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Artigo publicado na Nature Materials tem
grande importância teórica e prática

Descoberta de grupo da
Física contribui para otimizar refrigeradores magnéticos

O pós-doutorando Alexandre Carvalho com o eletroímã usado para medir o efeito magneto-calórico de forma diretaAcaba de ganhar destaque internacional por meio da revista Nature Materials, do Nature Publishing Group, uma descoberta que contribui para viabilizar a substituição dos gases utilizados na refrigeração doméstica e industrial por regeneradores magnéticos ativos (materiais sólidos), o que é particularmente importante no caso de refrigeradores que precisam absorver grande capacidade de calor. O artigo publicado em outubro traz o relato do efeito magneto-calórico colossal a pressão ambiente (Ambient pressure colossal magnetocaloric effect tuned by composition in Mn1-xFex As), que torna possível aumentar a eficiência dos refrigeradores magnéticos. Assina o artigo um grupo de pesquisadores coordenados pelos professores Sérgio Gama, Flávio Gandra e Lisandro Cardoso, do Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW) da Unicamp. O trabalho contou com o aporte teórico de outro grupo coordenado pelos professores Pedro J Von Ranke e Nilson A. de Oliveira, do Instituto de Física da UERJ. Participam das pesquisas doutorandos e pós-doutorandos.

Objetivo é substituir gases por materiais sólidos

Há cerca de dois anos, o mesmo grupo da Unicamp já havia descoberto o efeito magneto-calórico colossal, que se manifesta quando o material é submetido a altas pressões em um campo magnético apropriado. O estudo que mereceu artigo na Physical Review Letters de dezembro de 2004, envolvia o composto intermetálico manganês-arsênio, cuja capacidade de retirar calor do ambiente é vinte vezes superior ao gadolínio, substância comumente usada nos protótipos de refrigeradores magnéticos.

O efeito agora relatado na Nature Materials, observado a pressão ambiente, tem importância teórica e prática. Do ponto de vista teórico, o efeito colossal a pressão ambiente permite questionar a origem do efeito magneto-calórico como resultante de fenômeno puramente magnético. Isto por evidenciar que a rede cristalina do material também contribui para a quantidade de energia (entropia) dele retirada pela ação do campo magnético. Em relação à aplicação, como ficou sugerido no início do texto, a descoberta viabiliza o aumento da eficiência de refrigeradores magnéticos.

O professor Sérgio Gama vê múltiplas vantagens na substituição dos gases por materiais sólidos (muito provavelmente ligas metálicas) na refrigeração convencional. “O processo atual exige grandes volumes de gases para promover grandes cargas de refrigeração, sendo que o rendimento é sensivelmente reduzido pelo atrito nos pistões. Além disso, os gases agridem o ambiente porque destroem a camada de ozônio agravando o efeito estufa. Na refrigeração magnética, os volumes ocupados pelos materiais sólidos são relativamente pequenos e as perdas por atrito sensivelmente menores, o que resulta em eficiência bem maior. Também não causam problemas ambientais. São muitos benefícios, que justificam o empenho em viabilizar esta tecnologia”, afirma o coordenador científico do projeto.

Os pesquisadores envolvidos na pesquisaO efeito – Sobre o efeito magneto-calórico, Sérgio Gama explica que uma liga metálica, por exemplo, quando submetida a um campo magnético sem que haja troca de calor com o ambiente (de forma adiabática), sofre um aumento de temperatura, que volta ao valor primitivo quando o campo magnético é retirado. “Esse efeito reversível é aplicável no que se denomina refrigeração magnética”.

Segundo o professor Flavio Gandra, outro coordenador do grupo do IFGW, para explicar as variações energéticas (de entropia) que ocorrem no interior do material magnético, devem ser consideradas duas partes distintas: a relativa aos elétrons (que está afeta à distribuição eletrônica) e outra relativa à rede cristalina. Gandra esclarece que o campo magnético atua sobre esses elétrons – que constituem a parte magnética – e pode orientá-los à diminuição da entropia. A entropia do sistema, no entanto, precisa ser constante. Assim, baixada a entropia da parte magnética, aumenta a da rede cristalina, de modo a manter constante a entropia total.

