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Diário da Cátedra
Krieger: desempenho das
   universidades
Biodiversidade
Garrafas de vidro versus PET
Desafios do desenvolvimento
Velasco e Cruz: ensaio
Produção de tomate
Ciclo básico 2 - novos
   laboratórios
Síndrome de Down: ácido fólico
Teses da semana
Orçamento estadual
A palavra cênica
 

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Para presidente da Academia Brasileira de Ciências,
só bons quadros garantem incremento da produção científica

Krieger: verbas devem corresponder ao desempenho das universidades



MANUEL ALVES FILHO e LUIZ SUGIMOTO


O presidente da Academia Brasileira de Ciências, Eduardo Moacyr Krieger: país precisa de círculo virtuoso na área de C&TO presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Eduardo Moacyr Krieger, defendeu no último dia 10 de dezembro, na Unicamp, a necessidade de o Estado exercer um controle efetivo sobre a qualidade das universidades brasileiras, tanto públicas quanto privadas. De acordo com ele, a liberação de recursos do Tesouro deveria estar condicionada à apresentação de resultados por parte das instituições de ensino. “Infelizmente, o governo federal nunca esteve preocupado com este aspecto, que é fundamental para o país”, lamentou. Krieger, um dos mais renomados cientistas nacionais, lembrou que a ampliação da produção científica, que tem reflexos importantes no desenvolvimento, só será alcançada se o Brasil conseguir formar e manter bons quadros. O presidente da ABC apresentou a conferência de abertura do simpósio “Produção Científica no Brasil”, realizado no auditório do Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW).

Evento reuniu cientistas de todas as áreas

Durante o evento, que contou com a participação do vice-reitor da Unicamp, José Tadeu Jorge, e do pró-reitor de Pesquisa, Fernando Costa, Krieger chamou a atenção da platéia, formada por professores, pesquisadores e alunos, para a necessidade de o Brasil estabelecer um círculo virtuoso na área da ciência e tecnologia, sob pena de perder espaço no cenário internacional para países com a mesma potencialidade. O presidente da ABC lembrou que a produção científica é um elemento essencial ao desenvolvimento, que por sua vez gera riquezas e condições para a sustentação das pesquisas. As universidades, prosseguiu, têm papel central nesse esforço.

Krieger manifestou especial preocupação com a forma como se deu a expansão das escolas privadas nos últimos dez anos. Estas, destacou, empregam um número quase inexpressivo de doutores, o que significa que produzem pouca ciência. “E isso, como sabemos, reflete diretamente na qualidade do ensino”. O cientista disse não tido tempo de conhecer em detalhes o projeto de reforma universitária divulgado recentemente pelo Ministério da Educação. Mas segundo ele, um representante da ABC esteve presente à solenidade de apresentação da proposta e destacou dois aspectos, um positivo e outro negativo. O primeiro diz respeito à implantação do ciclo básico nas universidades, medida considerada acertada por Krieger.

Conforme o presidente da ABC, a idéia de um curso que tenha dois anos dedicado ao ciclo básico e mais um ano para a especialização, por exemplo, deve ser considerada por um país como o Brasil. “Nos Estados Unidos, por exemplo, metade dos estudantes universitários está matriculada em cursos de curta duração”, comparou. O aspecto negativo identificado no projeto de reforma universitária do governo, afirmou Krieger, está na ausência de mecanismos que assegurem uma avaliação eficiente das instituições de ensino. “Esse aspecto precisa estar contemplado na lei”, reivindicou, acrescentando que a Academia Brasileira de Ciências contribuirá para o debate em torno do assunto.

Krieger assinalou que o Brasil precisará superar uma outra dificuldade para ampliar a produção científica e alcançar conseqüentemente o tão sonhado desenvolvimento. O problema, disse, está relacionado à inserção dos cientistas no setor privado. A pós-graduação nacional, analisou, tem cumprindo com eficiência o papel de formar bons mestres e doutores. O país está triplicando, a cada dez anos, o seu número de doutores, que atualmente está na casa de 9 mil/ano. “Entretanto, dos 125 mil cientistas brasileiros, somente 23% estão trabalhando nas empresas. O restante está na academia. Nos Estados Unidos, ao contrário, 79% dos doutores atuam no setor produtivo”, comparou.

Não por acaso, completou Krieger, a Coréia, que em 1980 tinha indicadores científicos e sociais comparáveis aos do Brasil, experimentou um salto impressionante nos últimos 20 anos. Para ficar num único exemplo, o PIB per capita do país oriental passou de US$ 1 mil para US$ 10 mil no período. Lá, lembrou o presidente da ABC, 54% dos cientistas atuam no setor privado. “Assim como os coreanos, nós precisamos superar o desafio de transformar conhecimento em riquezas”, disse. Ao final da conferência, Krieger deixou a seguinte frase, cunhada há cerca de um século pelo cientista Oswaldo Cruz, para a reflexão da platéia: “Meditai se só as nações fortes podem fazer ciência ou se é a ciência que as faz fortes”.


