão um certificado de reconhecimento pela sua contribuição à comunidade local e por sua capacidade de resistência a condições adversas. Nesse dia serão lançados dois CDs contendo um, o material didático usado nos cursos do CTAE, e outro, os relatórios de pesquisa publicados pelo CTAE. Com essas duas atividades procuramos estreitar as relações com a comunidade empresarial local e preservar a memória sobre a produção acadêmica de um órgão que foi de extrema importância na definição do perfil da Unicamp junto à comunidade local. Dada a importância que o cadastro industrial do CTAE teve para o tecido produtivo local, numa tentativa de reeditá-lo está sendo mantido pela Extecamp (em parceria com o NEPP) um site que foi desenvolvido dentro de um projeto financiado pelo Sebrae, onde as empresas podem, de forma gratuita, se cadastrar e ofertar produtos e encontrar fornecedores. O endereço é www.rededeoportunidades.org.br.

As empresas que participarão do evento têm idade média de 46 anos e respondem por 4.200 empregos diretos e formais na região (210 empregos em média por empresa), o que evidencia sua importância para a região.

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