Esta variação, ainda de acordo com Flavio Gandra, manifesta-se na forma de calor e o sistema se aquece. Isto acontece enquanto o material sólido está submetido ao campo magnético. Cessada a ação do campo magnético, a entropia da parte eletrônica volta a aumentar e, conseqüentemente, a diminuir a entropia da rede cristalina – ou seja, o material esfria. Assim, ele pode ser usado para retirar calor de um ambiente, como o interior de uma geladeira. Como o ciclo se repete, o material serve para a substituição dos gases utilizados no sistema convencional de refrigeração.

Simplificando a linguagem, pode-se entender a variação de entropia como uma variação da quantidade de calor no sistema, por sua retirada ou por sua adição. Ou, ainda, que o aumento de temperatura significa que o campo magnético adiciona calor, que é retirado quando cessa esta ação. “A novidade demonstrada com a descoberta do efeito colossal é que o calor (a entropia) se extrai não apenas da parte magnética, mas também da rede cristalina. Este fato trouxe uma contribuição importante para o entendimento do efeito. Do ponto de vista prático, quanto maior a quantidade de calor extraída, maior e mais eficiente a aplicação; havendo a mesma variação de temperatura, maior a quantidade de calor que pode ser extraída”, acrescenta Sérgio Gama.

Descobertas – O efeito magneto-calórico foi descoberto em 1881. Em 1926, sugeriu-se o uso de magnetização de material paramagnético para obtenção de temperaturas muito baixas. Já em 1932, o prêmio Nobel de física foi atribuído a trabalho que levou à construção de refrigerador magnético, que permitia alcançar temperaturas próximas do zero Kelvin, inviável de se obter com os refrigeradores a gás.

Até 1997, conta o professor Sérgio Gama, o efeito magneto-calórico era determinado apenas nos materiais que apresentavam a chamada transição magnética de segunda ordem, caso de elementos como gadolínio, ferro e níquel, em que o efeito é relativamente pequeno, embora houvesse já tentativas de utilizá-los em refrigeradores. Foi nos Estados Unidos, em 1997, que descobriram materiais que registravam transição de primeira ordem, como o composto intermetálico Gd5Ge2Si2. O efeito associado, bem maior, foi então denominado magneto-calórico gigante. A descoberta deflagrou um grande movimento de pesquisas na área, em todo o mundo, pois ficou clara a possibilidade de esses novos materiais competirem, em termos de energia e preço, com a refrigeração a gás convencional.

“Foi quando nós descobrimos este efeito no composto MnAs (arsenieto de manganês) e derivados dele. Denominamos o efeito de colossal porque ultrapassa em muito o efeito gigante e também o limite magnético esperado para esses materiais. Até então, em nenhum dos materiais estudados, o efeito ultrapassara o limite magnético. Por isso a modelagem teórica atinha-se apenas aos limites da contribuição magnética”, relembra Sérgio Gama. No entanto, o efeito colossal, por ultrapassar esses limites, introduzia um novo desafio teórico. “O desafio é modelar corretamente o resultado experimental e, o que certamente ocorrerá, contribuir para a obtenção de um efeito otimizado, abrindo possibilidades para a descoberta de outros materiais apresentando o efeito colossal”.

O professor procura mostrar a variação das diferenças de entropia verificada nos materiais utilizados ao longo do tempo, desde a descoberta do efeito. Ele lembra que no efeito magneto-calórico convencional esta variação era de 10 joule/kg.K; no efeito magnético-calórico gigante atingiu 40/50 joule/kg.K na pressão ambiente; e no colossal a ordem é de 300 joule/kg.K na pressão de 2300 atm, ordem de grandeza que também se observa na recente descoberta em que se utilizou dopagem do arsenieto de manganês com ferro e pressão ambiente. Neste caso, os átomos de ferro determinaram diminuição do volume do retículo cristalino, como se ele estivesse submetido a pressão externa.


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