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ARTIGO

Planejamento estratégico para o desenvolvimento local

MIGUEL JUAN BACIC
ESPECIAL PARA O JORNAL DA UNICAMP


Vista da região central de Sorocaba: planejamento estratégico é a melhor ferramenta de gestãoA busca pelo desenvolvimento local tem sido feita de forma variada nos municípios. Alguns saem à procura de mais recursos acreditando que seu aporte é a solução para as dificuldades, outros ficam "pedindo" determinado investimento ao governo estadual ou federal, julgando que um fator isolado pode equacionar os problemas, e a grande maioria vê na industrialização a solução mágica de todos os males. Outros desenvolvem programas de incentivos e subsídios que têm como base doações de terrenos e concessão de vantagens fiscais e tributárias, acirrando a "guerra fiscal" na qual as vantagens ficam do lado das grandes empresas, que têm maior experiência e capacidade de barganha na negociação. Em decorrência, gera-se um processo de intensa disputa e rivalidade entre localidades, com efeito perverso para as finanças públicas.

Enfim, procuram por uma solução milagrosa que não existe. Porém, certas localidades, ao invés disso, começam pelo caminho correto, diagnosticando seus problemas e planejando suas ações de forma sistemática, estabelecendo um projeto de desenvolvimento. As ações planejadas visam aumentar a densidade do tecido produtivo, melhorar a competitividade das empresas sediadas no município, estimular as ações empreendedoras e aprofundar as competências locais, possibilitando a inserção de crescente parcela da população no mundo do trabalho.

O desenvolvimento não acontece por acaso. Ainda que possa ter alguns componentes espontâneos, a experiência destaca a importância da presença de um agente promotor e do aporte de um conjunto de ações planejadas, públicas e privadas, que precisam ser acionadas pela própria localidade, induzindo os atores econômicos próprios ou externos a promovê-lo.

Este agente promotor é, mais comumente - mas nem sempre - o poder público, que dispõe de mecanismos de regulação (capacidade de elaborar leis, decretos, normas, portarias) e de legitimidade, dado que deve defender os interesses gerais da sociedade. Nos municípios, a Prefeitura pode ser o agente promotor e articulador das ações que visam o desenvolvimento local. Municípios em que a Prefeitura consegue articular a sociedade no caminho do desenvolvimento tenderão a ter maior potencial relativo de crescimento comparativamente a municípios vizinhos em que a Prefeitura adote uma postura estática, passiva, imaginando que a simples concessão de benefícios fiscais ou o empreguismo, sejam a chave para solucionar os problemas .

A tarefa fundamental do prefeito é promover o encontro de interesses, articulando os vários segmentos da sociedade dentro de um plano que objetive a melhoria da qualidade de vida. Esse caminho passa necessariamente pelo desenvolvimento das micro e pequenas empresas locais, pelo apóio ao surgimento de ações que promovam a atuação associativista (cooperativas, associações de microempresas, participação de ONGs), pelo aprofundamento da interação entre grandes empresas e suas fornecedoras locais e pela potencialização de instituições de apoio à atividade produtiva. Este conjunto de ações possibilita o aumento da densidade das relações econômicas, a oxigenação do tecido produtivo pelas ações empreendedoras e o estreitamento dos laços comunitários.

Por outro lado, o desenvolvimento local não pode ser visto unicamente sob a ótica do município. Municípios vizinhos podem fazer parte de um tecido produtivo único. Assim, prefeitos podem formular políticas que visem o desenvolvimento desse espaço comum.

A complexidade das ações necessárias ao desenvolvimento local, indica o planejamento estratégico como ferramenta adequada, pois é a ferramenta concebida para lidar com situações de incerteza nas quais seja necessário criar um determinado futuro para uma organização. Pesquisa da Bain Company mostra que o planejamento estratégico é a principal ferramenta de gestão das maiores empresas no mundo inteiro.

O planejamento estratégico, tal como mostra o caso de Sorocaba, discutido na dissertação de mestrado defendida por Luiz Christiano Leite da Silva na Faculdade de Engenharia Mecânica, é ferramenta plenamente adequada para orientar processos locais de desenvolvimento. Evidentemente que é necessário pensar nas devidas adaptações para seu uso na esfera municipal.

Em primeiro lugar, deve-se ter em conta que o processo é muito mais de natureza política do que técnica, e é necessário articular numa visão de longo prazo o conjunto de atores locais, de forma a ter o apoio necessário ao longo do tempo. Em Sorocaba, os "agentes ativos", articulados nos conselhos municipais consultivos, tiveram importante papel tanto na sustentação política do processo como na discussão de alternativas.

Em segundo lugar, é importante o papel da liderança sinalizando a manutenção do rumo. Neste caso, em Sorocaba, cabe destacar o papel do prefeito municipal, Dr. Renato Amary, que criou o espaço político para o processo e o liderou ao longo do tempo.

Em terceiro lugar, a elaboração de um plano de longo prazo, deve reconhecer a realidade local, seus recursos e competências. O resgate do conceito de "vocação local" foi fundamental para formular o plano e o conjunto de ações necessárias à recuperação da combalida economia local, que sofria com a destruição de todo seu parque têxtil. O conjunto de ações realizadas em Sorocaba (legislação, logística, infra-estrutura, qualificação de mão-de-obra, atendimento e organização local e regional, etc.) refletem a realidade única desse município. Cada município deve diagnosticar sua situação específica, sua "vocação", suas relações com outros municípios dentro do território, para elaborar seu plano local. Este plano deve ser adequado à realidade econômica, política e social local. A principal regra na elaboração do plano é procurar tornar mais densas as relações dentro do tecido produtivo local o que possibilita maiores oportunidades de inserção das pessoas e de novos empreendimentos na atividade econômica

Em quarto lugar, os resultados do processo devem melhorar a qualidade de vida local. Neste aspecto, o plano de desenvolvimento deve visar a melhoria de um conjunto de aspectos (educação, saúde, renda, saneamento, empregos, meio-ambiente, etc.) de forma a viabilizar a articulação política ao longo do tempo.

Em quinto lugar, é necessário criar, nos municípios, um "operador" do plano, que possa também proceder às articulações e ajustes necessários. Em Sorocaba, a Secretaria de Desenvolvimento Econômico cumpriu esse papel. Para essa secretaria, não são necessários recursos e sim habilidade técnica, capacidade de articulação política e visão de longo prazo na direção dos objetivos. Os resultados do processo de planejamento estratégico de Sorocaba podem ser vistas na dissertação recentemente defendida por Luiz Christiano Leite da Silva, secretário local de Desenvolvimento Econômico e do qual tive o prazer de ser orientador.
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Miguel Juan Bacic é professor do Instituto de Economia e coordenador da Escola de Extensão da Unicamp (Extecamp).

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