O professor Paulo de Góes Filho: compreensão dos processos sociais


O professor José Penteado Aranha: engenharias perdem terreno


Carlos Tomei, da PUC do Rio de Janeiro: matemática em alta

Ângelo da Cunha Pinto, da UFRJ: distribuição de cursos preocupa

Encontro promove avaliações por áreas

“As ciências humanas, cada vez mais preocupadas com questões da globalização, ganham papel importante para a compreensão de processos sociais que contribuam para a evolução científica como um todo”, afirmou o professor Paulo de Góes Filho, da Academia Brasileira de Ciências, antes de sua palestra no Simpósio Produção Científica no Brasil. O encontro na Unicamp teve avaliações específicas nas áreas de Ciências Físicas, Química, Matemática, Ciências Agrárias, Ciências Biomédicas, Ciência da Saúde, Engenharia e Ciências Humanas.

Góes Filho observa que as ciências humanas e sociais ocupam um lugar muito particular no conjunto das ciências. “Um indicador disto é que elas entraram na Academia Brasileira de Ciências somente no ano de 2000, por apresentarem uma metodologia e uma linguagem diferentes das ciências ditas naturais e de exatas. Sua linguagem é chamada de autoral e, até que se instituísse o processo de globalização, estavam mais voltadas para as questões nacionais, para a construção da nacionalidade. É muito recente o olhar das ciências humanas para um mundo que hoje possui características globais, mas elas vão se internacionalizar e participar de forma mais ampla do processo de desenvolvimento e tecnologia”, prevê o professor.

José Penteado Aranha, professor da USP convidado a falar sobre a área de engenharia, alertou que a profissão vem exercendo atração cada vez menor sobre os jovens. Ele percebe uma falta de sintonia entre os números de P&D divulgados nacionalmente e as expectativas do engenheiro no plano individual. “Há dez anos, dentre os 100 melhores vestibulandos da Fuvest, a metade tinha optado pela Politécnica da USP; atualmente essa proporção é de um terço. O mercado está ruim. Recentemente, em um evento em São José dos Campos, onde trabalha, um engenheiro de aerodinâmica, de 38 anos de idade, manifestou seu desejo de buscar pós-graduação em gestão no exterior, pois não via mercado para trabalhar caso a empresa entrasse em crise e ele fosse demitido”, informa.

A crítica do professor Penteado Aranha, em relação à falta de uma política industrial que aqueça o mercado, estende-se ao valor das bolsas para pesquisas. “Trata-se de uma área técnica em que o pós-graduando fica submerso nos estudos por cinco anos e, quando emerge, não sabe se conseguirá um bom emprego. As bolsas baixas contribuem para uma situação irônica: se o mercado melhorar, aí é que as pesquisas na academia serão esvaziadas de vez. Creio que foi Millôr Fernandes quem deu sua versão do ditado ‘dinheiro não compra felicidade’, questionando se ‘felicidade traz dinheiro’”, versa o pesquisador da USP.

A área de matemática, por sua vez, vem evoluindo bastante nos últimos 20 anos, na opinião do professor Carlos Tomei, da PUC do Rio de Janeiro. Ele diz que o mercado de trabalho está bastante favorável e que, no campo das pesquisas, a qualidade aumentou bastante devido ao estreitamento das relações com a comunidade internacional. “Mas existem problemas enormes de associação com o setor produtivo, já que não se consegue gerar matemáticos que gozem de outras alternativas profissionais que não sejam a de simplesmente ensinar nas universidades”, critica. Outra crítica do professor, que pertence a uma instituição privada, embora sem fins lucrativos, é a disputa injusta de recursos para pesquisas. “O sinal que o governo envia é que as instituições privadas não incentivam a qualidade. Acho que as instituições, públicas ou privadas, deveriam ser distinguidas pela competência”, pondera.

Ângelo da Cunha Pinto, professor da UFRJ, discorrendo sobre a produção científica na área de química, apontou a criação do Programa de Apoio ao Desenvolvimento e Tecnológico (PADCT), em 1984, como a grande responsável pelo crescimento recente da especialidade no Brasil. Existem atualmente 125 cursos de química no país, com 25 mil alunos matriculados, formando 4.500 profissionais e titulando cerca de 300 doutores por ano. O detalhe que preocupa Cunha Pinto é a distribuição desses cursos por região. “Em 2003, o Sudeste concentrava 46 cursos, havendo 11 no Rio de Janeiro e apenas um no Amazonas. A maioria dos cursos está no litoral, ao passo que não existem pesquisadores na enorme região Norte. Se formos discutir a questão da biodiversidade, em que a química é fundamental, temos aí um problema sério”.

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