Edições Anteriores | Sala de Imprensa | Versão em PDF | Portal Unicamp | Assine o JU | Edição 263 - de 23 a 29 de agosto de 2004
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Parâmetros que
garantem uma pinga de primeira


LUIZ SUGIMOTO


Natália Soares Janzantti (em primeiro plano), com a professora Maria Regina Franco: estudo independente (Foto: Antoninho Perri)Não são fortuitas as últimas notícias sobre o sucesso da nossa cachaça em bares dos Estados Unidos, Europa ou Japão. Desde 1997, quando criou o Programa Brasileiro de Desenvolvimento da Cachaça (PBDC), o governo federal vem se esforçando para tornar a bebida reconhecida e apreciada em todo o mundo, inserindo-a entre os itens importantes de exportação. A pinga é o destilado mais consumido no Brasil, com uma produção anual de 1,3 bilhão de litros. Por enquanto, apenas 1% da produção é exportada, com o litro chegando às prateleiras de cerca de 60 países, ao preço médio de US$ 2. A Alemanha representa 30% das exportações. Diz a propaganda oficial que a cachaça será a bebida da moda na próxima década, assim como já o foram o rum, a vodca, o saquê e a tequila.

Doutoranda desenvolve metodologia de avaliação

A Agência Nacional de Exportações (Apex) decidiu reservar verba generosa para ajudar pequenos e médios produtores de aguardente a adequarem seus produtos aos padrões e exigências do mercado internacional. No entanto, Natália Soares Janzantti, da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, optou por realizar um estudo independente sobre o sabor da cachaça, visando à tese de doutorado orientada pela professora Maria Regina Bueno Franco, e que incluiu um estágio de 11 meses na Universidade de Zaragoza, onde aprendeu técnicas de avaliação empregadas em vinhos.

Mesmo sem qualquer pretensão de indicar o sabor ideal da cachaça, a pesquisa de Natália Janzantti pode ser uma ferramenta útil para definir um parâmetro ainda inexistente: o padrão de qualidade de um produto que se esconde sob mais de 5 mil marcas e vem de 30 mil produtores espalhados pelo país. A partir de amostras de treze cachaças industrializadas, ela abordou no estudo tanto a parte sensorial, verificando a aceitação dos produtos junto a 30 professores, estudantes e funcionários da Unesp de Araraquara, como também a parte instrumental, com o desenvolvimento de uma metodologia para análise e descrição dos compostos característicos das amostras.

“O sabor é uma resposta da mistura do aroma com o sabor. O aroma vem da interação entre diversos compostos voláteis como álcoois, aldeídos, lactonas, ácidos graxos, ésteres. O gosto, determinado por compostos não-voláteis, equivale a sensações básicas como o amargo, salgado, doce, ácido. Juntando os compostos voláteis e o gosto, vamos ter o sabor característico de certo alimento ou bebida”, explica Natália. Seguindo em seu didatismo, a doutoranda acrescenta que os ésteres, por exemplo, contribuem para um aroma de frutas; os ácidos com o aroma de queijo; os aldeídos com os de grama ou eucalipto; os fenóis com o de fármacos; os álcoois com fermentados; as lactonas com cheiros adocicados.

A professora Maria Regina Franco diz que todo composto odorífero permite uma descrição e o que vinha sendo feito até agora no país é justamente a determinação de cada classe química, isoladamente. “Outras técnicas determinam apenas os compostos majoritários presentes, inclusive para cumprir exigências da legislação. Nossa proposta foi a de obter uma resposta integrada de todos os compostos voláteis, pois a combinação e a quantidade é que propiciarão o aroma global”, explica. O Laboratório de Análise de Alimentos da FEA foi pioneiro em estudo de sabor de alimentos no Brasil. “Já estudamos vários tipos de matrizes, como frutas, mel, vinhos, salame e café”, informa a professora.

A técnica – Numa explicação superficial, o que se faz é separar os compostos voláteis da cachaça, através de um instrumento chamado cromatógrafo gasoso, registrando-se em tela de computador o picos de cada composto. Todo pico, segundo Maria Regina, exige a avaliação humana. “O provador é quem deve descrever se o composto é importante ou não para o aroma, dando uma nota conforme a intensidade do impacto”, resume. O próprio preparo da amostra já é uma etapa crítica, pois os compostos voláteis geralmente se desagregam com o aumento de temperatura, com risco de o extrato final não mais representar o aroma do produto avaliado. Daí a importância de técnicas que não envolvam o uso de calor. “Esse tipo de estudo permite formular aromas que agradem ao consumidor quando adicionados aos alimentos e identificar qual composto está sendo perdido ou modificado, levando ao próprio redimensionamento do processo”, acrescenta.

Natália Janzantti afirma que as amostras examinadas não apresentaram diferenças qualitativas na composição de voláteis, mas sim quantitativas, sendo que a menor ou maior concentração de certos compostos é que influiu na aceitação dos produtos. Notou-se que as lactonas, adocicadas, são substâncias desejadas, e que os fenóis, relacionados com a agressividade e a sensação de amargor, estavam mais presentes na amostra menos aceita e apontada como de má qualidade. “É preciso esclarecer que trabalhamos com os produtos acabados e não estudamos o processo de fabricação, onde entram variáveis como matéria-prima, microorganismos utilizados, material de destilação etc. Estamos apenas oferecendo parâmetros para a indústria, relacionando a composição com o que é desejado pelo consumidor”, finaliza a pós-graduanda da FEA.

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