| Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 346 - 4 a 10 de dezembro de 2006
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Estudo vai avaliar vantagens e desvantagens dos
contratos de prospecção para países em desenvolvimento

O impacto das parcerias
Norte-Sul que envolvem
as riquezas naturais

(Fotos: Antonio Scarpinetti)Há milhares de anos o homem explora a natureza para dela retirar recursos que garantam a sua sobrevivência. Em tempos remotos, ele usava as peles dos animais para se proteger do frio. Em meados da década de 1970, essa relação passou a ganhar contornos muito diferentes, principalmente por conta do avanço da biotecnologia. A possibilidade da descoberta de matérias-primas para o desenvolvimento de produtos e processos comerciais despertou a atenção de inúmeros países e corporações privadas. Tal interesse gerou, por sua vez, contratos de bioprospecção firmados pelas nações do Norte, possuidoras de conhecimento e dinheiro, e do Sul, detentoras de importantes riquezas naturais. Mas a quantas andam essas parcerias? Elas têm proporcionado vantagens aos países em desenvolvimento e contribuído para a preservação do meio ambiente? As respostas para estas e outras perguntas devem surgir de um estudo que está sendo conduzido por uma equipe de pesquisadores do Instituto de Geociências (IG) da Unicamp. O trabalho, previsto para ser concluído em setembro de 2007, pretende identificar a natureza e o impacto desses acordos na produção e utilização do conhecimento.

A coordenação da pesquisa, intitulada Natureza e Impacto de Parcerias Norte-Sul na Produção e Utilização de Conhecimento em Bioprospecção (Parbio), está a cargo das professoras Lea Maria Leme Strini Velho e Maria Conceição da Costa, ambas do Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT) do IG. De acordo com elas, que estudam há vários anos aspectos relacionados à cooperação científica internacional, as parcerias entre países do Norte e do Sul são normalmente marcadas por assimetrias. Com freqüência, explicam, os primeiros contam com instituições que possuem elevados recursos financeiros e equipes mais consolidadas do que os segundos. “Ou seja, as condições de entrada na parceria apresentam-se quase sempre como desiguais”, afirma a professora Lea.

Lea Maria Velho, coordenadora do Parbio: legislação do Brasil é draconiana e afasta possíveis parceirosNo que toca aos acordos na área da bioprospecção, conforme a docente do IG, surgiu um elemento novo nos últimos anos. As nações do Norte passaram a ser representadas por corporações privadas e não por instituições de pesquisa. Em outras palavras, entraram em cena empresas interessadas em explorar a biodiversidade dos países do Sul para a obtenção de recursos que lhes permitam desenvolver produtos ou processos lucrativos. Embora essa atividade seja regulamentada pela Convenção da Diversidade Biológica (CDB), instituída em 1992 com o objetivo de estabelecer regras para a preservação da biodiversidade e a justa repartição dos benefícios provenientes da transformação dos seus recursos genéticos, ela envolve muitos outros aspectos.

Também fazem parte dos acordos de cooperação os marcos legais e regulatórios estabelecidos pelos países em desenvolvimento. Tais normas têm, em tese, a função não apenas de ratificar as garantias previstas na CDB, mas também de criar mecanismos que assegurem vantagens extras às nações do Sul, como a transferência da tecnologia resultante da bioprospecção. Assim, a parceria constituiria um jogo em que todos ganhariam. Mas será que essas condições são confirmadas na prática? Para poder responder essa questão, os pesquisadores do IG estão analisando a posição de quatro países do Cone Sul, todos detentores de áreas localizadas na região amazônica: Brasil, Colômbia, Peru e Suriname. A idéia, como adianta a professora Maria Conceição, é verificar como essas nações estão tratando institucionalmente o tema da bioprospecção.

Inicialmente, os especialistas da Unicamp estão analisando os marcos legal e regulatório. Eles querem identificar como cada país trabalha com questões fundamentais para o sucesso da cooperação, tais como a preservação do meio ambiente, a partilha dos benefícios gerados pela atividade, a contabilização do conhecimento tradicional, entre outros. Os pesquisadores também estão realizando o mapeamento das iniciativas existentes. Em seguida, selecionarão duas delas para proceder estudos de casos. O objetivo final é detalhar como se dão as parcerias. Em outras palavras, eles querem constatar se as nações fornecedoras de recursos naturais de fato obtêm vantagens com os contratos.

Maria Conceição da Costa, coordenadora do Parbio: legislação do Brasil é draconiana e afasta possíveis parceiros Conforme a professora Lea, a pretensão do trabalho, que está sendo financiado por um organismo público canadense, o International Development Research Centre (IDRC), é promover um estudo amplo e comparado. “Ao final, faremos uma grande síntese dos resultados alcançados, mostrando as convergências e divergências em função do posicionamento de cada país”, adianta. Como ao final da empreitada o Parbio terá gerado um vasto banco de dados contendo informações quantitativas e qualitativas acerca da bioprospecção, é provável que ele possa servir como ferramenta para orientar os países interessados em futuras ações de cooperação nessa. “Esse pelo menos é o nosso desejo”, afirma a professora Lea.

Brasil – Embora o Parbio esteja em pleno desenvolvimento, as coordenadoras do projeto já puderam constatar diversos pontos em relação ao posicionamento do Brasil acerca da bioprospecção. O primeiro e mais importante deles refere-se à rigidez da legislação que trata do assunto. “Ela é tão complexa e draconiana que está afastando os potenciais parceiros. Há casos de empresas que estiveram interessadas em estabelecer cooperação com o país, mas desistiram e procuraram nações da África, onde as leis são mais flexíveis. Essa situação nos foi passada por vários pesquisadores ouvidos ao longo do estudo”, revela a professora Maria Conceição da Costa. Mais do que proteger a biodiversidade local, as normas brasileiras praticamente impedem o acesso a ela. “Isso sem falar dos aspectos burocráticos, que imprimem uma grande morosidade à tramitação das propostas”, completa a professora Lea.

Ocorre, porém, que esse tipo de postura não impede que os recursos naturais do Brasil continuem sendo explorados científica e comercialmente pelos países desenvolvidos. Se eles não saem do território nacional pelas vias legais, isso acaba ocorrendo por meio de ações ligadas à biopirataria. “Essa questão precisa ser mais bem analisada pelo país. Temos que optar entre manter as coisas da forma como estão ou encontrar um modelo mais flexível, que permita ao mesmo tempo preservar a biodiversidade e obter vantagens científicas e econômicas com a sua exploração racional e sustentada. O Parbio não pretende definir o caminho a ser seguido, mas sim fornecer elementos consistentes que contribuam para que essa escolha seja feita de forma responsável”, diz Lea Maria Velho. Outras informações sobre o Parbio podem ser obtidas na página do projeto, no seguinte endereço: www.ige.unicamp.br/parbio.

OBJETIVOS DO PARBIO

Descrever e entender a amplitude das parcerias Norte-Sul em biotecnologia aplicada às atividades de bioprospecção

Construir um quadro das diferentes maneiras nas quais os benefícios para os participantes podem derivar das parcerias e como tais parcerias podem melhorar as capacidades científicas e tecnológicas nos países do Sul

Investigar as relações entre parceria e o desenvolvimento de sistemas locais de inovação

Identificar condições políticas e sócio-econômicas em que as parcerias Norte-Sul oferecem maiores probabilidades de contribuir para o desenvolvimento sustentável

 


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